From Winter, to Spring - Cheng & Ling

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Jiang WanYin estava no limite.

Sandu tremia em suas mãos, enquanto ele ofegava e olhava a janela com o coração batendo descompassado. Era a terceira noite consecutiva que seu sono era interrompido por pesadelos e, em cada um deles, o Jiang podia ver o olhar característico de seus familiares, até que dessem lugar à corpos ensanguentados e deformados.

Ele já demonstrava ter perdido a razão desde que seus pais foram assassinados, mas quando aquele cultivador tirou a vida de sua irmã, sorrir se tornou nada menos que uma lenda distante.

Sandu ShengShou era conhecido como um homem brusco, violento e cruel, mas se cada um soubesse o que se passava em sua cabeça, se aproveitariam de sua fraqueza e retomariam a posse do píer.

Yunmeng Jiang foi reerguida com esforço, mas apesar da prosperidade, o líder de seita estava a beira do colapso.

Na verdade, por que ele ainda estava ali? Ele perdeu sua casa, sua família, tudo o que tinha de valor foi roubado sem um pingo de remorso e ele lutava para reconstruir um local que já não teria mais o mesmo valor emocional.

As memórias que passou com os irmãos no pier lótus, o jantar com os pais, o treinamento com sua mãe... Mesmo reconstruindo cada lugar, a essência e as memórias seriam as únicas coisas que permaneceriam.

Tudo o que ele tinha naquele momento eram lembranças... Lembranças banhadas a dor e um artefato que soava mais como uma maldição que uma herança.

Sandu o lembrava do quão inútil eram seus pensamentos e Zidian do quão fraco ele poderia ser.

Cheng queria gritar.

Ele já não aguentava mais.

Não dormia direito há dias. Não COMIA direito há dias. Sua vida se tornou um antro pálido e cinzento, como o inverno que cobria o lago de lótus naquele instante.

Ele estava pronto para partir e encontrar sua família. Estava pronto para pedir perdão por cada uma de suas falhas. Estava cansado de olhar para o lado e ver todos que se foram estendendo a mão em sua direção.

O líder se aproximou da janela arredondada e abriu o vitral que atrapalhava a vista do lago. Ainda não havia congelado, mas estava frio o suficiente para levá-lo ao inferno da forma mais dolorosa possível e era isso o que ele queria. Passar por pelo menos um pouco da dor física que seu pai, mãe e irmã sentiram.

Ele se sentou na janela, pouco se importando com o vento que congelava cada pedacinho de pele exposto e observou a espada que o acompanhou por toda a vida. Poderia usá-la para dar início a sua sentença...

E quando alcançou o cabo decorado com detalhes em prata e roxo, fechou os olhos com rapidez, guiando a lâmina até o pescoço.

Igual à neve que jamais derreterá
Se o inverno persistir e não passar
Meu coração também vai congelar

Sei que nunca me libertarei
Se tudo que eu senti
No peito eu guardei

Se o que passou não vai voltar
O amanhã não vai chegar
A eternidade é pior de se enfrentar pra quem está só
Procuro forças pra seguir
Mas como vou me despedir?
Não sei dizer adeus

— L-Lider de seita Jiang?!

A voz de uma serva impediu seus movimentos, assim como o choro infantil que se alastrou por todo o cômodo.

WanYin baixou a lâmina e se virou com lentidão. Tudo estava borrado, desde a cama até a porta recém aberta.

— O que foi?

— S-Sinto muito, meu senhor. Mas o jovem mestre não parava de chorar e já não sabíamos o que fazer. Ele não sente cólica, não está molhado, também não está com fome.

O homem baixou o olhar do rosto da serva e encontrou a criança que ainda chorava, esfregando a mancha vermelha da testa...

Sim, vermelha.

O pequeno Jin Ling era a única imagem colorida e em alto contraste que o Jiang conseguia enxergar. O bebê soluçava enquanto buscava ansiosamente por alguma coisa e quando o líder o alcançou o dedo indicador, a conexão foi instantânea.

O Jin parou de chorar no mesmo segundo e os olhos do Jiang se arregalaram com a visão.

Como ele pôde pensar em partir quando ainda tinha alguém para cuidar? Para proteger?

WanYin não foi o único a perder alguém, A-Ling era só um bebê e perdeu seu pai e sua mãe. Que espécie de tio ele seria se deixasse o primogênito de sua irmã crescer com os mesmos traumas pelo qual ele passava?

WanYin se apressou em soltar a espada e pegar o pequeno que se achegou em seu peito. Ele tremia de novo, mas não pelo frio... E dispensando a mulher com um gesto, se aproximou da cama com o menino.

— Me perdoe, A-Ling... Me perdoe...

Igual feitiço que ninguém irá quebrar
Fui amaldiçoado por sonhar
Com o futuro que jamais será

Eu não sei o que devo esperar
Por fora pareço bem
Por dentro vou gritar
Ah!

Já não consigo mais chorar
Eu tanto vejo congelar
E o silêncio que restou
Não me conforta, só traz dor

A nossa história foi assim
Mas todo inverno chega ao fim
Chegou a hora de me despedir

(5 anos depois...)


— JiuJiu? JiuJiu?

— O que foi, moleque? Já disse para não correr nos deques. Quer que eu quebre as suas pernas?

— Hm... O senhor sempre diz que vai quebrar e nunca quebra... — a resposta atrevida deixou o Jiang irritado e fez os líderes de Gusu, Lanling e QingHe segurarem às risadas.

Jin Ling estava crescendo e logo mais, completaria cinco anos. Os primeiros anos foram cruciais para o desenvolvimento do pequeno e ele os passou completamente ao lado do tio, em Yunmeng.

Aquele tempo foi proveitoso não apenas para a criança, mas também para o Jiang que completava a transição de adolescente para adulto.

E embora o homem discutisse sempre e repreendesse a criança à maior parte do tempo, ainda foi para ele que o pequeno Jin estendeu os primeiros brotos de lótus e crisântemos que floresceram naquela primavera.

As flores já começavam a pintar o ambiente, combinando com o azul do céu e as florestas verdejantes de Yunmeng.

E quando o homem se abaixou para apanhar os brotos, um forte arrepio percorreu sua espinha enquanto a voz de sua irmã ecoava em seu ouvido.

"São lindas, estou lisonjeada, A-Cheng..."

— São lindos, né? — a criança sorriu, mostrando duas janelinhas na fronte superior de seus dentes.

— Sim... Estou lisonjeado, A-Ling.

Repetiu a frase da mais velha e afagou o seu cabelo.

— Vá brincar...

— Tá. Até logo, JiuJiu. Te amo!

— Até... — um sorriso discreto surgiu em seus lábios.

Se o que passou não vai voltar
Pra frente tenho que olhar
A eternidade é melhor
Se sei que nunca vou estar só
E mesmo se eu me despedir
Você vai sempre estar aqui
Eu vou dizer adeus

Fuyu no Hanashi (Português Version) - Given

MDZS (Songfics)Onde histórias criam vida. Descubra agora