O escritor - Parte 2

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Fênix entra na casa de seus pais, segurando a mão de sua mãe enquanto ambos limpam as lágrimas deixadas no rosto. O pai tranca a porta e acompanha o filho até o interior da moradia, a mesma que é repleta de movéis. 

A sala de estar tinha uma mesa no centro, em cima de um tapete, essa que também havia três sofás e duas poltronas em sua volta. Numa parede havia uma grande televisão e na oposta à essa havia uma estante com infindáveis livros sobre todos os assuntos que Fênix podia recordar. Haviam alguns balcões com vasos e fotos, algumas dessas que revelavam o garoto na juventude. Os pais pedem para ele se sentar, e ele esclarece que não vai passar muito tempo ali e que só desejava dar um oi, mas mesmo assim ele se senta e aceita toda a hospitalidade. 

Enquanto conversavam sobre trivialidades e colocavam o papo em dia, a mãe preparava um chá, essa que decide perguntar como está a vida do filho no apartamento e com os amigos. Fênix sente uma pontada de ansiedade no peito. Isso era miserável. Essa vida dele era miserável e ele não queria que os pais soubessem de sua miséria. Sem amigo algum, basicamente indigente de dinheiro e isolado. Não queria que os pais soubessem desse lado de sua vida, então mentiu:

- Está tudo bem, eu ando frequentando alguns lugares aqui e ali. - A mãe chega com um grande prato repleto de xícaras e o garoto começa a coçar o braço enquanto sorri gentilmente para os pais. - E..

- E as namoradas? - Não intencionalmente, o pai interrompe o filho com uma pergunta trivial. Como eles não se comunicavam muito, ele não fazia ideia alguma sobre o convívio social do próprio filho. - Tem alguma mulher em mente? Alguma "amiguinha" se é que me entende? - O pai sorri de um jeito alegre e brincalhão enquanto gesticula. 

- Nah, eu to bem de boa, e ainda não to falando com nenhuma mulher nem nada. Tipo, eu tenho amigas e tal... - Ele começa a analisar o ambiente em volta e coça a nuca com o braço esquerdo. As paredes e tapete bege, o chão e algumas mobílias de madeira bem escuro que mostram bem suas listras e um corredor iluminado por uma esbelta lamparina na parede. - Mas não é nada desse pique assim sabe? Só amizades.

- Eu não acr.... - O pai dizia sorridente antes de ser interrompido.

- E tá estudando ou fazendo o que? - A mãe pergunta, colocando o grande prato com 3 xícaras de chá na mesa de centro e se sentando numa poltrona com uma das xícaras que estava no prato na mão. O pai olha para ela meio desconcertado por ser interrompido assim mas não se importa tanto.

- Ainda não comecei a estudar, por enquanto to escrevendo umas histórias para a internet e talz, mas planejo ir para alguma universidade ainda ou algo assim. - Ele já havia passado o ENEM, mas nunca se preocupou em ir atrás de entrar em alguma faculdade pois sempre deixou para depois. 

- E como que tá indo isso aí?

- Ah, está indo bem, tem gente elogiando, tem gente falando mal e umas pessoas dando dicas, é sempre assim. Mas no geral tá tudo indo bem. - Ele dizia sorrindo e virando o rosto corado. - Gosto muito de colocar minhas ideias no papel. - Ele levantou a xícara de chá quente à boca e começou a tomar, quando a sua mãe perguntou, fria e calmamente, para ele:

- É mentira, né? - Ela olhava para baixo, através da lente retangular de seus óculos enquanto revelava um sorriso melancólico. O pai olhava surpreso para ela por ter quebrado o clima alegre da reunião. Fênix se engasga com o gole de chá e começa a tossir, olhando confuso para a mãe, como que buscando alguma explicação da mesma. - Você aparece aqui, vestido aos trapos, com uma calça toda abarrotada e uma camisa amassada e de chinelos? Além dessa barba que parece não ser cortada há muito tempo. Você ainda precisa do dinheiro que mandamos e está dizendo que só veio aqui de passagem para dar um oi? Você estaria indo para onde? Eu sei dizer quando você mente. Você tá todo se coçando e desviando o olhar. - Fênix olha para baixo, cabisbaixo e aceitando a derrota. Com uma voz entristecida e derrocada, sem levantar o rosto, o mesmo pergunta:

- Eu sou um desperdício, mãe? - O garoto, sem nem levantar a cabeça e deixando a xícara, meio cheia, na mesa; pergunta.

- Não. - Ela sorri. - você não é um desperdício, não é um fracasso. Nem nada. - Sem fazer barulho algum, Fênix deixa lágrimas despejarem-se dos seus olhos e caírem no chão. - Só faça o possível para mudar a situação que você está agora. - O pai está boquiaberto. Sem nem ter visto sobre a condição do filho, ela já sabia exatamente em que situação ele estava; esse que limpa os olhos com as costas das mãos e levanta todo o torso abruptamente, pegando a xícara e tomando o chá de uma vez. 

- Já sei! - Tentando animar o clima pesado do reencontro, ele decide ligar a TV e colocar em um canal que acompanhava, esse que no momento passava um filme de comédia, que sem delongas, todos decidiram dedicar à sua atenção. O filme durou uma hora e meio, e ao seu término, os pais do garoto estavam extremamente sonolentos, então Fênix se despediu de seus pais brevemente e foi embora. Essa conversa foi incrivelmente reconfortante para ele, poder falar mais uma vez com aqueles que há muito não tinha trocado palavras. Voltou ao terminal rodoviário e esperou um ônibus para voltar para casa.

Retornou ao apartamento, trancou a porta e decidiu que mudaria de vida. Dedicaria mais tempo à suas escritas e tentaria entrar numa universidade. Ele sabia que universidades custam bastante, então decidiu que faria o ENEM mais uma vez para conseguir a maior bolsa possível e vingar o dinheiro que pediria aos pais para investir nele.

Continuou à escrever suas histórias, que melhoraram um pouco, segundo o público, desde que publicou o capítulo da conversa entre Iohann e seus pais, já terminado; o qual ele tinha usado todos seus dotes de escrita e a experiência daquele dia para escrever. Ele havia conseguido, a partir de uma vivência real, imbuir humanidade aos personagens. Ele queria poder continuar a agradar o público e melhorar não só como escritor, mas como pessoa. Isso iria dar certo. Tinha que dar.

No final do ano, ele refez o ENEM. Havia estudado por bastante tempo, e claro, não desistiu de escrever, mas havia dado um foco um pouco maior aos estudos para poder ganhar uma bolsa que seria um valor pagável. Ele podia não ter dinheiro e não ser tão bom para escrever, mas com certeza era bem inteligente. 

Conseguiu uma bolsa de 75% de desconto e apresentou aos pais, esses que sem demoras concordaram em pagar pelos custos da universidade, desde que ele não desviasse dos estudos, o que ele de prontidão confirmou não o fazer, e realmente não fê-lo. 

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