A Dor

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Os dois seres sobrenaturais encaravam o objeto cilíndrico e brilhante que repousava poucos metros à frente deles. Ambos achavam estranho aquilo estar ali naquele momento, tão perto de onde acabaram de ter uma conversa reveladora, mas não queriam questionar. O limbo era inquestionável. Objetos celestiais perdidos eram ainda mais. 

Jaemin cuidadosamente o pegou e colocou na bolsa que Donghyuck carregava, a fechando com delicadeza. Ele tinha medo desses artefatos, não sabia o que aconteceria se quebrasse essas coisas, ou se mexesse demais.

Com medo como sempre, Jaemin. O anjo pensou. Nem mesmo agora você relaxa, você não cansa de ser assim?

— Tá tudo bem. — a voz baixa de Donghyuck interrompeu seu monólogo mental —  Tem que tomar cuidado com essas coisas mesmo. Não era nem para isso estar em nossas mãos.

— Você sempre consegue captar os sentimentos dos outros com tanta precisão?

— Os que eu quero.

Antes que o anjo pudesse falar algo a mais, Donghyuck deu as costas e adentrou a floresta de árvores secas em passos lentos, fingindo analisar o cubo rastreador para poderem voltar à superfície. Fingia para não ter que olhar para Jaemin, para não ouvir mais alguma coisa vindo dele.

Fazia muito tempo que uma informação não causava uma bagunça dentro de seu peito. O demônio se acostumou a incomodar a todos, criando terremotos no núcleo alheio, mas experimentar um tsunami o engolir era novidade. Sentiu vontade de gargalhar, se dando conta que apenas Jaemin poderia causar algo assim nele. Nem Mark, nem Renjun, nem Deus nem Diabo, apenas Na Jaemin.

Você é uma criatura que supera minhas expectativas mesmo depois de morto.

Fechou-se como uma ostra para que não pudesse sentir o que Jaemin sentia. Não havia mais a ansiedade de Jaemin percorrendo seu corpo e o deixado dormente, Donghyuck já tinha a sua própria para lidar. Sabia que havia uma lágrima escorrendo pelo rosto bonito e machucado atrás de si, porém, isso ele não sentiu. Apenas sabia porque conhecia cada pedacinho de seu antigo melhor amigo — agora podia dizer que conhecia todos eles. Não fez nada em relação a isso. Não podia se disponibilizar para sentir ou ajudar outra pessoa quando necessitava focar em si próprio.

Jaemin compreendia o comportamento de Donghyuck. Ele o seguia calado, olhando fixamente a nuca e as costas cobertas pela roupa preta do demônio. Estralava seus dedos e torcia a barra de sua própria camiseta, tentando conter seu coração angustiado. Compreendia o comportamento e o odiava ao mesmo tempo por querer respostas. Queria saber como que Donghyuck estava se sentindo, o que ele estava pensando, se ele o perdoava, se ele ainda o odeia depois de tudo, se ele entenderia o porquê de nunca ter se assumido em vida.

Entretanto, tudo que recebia era o silêncio. O silêncio enfeitado com o som de passos leves, galhos quebrando e pedras chutadas. O silêncio que pesava na nuca e nas costas de Donghyuck, o deixando curvado. O silêncio que aumentava o volume dos pensamentos importunos de Jaemin.

Eles saíram da floresta e percorreram todo o caminho que Jaemin correu ao fugir dos monstros imaginários. Não era nada diferente dos outros trechos do limbo. Havia vazios, vazios e mais vazios os rodeando, tanto que podiam jurar que andavam sem sair do lugar. Era insano, Jaemin estava ficando mais insano com tal efeito. Continuava a seguir em frente por confiar em Donghyuck e nada mais.

Julgava ter se passado horas. A velocidade dos passos era lenta, tão lenta que mesmo o animal mais lento existente os ultrapassaria sem esforço. O de cabelo roxo agora analisava o rastreador de verdade, intercalando a análise com questionamentos sobre o homem que o seguia naquele momento. Algumas coisas passavam a fazer sentido aos poucos e cada uma explodia em sua cabeça como fogos de artifícios.

O Inferno de um Anjo × NahyuckOnde histórias criam vida. Descubra agora