Capítulo 9;

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A casa dos Manoban parecia ter parado no tempo. A mobília com um quê da era vitoriana era exatamente a mesma, desde a última vez em que pisara lá há anos, e ela conseguia ver o próprio reflexo no piso polido de mármore branco.

Curioso, quando crianças, ouvimos histórias sobre vampiros e seus covis sombrios, poeirentos e repletos de morcegos; seu pequeno apartamento se parecia mais com um covil vampírico do que aquela mansão iluminada por tons quentes de branco e janelas cristalinas de quatro metros de altura.

Elas passaram pelo hall de entrada, que estava silencioso feito um convento e cheirava a sândalo, depois pela antessala da cozinha, de onde as vozes do restante da família podiam ser ouvidas. Kim não ousou atravessar o arco que dividia os cômodos. Precisava se lembrar que aquele era um território hostil, por mais que repleto de rostos amigáveis.

A caçadora assistiu a vampira caminhar graciosamente até os pais e a irmã mais nova; esta última a recebeu com um abraço, enquanto Lúcia Manoban e o marido pareceram surpresos com sua presença.

— Que roupas são essas? — perguntou a matriarca.

— Ei, mãe, eu estou viva, obrigada por se preocupar tanto — retrucou Lalisa. Depois girou nos calcanhares para indicar que eles tinham visitas — Peguei elas emprestadas com a minha nova amiga.

— Eu já não conheço você? — O prefeito se manifestou, assim que colocou os olhos em Kim e reconheceu seus traços.

— Nós estudamos juntas no ensino médio. Lalisa e eu.

— Estou ansioso para ouvir essa história.

— Rosie, mostra para a Jennie onde fica o meu quarto? Eu já vou subir.

— Mas...

— Por favor? Prometo que vou te contar tudo depois. — Lisa tombou a cabeça para o lado como um filhote, o que foi o suficiente para convencer a caçula.

Aquela era a primeira vez que Kim ouvia Lalisa Manoban dizer "por favor" a alguém. E, por mais que não gostasse da ideia de deixar a loira fora do seu campo de visão, sentiu que não era o momento de contrariá-la. Não na presença dos pais. Kim não era a pessoa mais sensível do mundo, mas qualquer um perceberia a tensão palpável que pairava no ambiente. Talvez fosse só Lúcia Manoban e o vinco entre as sobrancelhas que parecia nunca sumir; ou a aura sinistra de apatia que ela podia perceber em todos eles agora que sabia que não eram humanos.

Sem dizer uma palavra, ela seguiu Roseanne escada acima até chegarem no último cômodo do extenso corredor de portas de madeira entalhadas. Até mesmo a maçaneta parecia ter saído direto de um filme de romance histórico.

Mas, do lado de dentro, traços da personalidade de Lalisa revelavam-se aos olhos de Kim um por vez. Havia rosa e dourado por todas as partes. Um retrato exageradamente grande, pintado a óleo, da vampira pairava sobre uma lareira ornamentada, acima das caixas de joia que imitavam livros velhos. Não havia uma ruga sequer no lençol da queen size com dossel de madeira, até um gato angorá saltar sobre ela e esticar as patas preguiçosamente.

É claro que ela tinha um gato branco, peludo e gordo de olhos azuis.

Teria que prestar contas ao Tripé ao voltar para a casa com o cheiro do felino.

— Você ajudou a minha irmã, não ajudou? — perguntou Roseanne, sentando-se sobre a cama e olhando Kim bem nos olhos.

— É. Ajudei.

Eu também entrei no carro dela escondido, apaguei ela com óxido nitroso, joguei no meu porta-malas e depois a algemei na minha banheira, mas, pff, detalhes.

HeartstakerOnde histórias criam vida. Descubra agora