Prólogo

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Presente

(esse capítulo podegerar gatilhos)

WRURK

Continuo fixando meu olhar nas paredes frias da cela, respirando pesadamente, lutando para manter minha sanidade mental. As lembranças dos meus amigos inundam minha mente, os momentos que compartilhamos no clã Wraog são as únicas lembranças felizes que tenho. Os treinamentos ao lado de Kaell, sendo acolhido pela mãe dele como se fosse um de seus filhos, e todas as vezes que nos metemos em encrencas juntos. Meu melhor amigo, meu irmão de coração... o que ele diria se me visse agora?

Nunca tive coragem de revelar a ele a extensão do que precisei fazer para obter um pouco de liberdade. Ele não sabe das promessas que fiz para conseguir viver antes de ser forçado a retornar para casa. Se ele soubesse, teria me impedido de partir. As coisas teriam se complicado ainda mais, e nenhuma punição no mundo seria suficiente para acalmar a guerra que se seguiria.

— Verme... — A voz de Pathenn ecoa, a fêmea que tem me atormentado incessantemente — Você tinha uma única tarefa e precisava apenas seguir uma regra..., mas você se tornou impuro... ela te deixou aqui sob meus cuidados, por causa da promessa quebrada...

Ela prossegue com seu discurso repleto de acusações, mantendo seu tom gélido. Ao sentir que uma nova sessão de tortura está prestes a começar, meus músculos começam a tremer, fazendo as correntes vibrarem e se estenderem até o teto, onde estão presas por argolas robustas e espessas.

Meu corpo continua a tremer, mesmo que minha mente esteja em outro lugar, lutando para afastar as lembranças dos últimos meses. Não consigo evitar que meu corpo antecipe a dor que está por vir.

Sim, sei que se passaram meses. Pathenn faz questão de enfatizar isso e até realiza sessões especiais a cada mudança de mês que passei neste inferno. Contei oito, ou talvez já sejam nove meses... Ou quem sabe dez... Parei de contar no sexto.

— Você queria o toque de uma fêmea? — Ela pergunta, e mesmo sem vê-la, consigo sentir sua presença. O som das tiras com espigões sendo empunhadas, torcidas entre os couros, chega aos meus ouvidos. Essas tiras devem estar banhadas em alguma poção que me impede de sangrar até a morte, mas não alivia a dor que elas causam ao rasgar minha pele.

Sou suspenso pelas correntes presas em meus pulsos, que passam por argolas no teto e nas paredes. Essas correntes foram fundidas com magia em meus punhos, tornando a dor constante. O metal que rasga minha pele impede que as feridas, causadas pelo atrito do aço, cicatrizem, e impede que o sangue seja derramado. Meu ombro se desloca sempre que sou erguido, ficando pendurado, e todas as vezes que acordo após a sessão de tortura, meu ombro está no lugar, assim como as correntes.

Quando Pathenn não está na cela comigo, as correntes são afrouxadas do teto por algum mecanismo externo, e só então sou permitido ficar em meus próprios pés. Nesse momento, também posso me aliviar e comer a carne crua que me é trazida quando estou inconsciente, mas isso é tudo. Se eu adormecer, acordo sendo suspenso para receber mais de sua "atenção".

— Você terá o meu toque verme... — Ela continua agora rosnando suas palavras — Até que ela decida que você está puro o suficiente para ela levá-lo... ou se ela decidir matá-lo...

O arrepio que percorre meu corpo dessa vez não é antecipação dos golpes, mas sim uma mistura de nojo, raiva, impotência e vergonha pelo que virá a seguir. Esses sentimentos tornam até mesmo a tortura dos últimos meses tolerável, pois me fazem lembrar o motivo pelo qual quebrei a regra. No entanto, não me permito pensar nisso quando ainda estou forte, pois não sei por quanto tempo aguentarei antes de implorar e demonstrar minha fraqueza.

Tudo o que posso fazer é lembrar do meu tempo no outro clã, mesmo quando os golpes começam, mesmo quando ela troca de arma para me infligir mais dor, mesmo quando meus gritos e rosnados ecoam pela cela, mesmo com o tormento de estar algemado ao teto por horas a fio, com suor e sangue escorrendo pelo meu corpo.

