Capítulo 4 - Ele

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Eu saí de casa.
Não conseguia distinguir a hora, mas pela neblina e pela falta de pessoas, alegava ser madrugada.
Eu não sentia medo ao trancar a porta da frente logo depois de sair, não sentia frio nas mãos, não sentia o vento soprando meu corpo como carícias.
Segui, andando na direção da rua. Estava bem no meio da estrada, andava tão calmamente de cabeça baixa, nada iria acontecer.
Lá estava ele, apenas me observando. Estritamente parado na minha frente a muitos metros de distância.
A neblina cobria parte de seus sapatos e suas pernas.
Sua cabeça foi para o lado, como se me examinasse caminhar lentamente.
Eu continuei caminhando, mesmo sabendo que ele não me chamava.
Eu queria ir até ele.


Acordei movendo todo o meu corpo para fora dos lençóis. Estava suada, minha respiração falhava e meu coração batia de forma apavorada. Busquei por qualquer coisa no meu quarto, mas só tive paz quando meus olhos começaram a se acostumar com a escuridão.
Não tinha nada, a claridade do final da madrugada já entrava através das cortinas.

Peguei meu celular, estava com pouca bateria. Eram seis horas em ponto.
Suspirei. Ontem tinha sido um dia exaustivo.
Depois de tudo que passamos, depois de Hades quase morrer e eu ganhar uma coragem que nem sabia que tinha pra encarar aquele garoto, não tínhamos pista nenhuma.

Era como se tudo que tivesse acontecido simplesmente fosse coisa da nossa cabeça, e eu percebia que cada vez mais eu me esquecia das coisas daquela noite.

Laura sabia menos do que eu, afinal o que eu tinha visto ela perdeu enquanto corria para viver.

E o que eu tinha visto?

Quer dizer, é claro que eu me lembrava de quem morreu, mas suas feições eram menos claras, suas vozes, as pessoas que saíram do mato para começar a chacina.

Eu não me lembrava, forçar fazia uma crise de ansiedade iniciar e eu sentia meus dedos formigarem. Era desesperador.

Não sabia se isso era normal, esquecer tanto de uma coisa que aconteceu a dois dias atrás.
Mas era tanto trauma, tanta coisa aconteceu nesse meio tempo, como eu poderia me culpar?

De toda forma, eu não ia conseguir voltar a dormir. Me dei por vencida e levantei da cama rapidamente.
Precisava de um banho, um bom café e de discutir melhor toda essa confusão.

Bem, até agora, o que tínhamos em mente eram duas coisas, sendo elas o envolvimento do Gabriel ou de qualquer outro que não vimos ser atingido, ou a real chacina de todos eles e a hipótese crucial de que três serial killers desconhecidos circundavam a cidade.

Eu preferia acreditar nos assassinos, mesmo que isso me fizesse acreditar que todos morreram.
Talvez fosse só meu egoísmo, eu iria ser a pessoa mais fracassada do mundo se o Gabriel fosse um psicopata tentando me matar.

Ele sabe onde eu moro, ele sabe tudo sobre mim.
Senti um frio na espinha de novo. É melhor não pensar sobre isso agora

Me levantei e destranquei a porta. Fiz toda a rotina que eu faria em dias comuns.

Não me encontrei com Pietro ou com a minha mãe, talvez porque fosse muito cedo pra ambos estarem acordados.

Enquanto tomava um café na varanda, por volta das oito horas da manhã, meu celular começou a tocar.
Ignorei assim que vi Hades andando na minha direção enquanto terminava de subir as escadas pro meu encontro.
Ele acenouㅡ Oi Laila, tudo bem?

Assenti com a cabeçaㅡ O que você faz aqui?ㅡ Disse me levantando e batendo a poeira pra fora das minhas roupas.

Não éramos tão amigos, e sua presença ali me deixava nervosa e desconfortável, mas tentei segurar minhas feições.

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