Whitechapel 1890

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O natal havia recheado a minha niqueleira, eu estava certa de que poderia viajar naquele mesmo dia depois desse cliente.

–Hoje parece estar mais frio ou será impressão minha? – Marcie perguntou esfregando as mãos enluvadas com o cigarro feito a mão entre os dentes.

– Amanhã vai estar melhor – falei tentando ser otimista.

O sino da igreja tocou cinco vezes indicando a hora. Nós esperamos, mas os homens pareciam ter ficado inebriados com as ceias proporcionadas pelas esposas e não tiveram interesse em comer fora naquela noite. As outras garotas já haviam nos deixado, encontrando seus lugares nos alojamentos comuns, só restavam a mim e a Marcie no beco.

– Beba garota, para não congelar o seu espírito. – Marcie ofereceu a pequena garrafa de aguardente caseira que carregava no bolso das saias.

– Obrigada – bebi um gole sentindo queimar o caminho todo até o estômago, como ela costumava dizer...

– Melhor queimar do que congelar.

– Deverias produzir isso em Paris, engarrafar e vender.

– Bom, eu poderia abrir o meu próprio bordel e vender minha própria bebida também.

– Há muitos bordeis em Paris, mas a sua bebida é verdadeiramente boa, alguns goles e os senhores começarão a nos atirar moedas. – eu disse rindo e lhe devolvendo a garrafa

Já podia sentir os efeitos da bebida ruborescendo a minha face, algo não muito difícil, a pele branca que Deus me dera ruborizava com o mais leviano toque, com o efeito da bebida, eu realmente avermelhava como ferro em brasa, dos seios até as margens dos cabelos loiros cacheados que eu trazia presos em uma trança.

Marcie jogou o restante do cigarro fora, sobre o gelo negro da calçada e logo uma bota de couro marrom pisou apagando a brasa com um chiado.

– Boas noites senhoras – um senhor com uma barba branca rala, em elegantes roupas pretas cumprimentou-nos, retirando o chapéu em um surpreendente sinal de respeito.

– Boas noites milorde, o senhor gostaria da companhia de duas belas damas para aquecer-lhe nesta agradável noite de natal. – Marcie tomou a frente se inclinando sobre o homem, apoiando-se sobre o seu ombro e alisando o seu peito no local aonde deveria estar a niqueleira.

– Eu quanto eu precisaria desembolsar para me utilizar destas agradáveis companhias?

– Dez xelins por cada uma milorde. – arregalei os olhos para Marcie tendo a certeza de que o homem não aceitaria.

– Hmmm – o homem franziu o cenho, antes de analisar-nos. – parecem bem jovens – ele disse segurando nossos queixos nos forçando a abrir a boca e mostrar os dentes, sem a gentileza anterior – tem alguma doença?

– Não senhor, limpas como putas virgens – Marcie respondeu sorrindo da própria anedota.

– Venham, me acompanhem até o meu automóvel.

Ele virou as costas e caminhou pelo mesmo caminho de onde veio, virando a esquerda ao sair do beco e a esquerda novamente na próxima rua, quando chegamos na grande máquina a vapor eu já estava segurando toda a minha euforia por entrar em um veiculo que não fosse puxado por cavalos ou bois, não era um veiculo novo, tinha rasgos nas costuras do couro dos bancos, mas para mim, uma jovem prostituta meio-escocesa e que mal sabia contar os próprios pennys, era o melhor que iria conseguir e eu estava grata quando o motor rugiu na neblina da madrugada, nos levando ao norte da cidade, o vento frio arrancou a touca de algodão que cobria a minha trança, aos poucos soltando meus cabelos, mas eu não dei importância. Marcie ia na frente, com uma mão carinhosa na coxa do velho homem, apertando e acariciando, para deixa-lo pronto até chegarmos ao nosso destino. Paramos em frente a uma de muitas casas, com uma aparência abandonada e maltratada, não parecia que houvessem muitos moradores por ali.

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