Maybe

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Todas as noites o mesmo pesadelo, o mesmo susto e a mesma voz tranquila me socorrendo após o momento traumatizante. A questão era, eu não sabia a veracidade daquele fenômeno mas sentia estar lá ou a sensação de já ter vivido. Não tinha clareza em detalhes, muito menos conseguia dizer a alguém o que realmente acontecia.

–Aguente firme, minha bela menina!

A voz doce e preocupada marcava minha mente como brasa. Tentava lembrar de seu rosto mas era impossível, como se algo borrasse minha memória e principalmente, seus olhos.

Meu rosto era banhado por minhas lágrimas sem eu sentir. Desejei voltar a sonhar e descobrir de fato quem era a dona da voz ou nunca mais adormecer e esquecer de vez aquele sonho repetitivo.

–Querida, não chore!–Minha mãe estava ao meu lado na cama. Ethan, seu noivo, estava estático na entrada do quarto, visivelmente preocupado. Meu descontrole não me deixou perceber esse fato. Senti seus braços me abraçarem e suas mãos gentis afagavam meu cabelo.–Eu sei o quanto está difícil. Estamos muito longe de casa, longe dos seus amigos e das coisas que costumávamos amar.–Ela estava certa.–Me perdoe por fazer isso com você.

–Está tudo bem, mãe.–Levantei de seu colo e tentei sorrir.–Foi apenas um pesadelo.–Ela enxugou minhas lágrimas e me apertou contra seu peito, desejando aliviar minha dor.

DUAS SEMANA DEPOIS...

O mesmo sonho se repetia quase todas as noites e durante essas duas semanas minhas dúvidas apenas aumentaram. Isso estava me consumindo aos poucos e todos em minha volta percebiam.

Não sei dizer ao certo onde tudo havia se perdido, mas o fato é que eu, Freen Sarocha Chankimha, estava perdida. Encarando o uniforme azul e o par de meia três quartos sobre a cama, questionei qual rumo minha vida estava tomando.

Todos à minha volta estavam felizes mas eu não me sentia assim, mesmo me obrigando a sentir.

Talvez o fato de estar em um outro país, sem a maioria das pessoas que eu amo, construindo uma nova família e relações com pessoas diferentes, que riem todas as vezes que tento pronunciar alguma palavra.

Talvez... Só...Talvez, eu conseguisse responder às minhas dúvidas em algum momento.

–Minha nossa! Esse uniforme deixou você muito...–A expressão no rosto do meu amigo era indecifrável. Cruzei os braços e fiz uma careta enquanto me aproximava.

–...Ridícula?–Curvei-me sobre a janela do carro.

–...Patricinha!–Fez um gesto com a mão e sorriu.–A hierarquia daquela escola vai se abalar com a sua chegada.–Suspirei, a última coisa que eu queria era mais confusão.–Entra logo, linda! Não é nada elegante atrasar logo no seu primeiro dia.

Assenti abrindo a porta do carro. Seng aumentou o volume do rádio e colocou seus óculos escuros, mesmo o clima não contribuindo para o uso do acessório. Estava ansioso por mais um dia, ao contrário de mim que queria fugir. Beijou meu rosto enquanto eu colocava o cinto de segurança, não consegui impedir.

–Você é tão gay!–Reclamei, limpando o local onde seus lábios haviam tocado.

–Tô feliz por você estar aqui, boba!

–Claro, assim você vai poder me usar e mentir pro seu papai sobre sua sexualidade. Acertei?–Provoquei e ele engoliu a seco.

–Droga, Freen! Eu te odeio.–Resmungou dando a partida no carro.

Ao contrário de Bangkok, as ruas por ali não eram um completo caos e com dezessete anos você podia ter carteira de habilitação, assim como Seng. Ele morava ali a mais tempo que eu, seu pai era dono de uma franquia de restaurantes e nas horas vagas um homofóbico conservador. Nos conhecemos na escola, ainda na Tailândia, quando tínhamos dez anos e nos tornamos melhores amigos desde então. Foi com ele que tive meu primeiro beijo e foi comigo que ele dividiu suas dúvidas sobre sua sexualidade. Seng era meu irmão de outra mãe.

Give Me Your ForeverOnde histórias criam vida. Descubra agora