CAPÍTULO XXIII

1.8K 132 159
                                    




"Quantas vezes eu estive cara a cara com a pior metade? Quantas vezes a gente sobrevive à hora da verdade?"

– Surfando Karmas & DNAs, Engenheiros do Hawaii.


Filha de uma puta... - disse, reclamando da dor latente que exclamava na minha cabeça, úmida e dolorida.

A primeira coisa que pensei: Onde inferno eu poderia estar?

A minha primeira visão, de imediato, foi o chão de cimento queimado frio, a carteira de colégio velha, riscada e verde bandeira, com algumas lascas prestes a descascar e a porta de madeira pintada de azul. Cartazes do governo de 20 anos atrás, descascados e azulados, frutos do tempo. Usando da visão periférica, vi que ao meu lado ainda havia uma espécie de birô, um calhamaço de papéis amarelados e uma caneca de creche em plástico.

Era como se fosse uma fantasia colegial totalmente ruim e traumática.

Uma dor fina e aguda se instaurava no meu pescoço, certamente, eu tinha sido dopada. Juntei forças, e levantei do chão gelado, procurando algum reflexo ou espelho que fosse suficiente para visualizar o meu estado.

Nessa brincadeirinha, eu deveria ter cortado o topo da minha cabeça com uma coronhada, e arranhado meus braços, ora expostos, na queda livre.

A luz incandescente escancarava algo: eu estava em uma espécie de escola abandonada. Se meu raciocínio não restasse tão prejudicado, iria concluir logo de imediato que eu estava certamente em um local longe da Barra.

Longe da área urbana. Longe da Barra, da delegacia.

Longe de Stenio.

Minhas mãos não estavam atadas, muito menos meus pés. Qual a pretensão, o motivo disso, em questão, era algo que eu custava a compreender.

Conferi minhas chaves, telefone, relógio, arma... não carregava nada com aquilo. Filha da puta... tinha se apossado de tudo e mais um pouco. Mas tinha deixado o cadarço extra da minha bota ainda no mesmo lugar.

Desde o início da semana, eu vinha me comunicando por emails com o mandante do caso Torremolinos.

Ou melhor, com A Mandante.

Nada, em todos os meus anos de policial, havia me preparado para aquela surpresa.

Estava lidando com uma criminosa, alto nível, alta periculosidade. Golpista por esporte, ladra por instinto. Iria realmente combater com aquilo.

Fogo à fogo, tete-à-tete.

Ela pode achar que conseguiu vencer o primeiro round me apagando na noite passada enquanto saia do prédio, mas a história não poderia acabar por ali.

No pouco tempo que me ausentei, encontrei informações interessantes: A essencial era que o assassino estava morto, devidamente morto, desovado em um local totalmente fora do radar pela polícia comum, fruto de uma discordância criativa entre os níveis de hierarquia de uma grande facção da cidade, que mobiliza o sistema de tráfico na região que Alejandra morava.

A segunda era que a garota foi fruto da violência, mas, sobretudo, de uma incoerência vadia que eu havia descoberto. Um telefone sem fio, totalmente cagado, totalmente culposo.

Alejandra tinha "culpa" no cartório, de certa forma. Mas sua culpa foi por ter sido tola, ou até mesmo, peça fundamental do xadrez desse jogo que entregava um mal muito, muito maior.

Ela utilizou-se, de forma mais do que infeliz, em seu pseudônimo literário, o nome da mandante principal da facção: Atena Torremolinos.

Um estalo mental se deu em minha mente no momento que descobri aquilo. Era essa a chave, era isso, esse tempo todo.

DínamoOnde histórias criam vida. Descubra agora