Capítulo 8 - Vazio

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A característica que representa a personalidade do Tipo A é ter metas e estratégias para alcançá-las. Com certeza, sou do Tipo A. Planejar é minha religião, e a lista das obrigações diárias é minha bíblia. Mas, ao chegar até o meio do corredor do prédio que tem sido meu lar nos últimos dois anos, congelo. Porque pela primeira vez em minha vida, não tenho ideia do que fazer. Estou sem direção alguma. E é aterrorizante. Parece sem peso, como um astronauta sendo cortado de sua âncora, deixando ser levado ao espaço. Desolado. Condenado. Minha vida gira em torno da Toni. E nunca pensei que precisaria de um plano B.

Primeiro, minhas mãos começam a tremer, depois os braços e joelhos. A batida do meu coração se eleva rapidamente e tenho quase certeza de que estou hiperventilando.

É adrenalina.

A resposta de luta ou fuga é um fenômeno extraordinário. É agir sem pensar antes, um movimento que acontece sem a permissão do seu cérebro. E a minha resposta está totalmente oscilante. Cada membro grita para eu me mexer. Para ir. Meu corpo não se importa para onde, para qualquer lugar longe daqui. Corra, corra o quanto conseguir, você não pode me pegar, sou o Homem de biscoito Gengibre.

O Biscoito Gengibre teve sorte. Ele tinha alguém que o perseguia.

- Senhorita Blossom?

Não o escuto logo de primeira. O som do meu próprio pânico é muito ensurdecedor, como mil morcegos dentro de uma caverna fechada. Em seguida, ele toca meu braço, me pondo de volta ao chão, trazendo-me à realidade.

- Senhorita Blossom?

O cavalheiro de cabelo grisalho, com olhos castanhos cheios de preocupação e um elegante chapéu vermelho. Esse é Smithers, nosso porteiro. Ele é um bom senhor, casado há 30 anos, com duas filhas na faculdade. Já notou que a maioria dos porteiros se chama Smithers, Harry ou Sam? Como se os nomes predeterminassem a profissão deles.

- Posso te ajudar com alguma coisa?

Se ele pode me ajudar com alguma coisa?
Uma lobotomia seria muito útil neste exato momento. Nada extravagante, apenas um picador de gelo e um martelo, e, felizmente, faria parte do clube das mentes sem lembranças.

- Está tudo bem, Senhorita Blossom?

Sabe aquele ditado: "É melhor ter amado e perdido do que nunca ter amado"? É asneira. Quem disse isso, não entendia porra nenhuma sobre amor. É melhor ser ignorante, é indolor. Mas conhecer a perfeição, tocá-la, prová-la, respirá-la diariamente e depois tirarem isso de você? A perda é agonizante. E cada centímetro da minha pele dói por causa disso.

- Preciso... tenho que ir.

Sim, aquela foi minha voz. Uma versão atordoada e confusa, como uma pessoa ferida em algum grave acidente de carro, que fica dizendo para qualquer um que queira escutar que o farol estava verde. Não era para terminar desse jeito. Não era nem mesmo para terminar. Ela escreveu nas nuvens para mim, lembra?

Para sempre.

Smithers olha para a mala no meu ombro.

- Você tá indo para o aeroporto? Está atrasada para algum voo?

Suas palavras ecoam no saco sem fundo que está minha mente agora. Aeroporto... aeroporto... aeroporto... voo... voo... voo.

Quando os pacientes de Alzheimer começam a perder suas memórias, são as mais recentes que somem primeiro. As mais antigas, como o endereço da casa em que eles cresceram ou o nome da professora do segundo ano, ficam porque estão fixas. Elas fazem tão parte deles que a informação é quase instintiva, igual a saber como engolir.

Meus instintos me dominam agora. E começo a planejar.

- Sim... sim, preciso ir até o aeroporto.

Sabe algo sobre lobos? Eles são animais que andam em matilhas. Em famílias. Exceto quando estão machucados. Caso isso aconteça, o lobo machucado sai à noite sozinho, para não atrair predadores. E volta para a última caverna que o grupo ocupou. Pois lhe é familiar. Segura. Fica por lá para se recuperar.

The Mistake - ChoniOnde histórias criam vida. Descubra agora