1: O Renascer de Neteyam Sully;

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Sentiu-se em claro, era como se existisse só que não em seu corpo. Não sabia exatamente onde estava, não era um lugar ou algo, era tudo tão estranho.

Sentia uma forte dor no peito, era desconfortável e atrapalhava o seu desempenho. Tinha dificuldade de se manter em pé e seus olhos estavam sensíveis, não era fácil mantê-los abertos.

Seu olhar vagava por tudo, sentiu cheiro de ervas e uma fumaça estável, era agradável. Suas piscadas eram constantes e seus olhos doíam com força, suas pernas tremiam e seus músculos estavam doloridos.

Não entendia o que estava acontecendo, era difícil entender. Sabia que estava morrendo, mas ele deveria estar com a família dele, onde diabos ele tinha se metido? Não tinha forças para levantar e vir parar aqui, o máximo que tinha de ideia era das lágrimas de seus familiares.

Sentia o seu corpo doer, mas nem conseguia discernir se estava nele. Suas mãos tremiam, e seus pés não tinham onde tocar, a única coisa dele que funcionava era o olfato e a audição.

Uma grande onda de tristeza o cercou, ainda conseguia ouvir o desespero na voz do Lo'ak e o quanto estava com medo de perde-lo. Lembrou de como sua mãe chorava e tentava controlar o sangue saindo de seu corpo. Agora conseguiu perceber que Tsireya estava junto, a garota chorava desesperada e tentava acolhe-lo. Sentiu novamente o seu pai procurando onde estava machucado, viu ele tentando controlar as lágrimas e fazer a situação se acalmar para pensarem antes de agir.

Estava contente que Spider estava bem, incrivelmente sentia que tinha todo o tempo do mundo e conseguia pensar no que tinha acontecido nas últimas horas. Seu irmão macaco estava vivo e não tão machucado, Lo'ak também não estava ferido e isso acalmava o seu coração.

Não se lembrava de ver suas irmãs, estava preocupado com elas, tinha medo que algo de ruim tivesse acontecido. Tuk era muito nova para se cuidar sozinha e Kiri não conseguiria se proteger e protege-la.

Lentamente sua visão foi estagnando, conseguia perceber algumas cores no emaranhado de acontecimentos. Não tinha a mínima noção de tempo, não sabia a quantas horas estava ali ou a quantos dias tinha sido ferido na guerra.

Ao mesmo tempo que tudo acontecia nada ocorria, o silêncio era quase ensurdecedor. Escutava a sua respiração, era capaz de ouvir seu coração batendo de forma lenta em um ritmo constante. Nenhum som externo chegava aos seus ouvidos, não conseguia produzi-los, quando tentou usar sua voz doeu, sua garganta rasgava e a queimação era constante. Suas mãos não eram capazes de se tocarem, tentou bater no chão para ouvir um estalar, nada saiu.

Começou a se desesperar, o cheiro de fuligem atingiu seu nariz, sentiu sangue escorrendo por seu tronco, não conseguia saber se estava pingando, a textura era quente e seu corpo estava frio. Tocando era liquido, todavia escorria de forma lenta e torturante.

Sua cauda se movia de maneira irregular, não conseguia controlar ou faze-la parar. Tentava se manter em pé, entretanto, era incapaz de saber se realmente estava conseguindo. A cada movimento a dor aumentava, ainda era difícil de manter seus olhos abertos por muito tempo.

Seus pés não tocavam nada, era como se estivesse tentando caminhar no ar, sua pele não sentia nenhuma brisa quente ou ventania turbulenta. Não tinha equilíbrio e nem onde se apoiar, não entendia se tinha caído ou não, a dor não atingia os seus joelhos como atingia o seu peito.

Não era capaz de controlar o desconforto, não sabia onde estava doendo exatamente, a dor se espalhava por todo o seu colo e descia por todo o interior. Queria chorar, nada saía, ou talvez saísse, ele não conseguia identificar.

Em algum momento desistiu de se locomover, sua cabeça estava uma bagunça. Se lembrava de coisas de muitos anos atrás ao mesmo tempo, revivia memórias recentes. Misturava as lembranças e inevitavelmente criava cenários que não conseguia saber se eram verdadeiros.

Viver; Neteyam e Ao'nungOnde histórias criam vida. Descubra agora