Uma estranha no Forte Daeho

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    Como o timoneiro havia dito, eles não demoraram a chegar em seu destino. Yeon-seon ergueu os olhos para as luzes que iluminavam as ruas repletas de vendedores e transeuntes.
Com tantas pessoas, a energia reunida era quase sufocante, em diversas cores e tamanhos, mas todas tinham como característica marcante a semelhança com a energia do lago.
- Vovó, estou com fome- reclama Ji-hye, com os lábios inferiores proeminentes.
- Não se preocupe, querida, logo estaremos com sua tia- responde calmamente a senhora Shin.
Como se tirada de um transe, Yeon-seon foi esbofetada por uma realização. Ela foi convidada para segui-las na viagem, mas em nenhum momento foi informada de que poderia ficar com elas no Forte. Sem saber o que fazer agora, ela se questinou intimamente o que fazer a seguir, e decidiu que era o momento de agradecer e se despedir.
- Senhora, muito obrigada por sua generosidade- agradece mecanicamente, sua mente já a mil visualizando suas opções a seguir, como por exemplo, onde ela passaria a noite.
Como se não entendesse sua atitude, a mulher mais velha direciona seu olhar confuso para ela.
- Do que você está falando? Você virá conosco!- exclama decididamente, como se a ideia contrária jamais tivesse passado por sua cabeça.
Surpresa, ela leva um instante para responder.
- Agradeço muito, senhora, mas não posso aceitar - responde em um tom neutro, preferindo evitar qualquer incômodo que venha a causar. 
Ao ouvir a conversa, Ji-hye, que estava ocupada focada em uma barraca de venda de brinquedos, se intrometeu.
- Você não pode ir embora, Yeon-seon!- reclama chorosamente, o que leva um sorriso aos seus lábios.
- Não devo atrapalhar vocês duas mais do que já fiz, pequena- explica gentilmente.
- Mas para onde você vai? Você disse que não tinha para onde ir- insiste a criança.
Isso era verdade, mas ainda foi constrangedor de ouvir.
A senhora Kim, que ,até o momento, observava o diálogo com o cenho franzido, interrompeu-as.
- Desse modo, façamos um acordo- começa sem deixar espaço para qualquer objeção.
- Você passará a noite conosco, e pela manhã, tem minha permissão para nos deixar- conclui suplicante.
Comovida pelo pedido, ela se vê concordando com o acordo.

    Mais tarde, elas estavam em frente a uma cabana modesta, na periferia da cidade. Havia outras casas semelhantes ao lado, lanternas coloridas iluminando suas frentes.
Como se adivinhasse a sua chegada, uma mulher apareceu pela porta.
- Aí estão vocês!- fociferou carinhosamente.
Analisando-a de maneira discreta, Yeon-seon percebeu que, apesar de mais nova, ela era muito parecida com a senhora Shin, e sua energia era muito parecida, transmitindo um ar de confiança e honestidade.
- I-mo!- exclama energicamente Ji-hye, correndo em direção aos seus braços.
A avó, que observava a demonstração de carinho risonha, se intrometeu.
- Minha filha, espero que não se importe, mas trouxemos uma convidada para passar a noite- explica lentamente, com os olhos insinuadores em sua direção.
   Percebendo que esse era o momento de se apresentar, ela se dirige à mulher, desconsertada.
- Agradeço muito por sua hospitalidade, senhora. Eu me chamo Yeon-seon- cumprimenta cortês.
Como se só nesse momento a tivesse visto, a mulher, a qual estava com Ji-hye nos braços, virou-se surpreso em sua direção, mas logo sorriu.
- É claro que não, eomeonim- responde facilmente à sua mãe, com um sorriso incerto.
- À propósito, sou Shin Bo-ra- exclama sorridente, estendendo a mão.
Mesmo cautelosa, ela não pôde deixar de sorrir ao ouvi-la, e apertou sua mão.
- É um prazer conhecê-la, senhora- responde amigavelmente, olhando-a nos olhos.
Um segundo de silêncio se passou, e quando Yeon-seon estava prestes a questionar o que estava acontecendo, a mulher a surpreende.
- Perdoe minha curiosidade, mas tenho a sensação de que já nos vimos antes, não?- questionou desconfiada.
Isso definitivamente não era algo que ela esperava ouvir.
- É mesmo?- indaga com os olhos bem abertos, e uma faísca de esperança se acendeu em seu peito, talvez vir para o Forte tenha sido de fato a melhor escolha.
  Acentindo lentamente, a mulher mais velha confirmou- Sim, mas não tenho certeza de onde...- exita- talvez você tenha comprado algo na minha venda?- contesta ponderosamente.
   - Na verdade...- ela é subitamente interrompida por uma menina impaciente.
- Vamos entrar logo, estou morrendo de fome- choraminga Ji-hye, batendo o pé no chão, e é prontamente repreendida por sua birra.
- Vamos entrar, assim podemos organizar nossas acomodações e conversar mais calmamente- informa a senhora Shin, com um sorriso carismático.
   
