CAPÍTULO NOVE

11 3 0
                                    


—Verana—

Ela não conseguiu dormir noite passada, e duvidava de que dormiria nas seguintes. Pelo menos, muitos da sua matilha conseguiram descansar. Isso a fazia se sentir melhor.

     Sua matilha.

     Tantas pessoas para liderar, e ela não sabia nem lidar com o desastre que estava a própria vida. Sabia muito bem que nem tempo para digerir a perda dos pais teria, porque o fardo do que tudo aquilo significa, é pesado demais.

     Em uma noite, Verana era apenas uma garota com o sonho de ver sua cidade natal pelo menos uma única vez, antes que aquelas criaturas a encontrassem e a transformassem em um monstro. Porque no final era isso. Ou morria, ou virava uma das bestas que tanto temia e odiava.

     Mas quem diria que em questão de míseros minutos sua vida seria totalmente destruída...? Aqueles foram os minutos mais dolorosos de toda a sua existência. Quando viu as feras dilacerarem seus pais como se fossem panos, e depois quando os viu queimar quando fugiu... Tudo aquilo foi além do que era considerado terrível. Aquele momento seria seu pesadelo constante pelo resto de seus dias.

     Ela deveria estar agradecendo aos seus Santos ou seja lá quais os Deuses que mandaram aqueles irmãos até aquele armazém, mas não conseguia fazer mais nada além de ficar imóvel na banheira e encarar o teto pálido do banheiro silencioso.

     Verana já tinha perdido as contas de quantas horas se passaram com ela ali, só existindo. Não sabia o que faria agora, nem o que iria acontecer com ela e a matilha, mas também pouco se importava em tentar sair da banheira e do barulho mortal em sua cabeça.

     Sabia que uma hora teria que sair e enfrentar o título de alfa, mas simplesmente estava absorta em coisas demais para tentar ser a líder. Afinal, o que uma garota de dezenove anos sabe sobre liderança? Ainda mais quando passou a vida fugindo, se escondendo e vivendo sob medo e a agonia de ser pega e transformada.

     Verana roça os dedos no colar em seu pescoço pelo o que deve ser a vigésima vez só nesta manhã. O pingente que seus pais lhe deram no seu último aniversário, a cinco meses atrás. Quando tudo era mais simples, mesmo com todas as dificuldades e medos constantes. Porque, apesar de lutar pela sobrevivência, ela ainda tinha seu porto seguro. E agora eles se foram.

     A loba se sobressalta levemente quando alguém bate na porta do banheiro, provavelmente para se certificar de que ela ainda não tentou um suicídio na banheira pelo tempo que passou ali dentro. Mas então, a voz familiar passa pelas paredes e a faz voltar ao presente.

     — Minsi-minsi, precisa vir aqui nesse instante! — Verana conhecia a vozinha suave e alegre do outro lado, da única criança que sobreviveu ao massacre de ontem. A última criança da matilha. Outras batidas rápidas e empolgadas se seguem. — Precisa provar as panquecas com cauda de chocolate que nos trouxeram. São simplesmente e maravilhosamente espetaculares!

     Somente Luna era capaz de fazer um pequeno sorriso se abrir no canto da boca de Verana. A pequena garotinha de doze anos, por mais traumática que sua infância esteja sendo, ainda não perdeu a essência leve e contagiante. E foi só por ela e sua luz inabalável que Verana respondeu, forçando a voz a soar firme e forte, diferente do que sua alma estava sentindo.

     — Me dê só alguns minutos para eu me secar. — mas ela não fez menção de se mexer na banheira. Ainda não. — Não deixe que comam tudo. Guarde umas para mim, está bem?

     Um ruído do outro lado da porta indica que ela se virou para ver se ainda tinha alguma comida na mesa, ou se os lobos mal acostumados a ter café da manhã no quarto acabaram com tudo. Então suspirou, como se aquele pedido fosse sua missão de vida.

~Depois do AnoitecerOnde histórias criam vida. Descubra agora