Sonho e Pesadelo - 5/5

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Um terceiro cadáver estava iluminado pela luz fraca de um celular.

— Estão matando eles afogados com essa coisa preta — constatou Nicole, apavorada, ao notar mais um morto com o líquido escuro em sua boca e narinas. — Quem são essas pessoas?

Todos os três cadáveres que encontraram pareciam ter tido uma morte horrível, com o terror, a repulsa e a dor expressos em seus rostos pálidos, molhados e desfigurados. A família estava apavorada com a possibilidade de morrer assim. Aqueles eram os homens que estiveram no caminhão, e o último ele só reconheceu devido ao nariz quebrado e enfaixado.

— Não vou deixar que façam isso com a gente — prometeu Átila, enquanto seguia pela esquerda, puxando sua esposa com dificuldade, sentindo a carne de sua perna se rasgando a cada passo. Então, com um gemido entredentes, acrescentou: — vou proteger vocês.

Mas o corredor acabou, e Átila teve que tatear as paredes para encontrar uma passagem. Girou a maçaneta, esperou a família entrar e as seguiu. Assim que passou pela porta, o policial a fechou atrás de si e a trancou, respirando em haustos, sentindo o buraco da bala pulsar e espalhar dores em ondas ferventes. A agonia era tanta que o ferimento parecia ter virado uma cratera na qual conseguiria enfiar uma bola de basquete.

— Não temos saída! — observou Nicole, olhando o cômodo, e aquelas palavras espalharam ácido por seu tórax.

Era um escritório pequeno, com uma luz de emergência fraca que mal iluminava metade da sala. Uma mesa estava no centro sobre um tapete poeirento, cercada por prateleiras com livros, alguns arquivos, um modem e um gabinete que era provavelmente usada como servidor para o sistema do restaurante. Batidas começaram na porta, estouros fortes e altos, molestando a madeira. Percebeu, apavorado e com o coração martelando suas costelas, que, assim como a da despensa, ela também não aguentaria muito.

— Eles vão nos afogar! — choramingou Nicole, nervosa e tremendo violentamente. Agora que podia vê-la graças à fraca luz do escritório, o policial se assustou com o quão pálida e febril ela estava.

Átila segurou o rosto dela com as mãos, as lágrimas de desespero ardendo em seus olhos.

— Não vou deixar que isso aconteça com vocês! — disse firme, sentindo o peito se rasgar ao encarar aqueles olhos castanhos tão aterrorizados e necessitados de segurança quanto os da filha, e que estavam envoltos em olheiras fundas, talvez pela privação de um descanso apropriado.

Nicole concordou com um movimento de cabeça, tendo dificuldade em aceitar que tudo ficaria bem. Então, como se quisesse mudar de preocupação para uma que fosse mais fácil lidar, ela gaguejou:

— Aquela coisa que tu atirou antes... podia ter sido uma criança ou alguém ferido.

— Não era. O aperto era forte demais. — Ela assentiu e o abraçou, chorando e segurando o rosto da filha contra o pescoço, como se a protegesse de qualquer mal que poderia entrar naquela sala claustrofóbica e despida de esperanças. Um estalo agourento ressoou como um trovão, fazendo-os se virar instantaneamente na direção da porta. Nicole se encolheu contra seu corpo, e o pavor dela rachou cicatrizes de fogo em sua mente. Aflito por dar algum conforto para a esposa, Átila balbuciou: — não precisa se preocupar. Vou atirar em todos aqueles desgraçados.

— Tu tem munição suficiente? — A pergunta de Nicole foi quase automática, a voz tão tomada pelo medo que já quase não tinha entonação ou emoção alguma; uma coisa apática, sem vida, como se já estivesse aceitando seu destino.

Átila retirou o carregador e separou as balas. Então, ao contá-las, uma ardência se espalhou por seu peito, a garganta ficou seca e o ar pareceu rarefeito. Ele só tinha três projéteis, contando com a que estava na agulha. A mão tremeu segurando a munição, e o primeiro som de madeira rachando estalou em seus ouvidos. Olhou ao redor, procurando algo para poder usar como arma branca, mas não encontrou nada além de materiais de escritório, pastas de arquivos e um teclado de computador que nunca viu uma única limpeza.

O Cavalo Pálido na Chuva - Volume 1Onde histórias criam vida. Descubra agora