𝒸𝒾𝓃𝒸𝑜

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| E D A |  


Algo que talvez não tenha mencionado em meus vários desvaneios: Anjos não sonham.

Não podemos, já que não possuímos memórias ou desejos terrenos. Sonhos estão ligados diretamente a desejos interiorizados e enraizados em nossos subconscientes e isso prova mais uma vez que existe algo de errado comigo. Se anjos não sonham o que acontece comigo quando estou recarregando?

Ao observar os costumes dos humanos passei a achar curioso o fato deles perderem horas de olhos fechados fazendo absolutamente nada, então passei a reproduzir e para minha surpresa foi bem fácil. Quando nossos corpos relaxam é como se flutuássemos em nuvens e entramos em um estado de estupor. E mais uma vez Seyfi estava errado o que é bem raro, então é claro que não contei nada a respeito a ele, pois se anjos não fazem nada disso eu também não deveria fazer.

Mas faço, sinto que reproduzir os hábitos deles me deixa mais perto dos meus guardados.

Mas por qual razão estou revirando esse assunto? É simples, mais uma vez tive um sonho. É o mesmo de sempre. Acho que humanos sonham coisas distintas, eu sempre sonho a mesma coisa.

Uma menina girando em uma sala enquanto pequenos flocos de neve caem ao redor dela, não consigo explicar a sensação que tenho sempre acontece, mas sempre me sinto triste, não é ruim só é como se uma parte de mim faltasse.

Depois do dia que tive hoje, com a coisa do hospital e de todas aquelas pessoas doentes é como se minha energia tivesse zerado, para completar estar nessa casa me deixa confusa. É como se de alguma forma eu já tivesse estado aqui. Mas não estive, sei que não, me lembraria se tivesse estado. Contudo, tocar essas paredes é como tocar uma inexistente do meu coração.

Sei que Melek se sentiu estranha pela maneira como me referi a ela, e nem sei explicar como aconteceu, apenas saiu. O nome soou tão familiarque mesmo eu com meus dons estranhei.

Existe um enorme vazio nessa casa e preciso descobrir como preencher.

Deixei o quarto no qual fui instalada no segundo andar e caminhei pela casa adormecida, os corredores estão silenciosos, mas é possível ouvir o uivo do vento lá fora. Escuto uma passada leve e acabo me virando rápido demais e esbarrando no abajur encima do aparador, os passinhos se tornam mais alto e ao agarrar o bendito abajur o rostinho assustado da menina se revela para mim.

Ela dá alguns passos para trás, agarrando-se na parede. — Olá, pequena. O que faz acordada á essas horas?

Seus olhos sonolentos piscam e ela se encolhe um pouco mais na parede. Não parece muito disposta a falar comigo. — Está tudo bem?

Ela esfrega os olhos, ainda um pouco lenta, aproveito para me aproximar e com cuidado me agacho ao seu lado. — Não consegue dormir ou estava me seguindo? Ou os dois?

Desviando os olhos para o chão ela arrasta os pés envoltos por meias no piso de madeira.

— Então é a segunda opção... — Digo suave, ela ergue os olhos para mim, um olhar amedrontado e curioso plantado nela. — Você não é de falar muito, é?

A onda de cabelos escuros balança junto com sua cabeça, ela não diz nenhuma palavra, mas seu gesto já é um avanço para alguém que não parece disposta a falar. — Tudo bem, eu posso falar por nós duas, o que gera um equilíbrio e como diz Seyfi, equilíbrio é tudo.

Relaxando um pouco seus lábios se movem, é um movimento sutil como um sorriso tímido o que faz meu peito apertar.

— O que podemos fazer para ajudar você a dormir? — Ela aponta para o final do corredor a porta que Ayfer – A governanta da casa – disse ser o quarto principal, o quarto de Serkan Bolat. — Seu pai?

Um anjo chamado NatalOnde histórias criam vida. Descubra agora