última chamada

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              Ainda reli a carta da Lily algumas vezes antes de pegar no sono com ela nas mãos. Adormeci com a roupa que estava e o Gato enrolado nas pernas. Na manhã seguinte, acordo por causa do frio. Abro os olhos para puxar o cobertor pra cima e vejo que a neve caía do lado de fora da janela. Já era Natal.

              O feriado havia chegado e eu só conseguia me sentir miserável. O relógio na mesinha de cabeceira mostrava que eu já havia perdido o café da manhã, mas eu não me importava pois não tinha fome alguma. Com receio de encontrar Sirius na sala comunal, hesito por um tempo, antes de levantar.

             Já vestida e com minha bolsa no ombro, verifico o ambiente antes de entrar. Não havia ninguém, respiro aliviada e atravesso o retrato da Mulher Gorda. Subo até o segundo andar sem encontrar uma alma viva ou morta, mas dessa vez não entro na biblioteca. Ao invés disso, continuo andando pelo corredor e me sento na janela, próxima a um dos vitrais que dão vista ao campo de treinamento. Tiro da minha bolsa o livro Hogwarts: Uma História e começo a lê-lo pela terceira vez.

             Estava lá pela vigésima página, quando alguma coisa passa voando bem perto dos meus olhos, como um inseto. Dá a volta na minha cabeça e pousa, magicamente sobre o meu livro, era um pequeno avião de papel. Ele se desdobra sozinho, revelando uma frase escrita num garrancho a pena no seu interior.

             "Me encontre no pátio da torre do relógio ao meio dia"

              Assim que li a última palavra, o papel magicamente desapareceu diante dos meus olhos. Levanto a cabeça rápido e corro minha vista de um lado a outro, mas não havia ninguém por perto. Meu relógio de pulso e me dizia que ainda havia uma hora pra eu decidir o que fazer. 

              Tento voltar a leitura, mas meus pensamentos não deixavam e me pego olhando pro jardim. Lá embaixo no gramado agora branco, conseguia ver dois alunos mais novos brincando com a neve. Era tudo mais fácil quando se era criança!

1º de Setembro de 1970 – Expresso Hogwarts

— E se eu não entrar pra Corvinal, Vi? – Uma garotinha com longos cabelos cor-de-mel passa pela porta e senta-se próxima a janela da cabine. – Pior! E se eu for pra Sonserina?

— Não seja boba, Zozo! Você não vai pra Sonserina. – diz o irmão da garotinha, fazendo-a sorrir.

— Ouvi dizer que tem uma cobra gigante na Sonserina e todos que entram têm que levar uma picada dela. A dor é tão forte que já matou um aluno. – um menino pálido diz sentado no canto perto da porta, fazendo os irmãos se assustarem com sua presença até então não percebida. – E que o fantasma desse aluno ainda vaga pelo castelo procurando meninas choronas pra puxar o pé enquanto elas dormem! – a garotinha arregala os olhos e Sirius cai na risada.

— EI! Essa cabine é nossa! Deixa a gente em paz! – diz a mini versão do Victor enquanto a irmã assustada abraçava o seu braço. – Não liga pra ele, Zoe. Nós vamos pra Corvinal juntos, lembra?!

— Corvinal, é?! Que grande porcaria! Só chato entra pra Corvinal! - Sirius zombava com a boca suja de sapos de chocolate.

— Fique sabendo que a Corvinal é a melhor casa de todas! – Victor fala, cruzando os braços, de pé no meio da cabine.

— É a melhor casa pra um bebê chorão igual você! – Sirius também se levanta.

— Não fala assim do meu irmão! – Zoe se posicionava ao lado do gêmeo.

— Por quê? O que uma garotinha como você vai fazer?

A menina se aproxima de Sirius e lhe dá um belo chute na canela. Já estava pronta pra dar outro, quando é segurada pelo irmão e arrastada pra fora da cabine, deixando o menino de cabelos negros de olhos marejados.

             Aquela lembrança me fez soltar uma risada espontânea. Pego minha bolsa e levanto correndo em direção as escadas. Esbarro em um aluno da Sonserina pelo caminho, e grito um pedido de desculpas enquanto continuo a correr. 

            Começo a subir as escadas mas elas resolvem mudar de direção e eu tenho que esperar pacientemente até que voltem ao normal. Chego atrasada ao pátio da Torre do Relógio e não vejo ninguém. Me apoio na fonte localizada no centro.

— Tá atrasada, Laverne! – diz uma voz atrás de mim, fazendo eu me virar assustada. Saindo de trás de uma pilastra, Sirius me olhava com as mãos dentro dos bolsos da sua calça. – Achei que você não viesse.

— Eu também achei. - sinto meu coração acelerar enquanto ele se aproxima.

— O que a fez mudar de ideia? - Sirius passava as mãos no cabelo inquieto.

— Curiosidade, eu acho. - engulo a seco - O que você tem pra me falar?

— Eu queria te perguntar... - o garoto fitava os sapatos - Se podemos esquecer tudo que aconteceu nos últimos dias? 

— Ah... - minha boca se abre mais não digo nada.

— Podemos só voltar a ser o que éramos antes. - aquelas palavras me atingiram como um soco no estômago. 

— Já tá tudo esquecido, Black. - digo secamente - Mais alguma coisa?

— Não...

— Ótimo! Não precisava me fazer perder tempo vindo aqui. – Digo dando meia volta.

— Eu sinto muito. - Ele murmurava me fazendo parar no meio do caminho.

— O que? - Me viro novamente sem saber o que escutei.

             "ÚLTIMA CHAMADA PARA O TREM DAS 13 HORAS!", berrava o autofalante.

— Tenho que ir agora. – Sirius pega sua mala e corre em direção à estação me deixando pregada no chão. De longe vejo o garoto me encarar da janela de uma cabine, quando o trem começou a andar fazendo eu o perder de vista.

            No momento que consegui me mexer novamente, entro no castelo e me dirijo ao meu quarto. Atravesso o quadro da Mulher Gorda, a senha dessa vez era Jingle Bell, e adentro o cômodo vazio. De relance vejo algo brilhar na mesinha de centro e me aproximo. Era uma caixinha pequena e branca com um cartãozinho em cima. Escritas num garrancho a pena que eu conhecia, apareciam às palavras "Para Zoe". Ao lê-las, sinto meu estômago gelar.

           Observo aquele presente como se ele fosse uma cobra prestes a me morder. Num impulso pego o estranho pacotinho nas mãos e decido abrir. Meu coração acelerava mais à medida que eu desfazia o laço prateado que contornava sua embalagem. Respiro fundo e removo a tapa com delicadeza, encontrando o conteúdo.

            Permaneço muito tempo encarando aquele objeto enquanto um redemoinho de pensamentos passa pela minha cabeça. De súbito, me levanto decidida rumo ao meu dormitório. Coloco o Gato na sua bolsa especial para viagens e a Sra. Orelhas na sua devida gaiola. Abro meu malão em cima da cama e despejo todas as minhas roupas lá dentro. Jogo também alguns livros e pergaminhos, e coloco com delicadeza o presente que comprei para Lily. Encaro a figurinha da Batilda Bagshot por alguns minutos antes de guardá-la junto com a caixa branca. Fecho o malão e deixo Hogwarts pra trás.

Desventuras | Sirius BlackOnde histórias criam vida. Descubra agora