[ 13- Le paradis noir ]

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Veneza, 2015. ( O tormento )

"O paraíso negro"

Os sentimentos eram divergentes, deveriam ser, afinal meu amante e mentor se matou. Abraçou a morte como nenhum outro faria, a beijou e se deixou levar junto dela. Depois daquele começo de uma manhã ensolarada, minha vida realmente não foi mais a mesma, apenas eu tinha ficado, apenas eu sobrevivi.

Lembro-me com frequência de suas últimas palavras, de seus últimos toques singelos e calmos. Tento afastar as lembranças de seu beijo tão puro como a imortalidade, tento esquecer daquele dia, infelizmente ficaram gravados em minha mente, em meu coração. Busco ainda uma possível felicidade, ou até mesmo um pequeno momento de alegria nesse mundo tão grande e cheio.

Às vezes me pego pensando em seu rosto, tão angelical e dócil, mesmo que sua verdadeira face fosse o próprio diabo em pessoa, mas ainda assim ele era meu anjo, meu mentor, criador e único amante. Como eu desejo tocá-lo novamente, sentir sua pele fria, ou até mesmo vê-lo com seus olhos pretos nublados de desejo. Ah, quanta saudade de seus olhos azuis formidáveis como o céu.

Tudo poderia ter sido diferente, tudo poderia ter se encaixado de outra forma, menos trágica. Mas como? Não teria outra forma, não sem banho de sangue e um mar de corpos espalhados, já tínhamos passado por algo semelhante, o ciclo se repetia, sempre. Eu ainda tento entendê-lo, mesmo o odiando por te me deixado. Canalha. Todas as noites, durante cinquenta anos eu chorei, debruçado em cadáveres recém mortos, eu chorava copiosamente pela sua perda, como sinto saudades do meu falso marquês.

Às noites pareciam que nunca teriam fim. Igualmente ao meu sofrimento, como eu queria voltar em um tempo que as coisas eram mais fáceis, felizes. Até aceitaria voltar para o tempo de Nova Orleans nas mais imundas esquinas, com prostitutas baratas e festas. Por ele, sim.

As gloriosas festas já não significavam nada, as bebidas com o tempo foram se tornando apenas o sangue de minhas vítimas, as prostitutas viraram damas de conversas pela madrugada gélidas, e as riquezas tornaram-se apenas dinheiro pelo capitalismo. Acompanhei de perto a mudança do mundo, das pequenas cidades às grandes capitais que viraram extraordinárias. Mas uma única coisa não mudou, o capitalismo ainda reinava sob aqueles corpos.

Em quase seis décadas, e um novo século à frente, não posso dizer realmente quanta coisa mudou, alguns sequer foram para frente, outras coisas foram para melhor ou pior. A maldade ainda continuava e de quebra estava pior que no meu tempo, agora a polícia funcionava e tínhamos novas leis que nem sempre eram atendidas, as mulheres tinham vozes, mas ainda assim eram mortas e "servas" de seus esposos. O preconceito só piorava a cada segundo, juntamente do racismo, pessoas hipócritas não conseguiam entender que são humanos, não tem diferença, Idiotas.

O mundo estava diferente, mas ainda assim era igual ao meu século, eu ainda me sentia descolado com tanta mudança ao meu redor. As pessoas ficaram mais extravagantes e muitas delas se achavam donas do mundo, realmente o dinheiro ainda comprava tudo, menos a felicidade.

Eu perdi minha felicidade juntamente de meus amados, talvez a amargura tenha se aproveitado de mim, como eu realmente iria saber? Eu nem me importava. Eu estava sendo esperto, como ele me ensinou. "Não é apenas a matança que nos deixa vivos, mas sim a nossa inteligência com o passar dos anos, seja tolo, meu doce garoto." Eu passava de país em país, cidade em cidade e ficava entre dois e quatros anos, as pessoas poderiam desconfiar, não queria repetir os erros do passado.

O passado, esse que ainda me assombrava, me tirava meu suposto sono, malditos que ainda estão vivos. Passei cinquenta anos fugindo de muitos vampiros, muitos sussurravam que conheciam ou conheceram Louis, e nenhum dos chupadores de sangue era Javadd. Louis fez uma pequena descrição da coisa maligna. Em nove anos de sobriedade mental, pude realmente notar as pessoas à minha volta, com mais atenção. Ah, matei quase todos que queriam me matar, consumi seus últimos suspiros, foi delicioso.

Nova Orleans•L.SOnde histórias criam vida. Descubra agora