2 • Bad Decisions

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De fato, aquele lado da cidade dormia.

Existem inúmeras maneiras de descrevê-la, de torná-la palpável aos olhos de quem nunca a contemplou, de fazer com que se encantem e, em contrapartida, queiram destruí-la por completo. Moroose Coast era uma desconhecida inebriante; seu amanhecer trazia alento, enquanto o pôr do sol implorava por compaixão. Os residentes já não podiam diferenciar tais aspectos, aqueles que os tornaram prisioneiros. No entanto, até que ponto a simples concepção de uma cidade litorânea podia ser responsável por ações que somente seus habitantes podiam concretizar? Até que ponto aquela encantadora e modesta cidade era a culpada pelo medo que permeia suas ruas?

Nesse cenário, observavam impotentes a propagação da insensatez e enfrentam passivamente monstros invisíveis, inexistentes até que confrontem um  espelho.

Aquele panorama desconfortável possuía uma beleza singular, como nenhuma outra.

Do ponto de vista de Doyeon, uma visão abrangente revelava a parte que parece sucumbir à sua própria existência. A praia descansava, movendo-se com hesitação ao sabor do vento ocasionalmente grandioso. Apenas as luzes dos postes e alguns outdoors dispersos nas esquinas estreitas compunham a cena; aquele lado estava verdadeiramente adormecido.

Respirou fundo, sentindo inveja daqueles que brindaram ao pôr do sol como o fim do dia. Esvaziou o conteúdo remanescente da garrafa de vinho em sua taça, porém não saboreou nem permitiu que o veneno desfrutasse de sua boca; simplesmente engoliu e afastou a taça na mesa. Naquele instante, tinha certeza de que a noite apenas começava.

Seu olhar se voltou para Taehyung, o homem olhava fixamente para seu copo vazio.

— Pode me dar uma carona? Preciso ir até o outro lado da cidade — perguntou ao se levantar e ir até a direção do loiro.

Ele levantou o olhar para a mulher fantasiada de Ariel, suspirou e assentiu. — Te encontro lá fora, preciso ir ao banheiro.

Ao sair do estabelecimento, Doyeon arfou ao avistar o dono do bar voltando após buscar a garrafa largada ao lado do corpo inconsciente de Jeon Jungkook.

— Não sei se ele vai se lembrar das minhas palavras, mas espero não vê-los aqui mais tarde. Porque eu não vou ter dó, muito menos cachaça. — Passou entre o silêncio e o olhar alarmado de Doyeon.

Entre passos oscilantes devido à mistura do salto alto junto aos efeitos do vinho, a mulher aproximou-se de Jeon e ergueu sua cabeça com as mãos trêmulas. Seus cílios e bochechas estavam úmidos, o suor no cabelo e os cigarros inteiros ao seu redor compunham um cenário familiar, há muito tempo não testemunhado. Seu estômago se contorceu por um momento; frágil, parecia estar prestes a rachar, aquele não era mais o Jungkook que conheceu. Seus traços físicos nunca foram tão afetados pelas escolhas ruins que tomava quanto agora, era possível ver cada consequência do álcool, cansaço e preocupação em seu rosto, corpo e atos. Se não estivesse um pouco atordoada pela bebida que consumira, estaria sentada junto ao seu corpo, chorando pela lembrança de tudo o que eram e o que tinham. Entretanto, a bebida recordava Doyeon que tinha trabalho a fazer, que a maquiagem fora difícil de fazer e que poderia chorar em outro momento, em outro dia e lugar.

Os acontecimentos daquele mês corroeram os laços do grupo como ácido e Doyeon não compreendia o que aquilo ameaçava ou como tinha tanto poder ao ponto de torná-los desconhecidos no momento em que aparentemente mais precisavam cuidar uns dos outros.

Embora tentasse não parecer egoísta, afirmava que Yoongi tinha partido por vontade própria, e a hipótese de um sequestro soava absurda. Incapaz de compreender a razão, sentia-se inútil por não conseguir sequer especular sobre seu paradeiro. No entanto, as atitudes dos demais pareciam infantis, como se nunca tivessem vivido dificuldades maiores.

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