    Em um instante, com todos bem acomodados, Yeon-seon explica sua história para sua anfitriã, enquanto esta termina de preparar a refeição.
- Então você realmente não se lembra de nada?- questiona preocupada a mulher mais velha, preocupação honesta em sua voz.
   Ela assente, em silêncio.
Shin Bo-ra cerra os olhos pensativa, sem tirar a atenção dos legumes fervendo.
- Então ela pode ficar com a gente, não é mesmo?!- contesta esperançosa a pequena Ji-hye.
Sorrindo culpada, ela se vira para a criança ao seu lado.
- Infelizmente não, bolinho- responde cuidadosamente, olhando firmemente nos seus olhos, para que ela pudesse compreender sua situação.
    Isso não parece ser o suficiente, a pequena ainda a encarando confusa.
- Preciso ir atrás de quem sou, viajar e procurar por pessoas que talvez me reconheçam- explica timidamente, beliscando carinhosamente a ponta do nariz de Ji-hye.
A senhora Shin parece achar este o momento perfeito para quebrar o silêncio cansado que invadiu a sala.
- E você tem alguma ideia de para onde ir?- indaga de maneira atenciosa, olhando fixamente para seu rosto.
- Não tenho certeza, mas a senhora disse que o Forte é o coração de Daeho, certamente haverá alguém que possa me reconhecer- responde com falsa segurança, os lábios pressionados em uma linha fina.
Ji-hye suspira cansada, parecendo conformada com sua partida, mas não menos chateada.
- É uma ótima ideia, querida- responde docemente a senhora Shin, segurando suas mãos delicadamente, de modo maternal.
   O momento foi interrompido por Shin Bo-ra, informando-as que o jantar estava pronto.
    Um suspiro de alívio é ouvido de Ji-hye, que logo corre em direção à sua tia.
   Sentadas em uma mesa de quatro lugares, as três mulheres e a criança se serviam calmamente, e o cheiro agradável fez sua boca salivar.
    A senhora Shin é a primeira a provar, e exclama satisfeita- A sopa está ótima, minha filha- o que leva um rubor vermelho às bochechas da senhorita Bo-ra.
   Após uma troca carinhosa de elogios e agradecimentos pela refeição, ela finalmente pôde confirmar o que havia sido dito, a comida era uma delícia.
    Após terminar seu prato, a pequena ao seu lado perguntou após um ruidoso arroto- Posso pegar um pouco mais?
    Enquanto sua avó a repreendida por suas "vergonhosas" maneiras, a senhorita Bo-ra lhe servia mais uma porção, e Yeon-seon se esforçava para conter um sorriso quanto à banalidade confortável da cena.
    

      Após a refeição, ela foi guiada para o que seria sua cama naquela noite. Tratava-se de um colchão dobrável fino, que podia facilmente ser armazenado em um armário pequeno.
Ela estava dividindo um quarto com Ji-hye, que se recusou a passar a noite sozinha. Apesar de sua teimosia, o sono logo a dominou, e ela adormeceu em meio a uma conversa sussurrada sobre como ela gostou de conhecê-la hoje.
     Em poucos segundos, Yeon-seon, já aconchegada dentro das cobertas, estava se deixando levar para o reino dos sonhos, pensando em quantas reviravoltas sofreu naquele dia.
É com um sorriso otimista no rosto que ela adormece, entrando em um sono pacífico.

