2 • Quando há avisos no céu

65 9 11
                                    

Palácio Vermelho, Reino do Norte
5 luas até o Ano da Colheita no Sul

Havia uma clara diferença entre temer e respeitar.

O Norte mais do que nunca vivia refém sob a sombra gigantesca do medo que lambia suas espinhas de forma grotesca e fria, lembrando-os constantemente o significado de trabalhar para sobreviver e não para viver. Todos sabiam disso, sabiam que aquilo não era vida, era cruel e sádico, mas o medo... O medo era um sentimento forte o suficiente para mantê-los na linha, e se não fosse, bem, nada que uma boa amostra do que aconteceria não resolvesse.

O Palácio do Norte era escuro, as paredes de pedra avermelhada como carvão em brasa pareciam sussurrar as atrocidades que presenciaram, mas nada impedia que o jovem Imperador se deliciasse com o vinho de arroz enquanto ria alto, alheio. Seus convidados, ainda que tensos, comiam e bebiam da mesa farta também, em total contraste às dezenas de famílias do Reino que se contentavam apenas com pães mofados em suas refeições.

- Perdão Senhor, mas o que exatamente estamos comemorando?

Olhares e arfares foram ouvidos, alguns nem se atreveram a olhar para o Soberano, mas nem aquilo pareceu ter afetado o seu inabalável bom humor.

- Bogum, meu querido Bogum... - o sorriso lateral e cheio de escárnio estava ali. O Rei sabia que todas aquelas pessoas estavam ali única e exclusivamente para o seu agrado, e ele sentia, sentia o cheiro. - Estamos comemorando porque acabamos de pôr um dos pés no Sul.

- Meu Rei, não nos avisou?

O Imperador arqueou uma das sobrancelhas ainda que apenas isso tenha mudado em sua expressão relaxada.

- Não sabia que eu lhe devia explicações, Bogum. Muitos dos meus sucessos se devem porque eu aprendi a ficar calado enquanto executo o que deve ser feito, não preciso falar de meus planos para sanar a curiosidade de gente como você - respondeu afiado - Entendeu?

Bogum baixou os olhos para o colo, a cabeça inclinada para baixo. Sentia o coração pulsar nas próprias orelhas com tanta intensidade que achava ser possível que ele explodisse em mil pedaços.

- Sim, Majestade.

Ali estava aquele cheiro doce e impregnante, que chegava às narinas do Soberano como o aroma mais viciante de todos; cheiro de medo.
Seu sorriso se abriu mais depois de engolir um grande gole de vinho e se levantar em seguida para caminhar ao redor da mesa grande com passos preguiçosos.

- O Sul sempre foi o meu alvo - ele continuou a falar sereno, quase como se contasse uma história -, a terra, os rios, as pessoas, até o sol parece brilhar mais lá e eu queria aquilo. Sempre quis, desde menino. Loucura, não? Seria uma total loucura desafiar uma potência como eles, logo eles que foram os responsáveis pelo tratado onde os Reinos escolheram nos manter longe.

O rosto jovem adquiriu uma expressão zombeteira.

- Política e política. Já estava mais do que na hora do Norte ser respeitado, e qual a melhor maneira de fazer isso senão mostrando que somos fortes também? Preparei o exército por longas luas, aguardando o momento ideal e vejam só - ele parou ao lado de uma das cadeiras ocupadas pela pessoa jovem, as roupas não eram características do Norte, mas ainda assim o Imperador pousou a mão cheia de anéis no ombro alheio atraindo a atenção de todos presentes -, os deuses me mandaram a resposta que eu queria, e você me entregou o que eu precisava saber para ter sucesso. O combo perfeito.

Os olhos deles se conectaram por alguns segundos, não havia a menor sombra de remorso nos azulados e o Imperador gostou disso, antes de voltar a se sentar na cadeira ornamentada.

Depois das estrelas • myg + pjmOnde histórias criam vida. Descubra agora