Momento

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Miyeon não ouve falar de Shuhua pelos dias subsequentes à viagem.

Ela sabe, evidentemente, o quão fácil seria encontrá-la: uma mensagem de texto para Yuqi, que falaria com Soyeon, que passaria o número da prima e voilà, Miyeon teria exatamente o que quer. Mas por algum motivo mesquinho, ela se recusa a ser a primeira a procurar pela garota, e, principalmente, deixá-la ter qualquer noção de que esteve pensando sobre isso — pensando sobre ela.

E, não, Miyeon não está admitindo a quantidade de vezes que se pegou desejando seus beijos provocativos, ou o calor confortável de seu abraço, e até mesmo sua língua astuta ao responder a cada uma de suas bobagens, com insinuações que poderiam facilmente deixá-la bufando de irritação ou choramingando de desejo.

Além disso, Miyeon não faz ideia do status atual de seu acordo com Shuhua — que ela sequer chegou a aceitar verbalmente —, e enviar à garota uma mensagem dizendo 'Ei, idiota, estive tão obcecada por você nos últimos dias que peguei seu número com Soyeon e decidi mandar um oi, mesmo tendo ficado um pouco confusa sobre que merda aconteceu na última sexta, mas quem se importa, não é? A gente ainda pode se encontrar pra transar?' não seria nem um pouco inteligente de sua parte.

Por isso, Miyeon se esforça para diminuir a constância e a intensidade de pensamentos sobre seu tempo com Shuhua. Empenha-se vigorosamente em se manter o mais distante possível de qualquer via que possa levá-la até a garota. Esquecer tudo sobre o último fim de semana se torna seu único e mais importante objetivo.

Talvez isso baste para subtrair esse novo e persistente incômodo de sua vida.

Talvez até a impeça de baixar os dedos com tanta frequência pelo próprio corpo, com um par de olhos negros infestando cada canto de sua mente.

*

O fim do verão já começa a se apresentar quando as aulas retornam após o feriado prolongado. Há uma brisa fresca percorrendo o ar, agitando as árvores e fazendo arrepios subirem pelas pernas nuas de Miyeon conforme ela marcha para sua quinta aula do dia, as passarelas que dividem o gramado pontilhadas de alunos fazendo o mesmo. Ela verifica as horas em seu relógio de pulso, apressando o passo quando percebe que vai se atrasar.

Miyeon está quase no prédio onde deveria estar há cinco minutos quando uma comoção no pátio do estacionamento chama sua atenção. Ela interrompe o passo, esquecendo-se momentaneamente de sua aula conforme seu olhar é atraído para a pintura vermelho-brilhante de um carro esportivo familiar; então, para a pessoa a quem ele pertence.

Gemendo internamente, ela testemunha as últimas palavras de sua ex-namorada para ela se concretizarem quando vê Minnie ali, com sua aparência deslumbrante e roupas de marca patrocinada, cercada de estudantes excitados pela presença de uma celebridade no campus.

Miyeon perde alguns minutos de seu tempo para observá-la, o olhar vagando da caneta presa entre seus dedos longos, que ela atualmente usa para rabiscar em cadernos de anotações e objetos pessoais estendidos em sua direção, para o sorriso charmoso que se abre em seu rosto cada vez que alguém de seu pequeno séquito de fãs pede uma foto com ela.

É claro que o retorno de Minnie chamaria atenção. É Minnie, afinal. O talento de ouro da universidade. A garota que teve sorte e conseguiu se colocar nos holofotes antes mesmo de se formar. Miyeon se pergunta por que ela voltou. Por que deixar sua carreira em plena ascensão no exterior, pelo aparente desejo de terminar os estudos, ou, que seja, por um punhado de propostas de gravadoras menos influentes. É incompreensível para Miyeon que algo tão pequeno comparado ao que ela assistiu Minnie construir nos últimos dois anos bastaria para fazê-la retornar ao ponto de partida.

What Now? | MISHUMINOnde histórias criam vida. Descubra agora