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"A chuva cai forte sobre a cidade monótona
Esta cidade tem te deprimido
E todo mundo tem que viver a sua vida
E Deus sabe que eu tenho que viver a minha

William, William, não foi nada demais
William, William, não foi nada demais
(Foi sua vida)."

- William, It Was Really Nothing, The Smiths.

Will odiava admitir, mas essa era uma das manhãs feias, que seu psicólogo chamava de "episódio" mas o Byers preferia apenas dizer que eram manhãs, tardes, noites e dias feios.

Manhãs em que Will já acordava com os olhos inchados, um bico cansado em seus lábios, não sentindo o gosto de nenhuma comida que passava pela sua língua, e desejando imensamente que pudesse apenas vomitar tudo para tentar se livrar dessa azeda sensação. Nenhuma música lhe alegrava, nenhuma piadinha arrancava mais do que um sorriso educado de seus lábios, e, sempre que se encontrava sozinho, chorava rios de lágrimas salgadas, sem sequer haver um motivo para isso.

Era uma daquelas manhãs. E agora não tinha Mike ao seu lado para conversar sobre isso.

Ao invés de entrar no elevador com suas colegas de trabalho, todas tagarelando, animadas pelo horário de almoço, Will se afastou delas, seguindo para o banheiro do seu andar, onde a luz do Sol não passava totalmente pela janela esfumaçada, e assim, os azulejos brancos como papel irradiavam uma frieza agradável que combinava com o humor do Byers.

Entrou em uma das cabines apertadas, se sentando na tampa da privada e encostando seus pés na parede ao lado, ficando levemente desajeitado mas não se importando nem um pouco, enquanto abria seu pequeno caderno de desenhos e anotações, que ultimamente estavam rodeados de traços tristes e palavras monótonas.

Hoje eu estou querendo morrer. Sei que não deveria falar isso, mas é como me sinto. Acho que te entendo melhor agora.

Meu café da manhã - waffles queimados, porque já me esqueci como se faz waffles - estava sem sabor algum, e nem mesmo ouvir a trilha sonora de Senhor dos Anéis me fez sentir melhor no ônibus, e o motorista foi tão insuportavelmente rude comigo, e eu tenho tantos pedidos para liberar por 10 horas e...

Eu sinto sua falta.

E eu queria parar um pouco. Nenhum desenho me alegra mais porque sempre estou desenhando e pensando em quantas horas falta para ter que voltar a trabalhar, e...eu não sei, Mike. Isso não é vida. Eu quero viver.

Você me entenderia.

Espero que você esteja bem.

Sua patética caixa de entrada contava com um total de 22 rascunhos não enviados para William Maldonado Byers, o garoto que dividia a mesa consigo, que ainda deixava desenhos pequenos espalhados em post-its, e que permanecia em total silêncio.

Mike sabia que devia tirar e rasgar todos aqueles post-its, talvez até queimá-los, mas...também sabia que jamais faria isso. Era uma parte de Will, seja real ou não, seja brincadeira ou não, era Will.

Will, que desenhava carinhas tristes, rabiscos melancólicos e abstratos, que deixava letras tristes e que também havia sumido de suas mensagens e e-mails.

Abriu mais um rascunho, já praticamente acostumado agora, as teclas sendo o único som na quieta e vazia sala naquela madrugada.

Will,

Hoje eu ouvi ABBA, aquela música que estava tocando quando você me chamou de Starman, e eu me senti cheio. Cheio de você, quase podendo ver seu sorriso, me lembrar dos seus cabelos brilhantes naquela noite, seu perfume, a forma como seu colar balançava...

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⏰ Última atualização: Jul 29, 2023 ⏰

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atenciosamente, will.Onde histórias criam vida. Descubra agora