12. A FARSA

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Bruno encarou o rosto do cara amarrado e amordaçado na cadeira no meio do apartamento com as paredes destruídas de Dona Benedita. Conseguiu jogar uma letra nos outros, na tentativa de mantê-lo de frente para a câmera. Os outros deveriam saber o que estava acontecendo ali e saber que ele ainda estava junto com eles.

Passou a noite inteira ali. Precisava olhar naqueles olhos azuis tão atraentes de novo.

O homem ainda sentia uma leve dor na cabeça, mas lentamente foi recobrando os sentidos. Primeiro sentiu as mãos atadas atrás da cadeira de madeira, depois os pés junto ao assento e respirou forte, ao perceber que estava amordaçado. Ergueu os olhos e na sua frente o tom castanho o encarava com certo misto de medo e afeto. Ele suspirou ao reconhecê-lo.

Bruno diminuiu a distância entre eles e tirou a corda da sua boca.

— Fiquei com medo de você não acordar.

O homem umedeceu os lábios e estalou o pescoço de um lado para o outro.

— Essa corda...

— É desconfortável, eu sei, — Tomou distância. — mas eu tive que fazer isso. Eles acham que estou do lado deles, então tenho que alimentar a minha farsa.

— Ele morreu?

O rapaz queria dar uma boa notícia, mas infelizmente é verdade o que dizem: Vaso ruim não quebra.

O homem suspirou.

— Quem me atacou?

— A vizinha do primeiro andar. É uma puta, fica com um homem casado.

Os olhos azuis analisaram o rapaz. Quem diria que o seu primeiro julgamento havia caído por terra. De fato o chefe estava certo, ele veio de bom grado. Com os artifícios necessários para se infiltrar no meio de pessoas que eles nunca conseguiriam. O cara era bom e fiel, o que foi suficiente para atrair um ao outro.

— Não vejo a hora disso acabar. — Bruno declarou tendo um gesto positivo do outro. — Senti saudades tua.

O estômago do outro se revirou com a declaração.

— Eu também.

Bruno, movido pelo desejo insano de sentir o outro, nem ao menos conseguia compreender a gravidade daquela ação. O rapaz se sentia dentro de um lugar onde ele, mesmo tendo a pele do tom daqueles rejeitados socialmente, não era atingido pela ira dos que o odeiam. O lugar de oprimido não lhe cabia, então deles só o que tinha era o sabor doce dos lábios de quem perpetuava através da história a morte dos seus ancestrais.

 O lugar de oprimido não lhe cabia, então deles só o que tinha era o sabor doce dos lábios de quem perpetuava através da história a morte dos seus ancestrais

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Henrique acordou como se tivesse acabado de ser salvo de um afogamento. Ele estava sonhando com aquilo. Foi no ano em que ele e o irmão levaram um capote na praia do Flamengo. Uma onda após a outra, após a outra, após a outra até ele desaparecer no mar. Naquele dia seu irmão conseguiu salvar ele após diversas tentativas de massagem cardíaca. Ele poderia ter sido um médico exemplar, pois diferente da maioria, Pedro sempre se agarrou a vida.

O Assassinato no Edifício 83Onde histórias criam vida. Descubra agora