Capítulo 10

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A luz do sol já ultrapassa as cortinas e invade boa parte do quarto. Olho novamente para o teste em cima da cama e uma risada escapa da minha boca.

Patético.

Respiro fundo e sento na cama ainda enrolada na toalha úmida. A barreira que construí ao meu redor ao longo dos anos tem ficado cada vez mais rígida, e eu sinto o perigo da destruição cada vez mais próximo de mim. Como se uma hora tudo fosse rachar e desmoronar, não só ao meu redor, mas dentro de mim.

Sempre tive convicção do que eu quero, e sempre fiz o que podia para manter tudo sólido ao meu redor. Conquistei a confiança do Tio, conquistei um cargo de poder, segurança, dinheiro. Mas um sufoco surgiu em mim nos últimos dias como se faltasse algo, como se mesmo que eu fizesse de tudo para me proteger e me manter segura, nunca fosse o suficiente.

As crises de ansiedade aumentaram, os pesadelos durante a noite, a agonia no meu peito. E a presença do Ret se tornou uma ameaça ainda maior, como se eu estivesse prestes a perder o controle de tudo.

Ele é uma das poucas pessoas que eu não consigo ler, não consigo identificar o sentimento nem a intenção. Isso faz com que eu perca o controle muito fácil, o surto de raiva surge em questões de segundos.

Sempre fui fechada no meu mundo, nunca questionei nem mesmo ousei sair dele. Mas agora as perguntas são mais frequentes, flashs da minha infância voltam a todo tempo e aquela menina desprotegida e frágil, reluz entre a destruição.

Vesti a roupa que já havia separado no armário e peguei a sacola que Ret havia deixado mais cedo. Controlei a respiração algumas vezes antes de sair do quarto e caminhar até o fim do corredor, ainda incrédula do que eu estou prestes a fazer.

Passar por cima do próprio orgulho é como engolir a porra de uma pedra, mas convenci a mim mesma que é necessário. Ret não é como os outros caras e não é tão facilmente manipulado, é muito claro que não vou conseguir informações fáceis por bem é muito menos por mal. Então se eu quiser saber qual é a dele, eu preciso me aproximar.

Bato na porta devagar, o que faz com que eu me sinta desconfortável com o controle excessivo da força. Geralmente eu sou a pessoa aqui que não se importa com porra nenhuma. O barulho do tênis se aproxima e Ret se revela atrás da porta, com a expressão confusa como se estivesse vendo uma miragem a sua frente.

- Obrigada pela preocupação, mas não vou precisar. - Meu tom sai baixo, mas alto o suficiente para que ele escutasse. Eu desaprendi a ser serena e calma há muito anos atrás.

- Hm. - Seu corpo aparece por inteiro e sua expressão mesmo confusa, tenta me transmitir tranquilidade. - Entra aí pô.

- Que? Não! - A resposta rápida sai da minha boca, mas respiro fundo e assumo novamente o controle. - Bom, você está vestido então ok.

Eu preciso saber a verdadeira intenção dele, não posso deixar que tudo e qualquer coisa me tire do eixo. Preciso me certificar que ele não é uma ameaça e que realmente podemos contar com a sua rede de apoio. É esse o meu trabalho.

O quarto de hóspedes segue com a mesma cara de sempre, apesar de nunca ter vindo aqui antes, toda casa segue o mesmo padrão. As cortinas abertas e a cama perfeitamente arrumada faz com que pareça que ele nem se quer dormiu aqui, mas a julgar pela roupa no corpo, ele sem dúvidas é um cara organizado. O que não combinada nada.

Meu olho varre todo o quarto, procurando por algo diferente ou suspeito. Mas disfarço ao sentir seu olhar sobre mim, me analisando como sempre que pode faz.

Ret caminha até a mesa acoplada a televisão e pega um dos baseados em cima da mesma, coloca no bico e puxa o isqueiro do bolso para acender. Tentando não parecer tensa, caminho até a varanda observando a vista da piscina e do verde ao redor.

- Eu tô ligado que tu não deposita tua confiança em qualquer um, e que tu mantém a postura principalmente por ser mulher no bagulho. - A fumaça invade minha nuca e eu me viro para observá-lo falar. - Tô aqui a trabalho, não vim invadir teu espaço.

- Tranquilo. Considere isso uma trégua. - Pego o baseado de seus dedos e puxo devagar, saboreando a sensação de alívio em mim.

Ret caminha até a estante em seu quarto e volta para minha direção, esticando um cartão de visita. Intercalo o olhar entre o cartão em sua mão e sua expressão, tentando entender que porra ele estava tentando dizer.

- Um parceiro meu aqui no Rio, achei que fosse interessante te levar pra lutar de verdade. - Um sorriso travesso toma seu rosto e buraco enorme se forma em meu estômago.

O encarei em desafio e a memória da "luta" que tivemos veio à cabeça. Por mais que eu tenho acertado um soco, não muda o fato de eu ter sido facilmente domada. Se Tio estivesse vendo aquilo sem dúvidas me veria como uma piada, mesmo não abaixando a guarda, Ret brincou até quando pode.

- Luta de verdade, hm?

La Máfia com Filipe Ret • By ToryOnde histórias criam vida. Descubra agora