      Assim que seus olhos se fecharam, induzidos pelo cansaço, a realidade a sua volta foi obscurecida por um vazio silencioso.
  Abrindo os olhos, Yeon-seon foi recebida por uma claridade quase ofensiva, que a fez os proteger quase que imediatamente, com o braço direito.
  Os olhos adaptados ao ambiente iluminado, ela pôde observar os arredores, tentando descobrir onde estava.
  Ela foi saudada por uma imensidão celeste, tão profunda quanto o céu ao amanhecer, e tão tranquilizadora quanto. Suspirando surpresa, ela se sentia extasiada pela maravilha à sua volta. Inúmeras criaturas nadavam ao seu redor, peixes de todas as cores e tamanhos, todos tratando-a como uma conhecida querida, nadando em sua volta, fazendo-a rir extasiada.
   - Você conseguiu- disse subitamente uma voz à sua esquerda.
Atordoada pela presença repentina, Yeon-seon virou-se e analisou curiosamente sua companhia.
Tratava-se de uma garota pequena, provavelmente mais baixa que ela, vestida em trapos e com uma venda sobre os olhos.
   Escolhendo cuidadosamente suas palavras, ela decidiu perguntar- Quem é você?- questionou incerta.
   A figura parecia divertida por sua confusão, o que causou calafrios em sua espinha.
- Sou uma amiga distante- respondeu a menina.
- Uma amiga? Então já nos conhecemos?- indagou admirada.
- De fato, fomos muito próximas, pode-se dizer- afirmou com firmeza, sorrindo.
- Não me lembro de muitas coisas, inclusive de você- respondeu desconfiada, com os olhos cerrados.
    Sua reação pareceu diverti-la ainda mais.
- É normal que sua mente demore a se adaptar ao seu novo corpo- responde simplesmente, como quem comenta sobre o tempo.
Essa informação a deixou temerosa, não entendendo o que significava.
- Meu... novo corpo?- repetiu lentamente, como se para garantir que não havia ouvido mal.
   Isso foi respondido com um aceno delicado de cabeça.
    Essas confirmações silenciosas não eram nem de longe o suficiente para responder suas dúvidas sufocantes, e ela devolve em um tom aborrecido- O que você quer dizer com isso? O que aconteceu comigo, não terei minhas memórias de volta?
   Sua indagação arrancou um sorriso da garota.
    - Tudo ao seu tempo- respondeu contida.
    Infelizmente, isso não acalmou em nada seu coração aflito.
- Por que não agora?- levantou a voz, irritada.
- Você já está se preparando há muito tempo, não é certo que apresse o processo agora- explicou delicadamente.
    Inconformada com sua situação, Yeon-seon percebeu que essa era a oportunidade perfeita para perguntar outra coisa.
- Sendo assim, você sabe quem eu sou?- questiona curiosa, o coração acelerado.
  - Você é a sombra que se perdeu da luz- informa de maneira prática, talvez prática demais, pois apenas gera mais confusão em sua mente.
- O que isso significa?!- vocifera farta das meias palavras.
    - Você logo o encontrará- continuou de maneira misteriosa.
  Antes que ela pudesse dizer mais alguma coisa, a escuridão dominou o lugar, e a garota sumiu.
   
      Sem tempo para refletir sobre o que havia acontecido, foi repentinamente tirada de seu sonho, por uma voz chorosa.
   - Yeon-seon, acorde, eomeonim está te chamando!- exclama Ji-hye, sem o conhecimento do que havia interrompido.
   Abrindo os olhos lentamente, ela se senta cansada, sentindo como se não tivesse dormido a noite toda.
   - Yeon-seon?- repete a criança, balançando seus ombros.
    Ao focar seu olhar na pequena, depois de um instante confuso em sua mente, ela finalmente respondeu:
- Claro, diga a ela que estou indo, Ji-hye- ela sai correndo para fora do quarto, e Yeon-seon é deixada sozinha no cômodo vazio, perdida em pensamentos.

Shining so Bright, I Knew It Had To Be You, My LightOnde histórias criam vida. Descubra agora