Décimo Mandamento

Choque

Liam não era um paroquiano assíduo da Igreja Presbiteriana de Covington, todavia, naquela manhã, não foi capaz de recusar o convite da mãe para acompanhá-la até a congregação, onde ela iria deixar o restante dos presentes que conseguiu arrecadar junto aos doadores das escolas em que prestava consultoria pedagógica; aqueles presentes, em sua maioria brinquedos, cobertores e roupas, seriam de grande ajuda e alento para crianças carentes dos subúrbios da Louisiana. Ele mesmo havia comprado alguns conjuntos de lençóis e posto no meio daqueles que a mãe tinha organizado. Ele não iria participar da entrega, mas se sentiu bem em saber que tudo aquilo seria muito bem recebido e usado. Naquela manhã, Liam pôde sentir que era real a máxima "fazer o bem faz bem".

Comovido, rezou em agradecimento e também pediu que, aquele final de ano fosse abençoado. Liam não sabia, mas aquela oração não seria atendida, pelo menos não como ele gostaria que fosse.

Antes da viagem, Angelina tinha pesquisado todos os tipos de informações possíveis em guias turísticos e sites especializados, sobre a cidade de Covington, e ficou positivamente admirada com as imagens postadas em blogs e páginas disponíveis na rede mundial de computadores; dos muitos pontos turísticos daquele local, e sua graciosa arquitetura moderna e ao mesmo rupestre.

De alguma forma, o lugar lhe pareceu perfeito para ter uma casa, um lar. Então, como todo e qualquer turista que se preze, não via a hora de ver tudo de perto. Darina com sua mania de fotografar tudo e a todos, com certeza seria muito feliz em poder estar ali... Angelina estava mais do que disposta a compartilhar algumas imagens com a amiga. Na verdade, ela mal podia esperar para fazer os passeios que Lucas prometera. Porém, tal ansiedade curiosa havia dado lugar muito rapidamente a um estado de nervos simplesmente caótico.

Dentro daquele luxuoso veículo, com Lucas ao lado, balbuciando em búlgaro que tudo ia dar certo, e o irmão do mesmo lançando algumas olhadas estranhamente sérias pelo espelho retrovisor, Angelina só conseguia pensar que aquela, era, definitivamente, a pior experiência que jamais tivera na vida! Havia uma pequena, mas insistente voz que lhe dizia que ela não deveria estar ali, que deveria ir embora na primeira oportunidade que tivesse. Mas Lucas precisava de sua ajuda e...

Não, eu não posso fazer isso. Tenho que arrumar um jeito de me livrar disso, ela pensava agoniada, tentando a muito custo não se deixar sucumbir ao desespero. Entretanto, estava cada vez mais difícil manter-se firme, pois seus olhos ardiam em demasia, devido às lágrimas não derramadas. Estava se esforçando tanto que parecia que poderia romper a qualquer momento. Quão estranho e vergonhoso seria, chorar feito uma garotinha desamparada. Seu melhor amigo, com certeza entenderia, mas... Liam... Não.

Lembrou dos exercícios que aprendera numa das aulas online com uma famosa influencer instrutora de yoga "cheirar a flor, soprar a vela, cheirar a flor, soprar a vela, cheirar a flor, soprar a vela"...

— Estamos quase chegando. — Lucas disse baixinho, em búlgaro, certamente para que o irmão não entendesse suas palavras e soubesse exatamente o grau absurdo de gravidade e tensão ao qual os ocupantes dos assentos traseiros do automóvel estavam envoltos. — Por favor, me perdoe, Lina. — pôs um dos braços em volta dos ombros femininos e puxou para mais perto de si. — Prometo que assim que chegarmos, e tivermos um tempo só para nós, irei explicar tudo — deu um beijo carinhoso nos cabelos da jovem, antes de voltar a conversar com o irmão sobre as mudanças ocorridas na cidade, na empresa da família, além de outras amenidades.

Calada Angelina estava, muda continuou, apenas debatendo internamente sobre as possíveis consequências de ter aceitado mentir por seu amigo. E não tinha jeito. Ela só conseguia pensar que não ia dar certo.

Ela tinha consciência de que estaria eternamente em dívida com Lucas pelas muitas coisas boas que o mesmo lhe proporcionara. Ele sempre seria seu melhor amigo, seu irmão. Mas, mentir daquela forma era um grande erro, um pecado.