O aniversário

28 3 0
                                    

O dia seguinte era o dia em que Olivia completaria 18 anos. Pouquíssimos dias após o sol entrar em Touro. Talvez isso explique o porquê de ela ser uma amiga tão leal e atenciosa. Ela havia decidido que faria seu aniversário em um gastrô-bar de nossa pequena cidade. A escolha do local era óbvia – esse era o mesmo lugar onde sempre conseguíamos tomar uns drinks alcoólicos que a prima dela dava um jeito de deixar para a gente na mesa.

Essa seria a primeira vez desde que ela tinha 13 anos que ela arriscaria fazer uma festa de aniversário tendo todos os seus amigos mais próximos como convidados. Na última vez que os pais de Olivia decidiram fazer uma festa de aniversário para ela, algumas coisas deram muito errado. Eu me lembro como se fosse ontem. Eu estava conversando com Marc, estávamos falando sobre os bolos que mais gostávamos dos aniversários de Olivia. Ela comemorava seu aniversário todos os anos desde os sete anos de idade. O bolo de coco com doce de leite da sua festa de 10 anos ganhou por unanimidade, minha e de Marc. Neste ano em questão, em que tudo aconteceu de dar errado, o bolo não era dos melhores, mas os docinhos sim. Se você tentar imaginar todos os doces de aniversário mais gostosos que você comeu em toda a sua vida, tenho certeza que esses estavam sendo servidos na comemoração de treze anos dela.

O problema é que se você conhecesse a Olivia nessa época, você saberia que assim como toda criança nessa idade, ela também tinha suas inseguranças. Sendo a maior delas o medo do sobrepeso. Lembro-me que na época ela havia comentado algumas vezes sobre mensagens ofensivas que ela recebia das meninas super populares da escola. Mensagens como "sua gorda, pare de comer", "se continuar assim, seus pais vão ter que duplicar o tamanho do seu quarto", e ainda, algumas muito piores, como "não coma toda a comida existente no mundo, sua esfomeada", "alguém segure essa balofa", "Alô, Sr. Mar, acho que uma das suas baleias está atacando nossa cidade". Enfim, todas as coisas mais horríveis que uma criança do secundário possa inventar.

Foi por isso que, em plena sua fase de crescimento, Olivia decidiu que faria regime, e que não comeria nada até que conseguisse perder uns bons kilos. Exagero, claro. Ninguém pensava que ela tentaria realmente alcançar esse objetivo.

No dia do seu aniversário, Olivia não tinha comido nada. Ela tinha evitado ingerir qualquer coisa com mais de 150 calorias por todo o mês. Quando o grande dia finalmente chegou, ela não resistiu a todos os docinhos e gostosuras que tinha em sua própria festa. Então os comeu, muito.

Quando Marc e eu tínhamos acabado de decidir que o bolo do aniversário de 10 anos dela tinha sido o melhor, seus pais passaram correndo em direção ao banheiro.

Olivia. Olivia! Você está aí minha filha?

Sua mãe berrava, pois, presa no banheiro, Olivia não respondia. Ela não fazia um barulho sequer. Quando os bombeiros chegaram e conseguiram arrombar a porta do banheiro, por fim, ela estava caída no chão. Um tapetinho verde com amarelo era tudo o que a separava do piso frio. Tão verde e tão amarelo quanto a coloração da própria pele da menina, que nada de substancial havia comido já há muito tempo. Então, depois de comer vários docinhos, a menina correu para o banheiro por querer livrar-se deles, das calorias. Ela enfiou o dedo na garganta, forçando seus músculos abdominais a se contraírem e toda a comida ser expelida. Assim sendo, desceu-se o nível da glicose, dos nutrientes necessários – que ela já não tinha – e como tal, desceu Olivia ao chão.

Somente no dia seguinte consegui notícias sobre o estado de saúde da minha amiga.

Felizmente, agora ela estava bem e não se forçava mais a vomitar o que comia. Porém, somente depois de cinco anos ela se atreveria a fazer uma festa de aniversário novamente. E dessa vez não seria uma festa planejada por seus pais, mas sim uma festa planejada por ela mesma, em um dos bares mais badalados de nossa cidade.

Dança ComigoOnde histórias criam vida. Descubra agora