À medida que minha mente vagueia para a escuridão, permito-me desfrutar da lembrança de quando ela sussurrou meu nome com seus lábios cheios e bonitos, e como ela me chamou enquanto estávamos juntos... O brilho de alegria em seus olhos e o cabelo que caía como uma cortina de fogo sobre nós enquanto ela me montava em êxtase.

Meu corpo reagiria a essa lembrança se eu tivesse algum controle sobre meus músculos, mas mesmo assim meus olhos começam a se fechar involuntariamente. Em algum lugar, ainda posso ouvir Pathenn resmungando que estou ficando fraco demais para que ela aproveite seu tempo comigo, enquanto minha mente se afasta cada vez mais dela. Estou realmente ficando mais fraco a cada dia, e será apenas questão de tempo até que eu morra ou receba um castigo ainda pior.

Por isso, uso meu último momento de lucidez para pensar nela, permitindo-me lembrar daquele momento único, daquela única noite em que vivi plenamente. Sinto um desejo descomunal de gritar, mas não tenho forças sequer para abrir os olhos. Pouco antes que a escuridão me envolva por completo, faço algo que me neguei a desejar e até a pensar desde que cheguei aqui: desejo estar com ela.

Larissa... chamo seu nome em minha mente antes de desmaiar completamente. Em algum lugar, entre aquela escuridão, consigo ver com clareza seus olhos, seu sorriso brilhante. É como se o fogo dela se reacendesse em mim, dando-me algo que nunca senti antes, dada a trajetória que me foi imposta desde o nascimento: esperança. De repente, me pego sorrindo, o músculo do meu rosto tremendo, e uma risada que não parece minha escapa de minha boca, mesmo com o gosto do meu próprio sangue.

— Além de fraco se tornou insano... — Pathenn fala me fazendo perceber que ainda tenho algum nível de consciência — Tragam a carne do animal de estimação, deixe que se misture a sujeira do chão e deixe que ele se alivie, mas dessa vez o lavem depois que ele adormecer. Aispihn quer vê-lo amanhã.

O nome da fêmea que me colocou aqui, a usurpadora... Raiva é tudo o que consigo sentir. Ódio puro faz meus músculos reagirem com a menção do nome dessa fêmea que se aproveitou da fraqueza de minha mãe, que roubou dela seu título e tudo o mais, transformando-a em um ser sem espírito.

— Talvez eu deva continuar dando atenção ao verme, olha como ele rosna... — Pathenn debocha da minha reação, sinceramente, não percebi que estava rosnando, mas isso não me surpreende — Será que seu pau finalmente se lembrou para quem deveria ter se levantado e agora quer cumprir com seu dever? Se for isso a vinda da nossa capitã amanhã será de grande proveito para ela, mas não pense nem por um segundo verme que isso fará ela aplacar sua raiva de você... pelo que sei seu tempo nesta cela é perpétuo.

— Ela não é sua capitã... — As palavras saem de minha boca como um grunhido baixo, mas sei que Pathenn me ouviu, pois seus passos se aproximam rapidamente. Ela puxa minha cabeça para cima pelo meu cabelo, agora crescido, para encará-la nos olhos, ou o mais próximo disso, já que não consigo abri-los.

— Sua mãe é símbolo de vergonha! Você acha que ela merece ser capitã? — Pathenn rosna quase raspando suas presas proeminentes contra meu rosto — Aispihn é a única que merece o título!

— Se você quer que essa fêmea comande sua vida deveria se deitar com ela... — Respondo tirando forças de onde não tenho para atingi-la — Pena que lhe faltam atributos e coragem para impor o que deseja dela... Você só serve para fazer o que ela não tem coragem para fazer pessoalmente e mesmo assim ela continua fazendo você me manter vivo...

Pathenn não responde com palavras, mas rosna em profunda frustração e me apunhala com um pequeno punhal que ela não havia usado contra mim antes.

— Pathenn — Uma voz feminina brada na entrada da cela, embora não consiga ver de quem é a voz — Já chega, Aispihn mandou que não o fizesse sangrar tanto. Seu tempo com ele acabou.

— Tente usar sua língua nela, talvez ela esqueça que lhe falta um pau... — Consigo dizer antes que a escuridão me tome completamente dessa vez e pela primeira vez desde que fui jogado aqui, eu sonhei.

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