A primeira coisa que os atingiu foi o cheiro. Repulsivo e de uma podridão sufocante. Um fedor pútrido que Felipe nunca sentiu antes. Foi como ser recebido por um soco, precisando dar um passo atrás no momento em que adentrou o edifício. Suas narinas arderam em agonia, o estômago se embrulhou, causando dores físicas, e o corpo tentou pôr para fora a pouca comida que ainda restava em seu interior. Apesar de conseguir identificar algo parecido com carniça, era impossível discernir qualquer outro odor naquele amálgama de coisas nefastas.
Arthur protegeu o nariz com a manga da camiseta.
— Que porra é essa?!
Felipe olhou ao redor em busca de uma explicação. Porém, era difícil ver qualquer coisa no interior do prédio. O lado bom, se é que havia algum, era que ao menos estavam protegidos do vento cortante da rua.
— Não sei, mas cuidado com o chão — respondeu, puxando a gola para cobrir parte do rosto numa tentativa desesperada de se proteger do fedor. — Tá tudo molhado aqui.
O sol lá fora lutava para trazer um pouco de brilho àquela manhã fria de sábado, mas essa luz débil mal conseguia passar da porta. Os primeiros metros eram de uma penumbra que permitia ver apenas o piso encharcado por uma água salobra e espessa, mas, depois de alguns passos, uma escuridão densa tomava conta do corredor sem janelas.
Enquanto andava com cuidado para não escorregar naquele alagamento, torcendo para a enorme e escura poça fétida não destruir seus tênis, Felipe procurou pelo celular no bolso após testar o interruptor e confirmar que não havia energia.
Logo atrás, Arthur comentou com a voz abafada pela manga:
— Fico feliz que a porta esteja estragada. Pelo menos temos um pouco mais de luz aqui.
Agradeceu mentalmente ao achar o aparelho em um dos compartimentos da calça que não estava acostumado a usar, aliviado por não o ter esquecido no quarto de dona Lúcia. Porém, a alegria durou pouco. Ao ligar a tela, o relógio indicava que o tempo dado por Verônica havia se esgotado há três minutos. Não havia mais como levar sua família de volta para a zona de quarentena sem ser escalando a casa de Arthur, e não fazia ideia de como sua mãe faria algo assim. Fechou os olhos com força, praguejando em silêncio e torcendo para Anne ter voltado a tempo. Ou nem ao menos ter conseguido sair. A última coisa que precisava agora era se preocupar se sua amiga estava segura.
Demorou alguns segundos em um silêncio incômodo para o desenhista industrial perceber que deixou o outro sem resposta.
— Ah! Não está estragada, ela fica aberta por mais tempo agora. O dono do prédio mexeu no braço hidráulico para a porta fechar mais devagar porque semana passada ela bateu no casal de velhinhos daqui do primeiro andar e conseguiu derrubar os dois no chão.
O estudante de História parou de caminhar por um instante, surpreso.
— Eles estão bem?
Felipe deu de ombros, conseguindo se preocupar apenas em chegar no quarto andar o mais rápido possível, parando apenas para mexer no celular quando chegou nas escadas.
— Os dois se ralaram um pouco, mas nada de mais — falou sem tirar os olhos da tela.
Assim que a lanterna clareou os degraus mal iluminados por janelas estreitas e altas entre os lances, o desenhista industrial galgou-os de dois em dois, ainda com certo cuidado devido às solas molhadas. Arthur o seguiu com uma respiração entrecortada pelo cansaço, usando o auxílio do corrimão para manter o ritmo. Em algum piso acima, era possível ouvir um cachorro de pequeno porte latindo como um condenado, disputando quem era o mais barulhento com alguém batendo freneticamente em uma porta de madeira.
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O Cavalo Pálido na Chuva - Volume 1
Kinh dị⚠Versão Atualizada⚠ Talvez se Anne e seus amigos soubessem o que estava por vir, não teriam escolhido passar suas últimas horas jogando RPG. Agora eles são obrigados a sobreviver à brutalidade nua e crua de uma sociedade em decadência andando a pass...