Capítulo 30

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Eu daria qualquer coisa para ouvir
Você dizer isso mais uma vez
Que o universo foi feito
Apenas para ser visto pelos meus olhos
Com dificuldade de respirar
Eu explicarei o infinito
Como é realmente raro e bonito
Nós existirmos.
(Saturn – Sleeping At Last)


A madeira escura e antiga que recobre o chão em que piso range timidamente a cada pequeno e curto passo que dou.

Por um breve momento eu elevo a minha cabeça para observar com atenção a grande e majestosa cortina de veludo vermelha que cobre os dois cantos do enorme palco. Esse lugar é tão lindo quanto eu imaginei que seria. Parece até mesmo que tudo está devidamente preparado para o amador espetáculo que se iniciará ali. Como se a minha dança fosse, de alguma forma desconhecida, digna de cortinas luxuosas.

Involuntariamente, um curto suspiro de frustação escapa por entre os meus lábios no exato momento em que os meus olhos repousam sobre a sapatilha de ponta que eu estou usando nesta noite. Elas seriam absolutamente maravilhosas caso eu pudesse usá-las sem nenhuma limitação, sem nenhuma restrição. Mas eu já sou capaz de sentir as minhas pernas tremerem com o cansaço e com a exaustão por simplesmente me manter em pé por tanto tempo sem ter algum apoio. As minhas pernas já estão começando a latejar de dor.

E eu já não sou capaz de afirmar, com precisão, se as dores estão se tornando mais suportáveis graças aos medicamentos que a equipe Paliativa está me prescrevendo, ou se eu simplesmente estou me acostumando em tê-la ao meu lado. Como se a dor agora fizesse parte de cada centímetro do meu ser, como se a dor houvesse se transformado em matéria fundamental de cada célula em meu corpo. Ou, então, se eu simplesmente aceitei o fato de que ela me acompanhará até o meu último respirar.

Eu estou fraca. Estou cansada. Estou sentindo que posso desmoronar a qualquer momento sobre esse palco. Estou sentindo que posso me quebrar em pedacinhos a qualquer instante.

Mas a dor e a exaustão não me farão parar, nem por um mísero milissegundo. A dor não irá me afogar neste oceano profundo e obscuro, não me afundará em direção ao chão que eu estava quando descobri estar doente. A dor não me dominará como naquela época. A dor não me impedirá de aproveitar os dias finais da minha vida.

Porque cada segundo é uma dádiva divina, e eu lutarei bravamente até o último estalar do relógio para fazê-los valer a pena.

Não sou capaz de prender o pequeno sorriso que automaticamente nasce em meu rosto ao sentir a adrenalina atravessar cada mínima célula nervosa em meu corpo, como sempre acontecia quando eu estava prestes a me apresentar para um grande público. Os meus músculos ficam rígidos por um segundo, e a dor que eu sentia diminui substancialmente. E, meu Deus! A sensação é maravilhosa.

A minha respiração subitamente se acelera na mesma velocidade em que o meu coração parece querer saltar sobre o meu peito. Eu posso sentir o sangue quente percorrer cada artéria, veia e capilar. Posso sentir o líquido vermelho alimentar cada pequeno músculo que ainda resta em mim. E, naquela altura, a minha perna não mais está tremendo.

Eu estou pronta.

As palmas de Ocean, que ecoam por todos os cantos do grande e majestoso auditório principal da Universidade, acordam-me para a realidade palpável que corre diante de mim. Rápida e brevemente passo os olhos por cada um dos 720 assentos vazios a minha frente. Meu Deus, eu estou tão ansiosa.

Timidamente eu sorrio para Ocean, que é a única pessoa que está ocupando uma das cadeiras daquele teatro. E está tudo bem. Ele é a única plateia que eu preciso neste momento. Ele é a única pessoa que quero que me veja dançar nesta noite.

Violetas em SaturnoOnde histórias criam vida. Descubra agora