- Capítulo 04 - Você sabe o que eu quero dizer -

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"E a minha dor fica pra depois, porque o seu silêncio é quase sólido. Eu dou voltas pra chegar até você, mas não sei cruzar o seu deserto frio e lógico... (Que é o que restou pra mim)"

Você sabe o que eu quero dizer – Leoni / Luciana Fregolente


Acordei com olheiras no dia seguinte, o Apollo fez o favor de me lembrar assim que o encontrei na porta de casa a fim de irmos para escola.

– O que você fez ontem à noite? – Perguntou ao me ver.

– Nada. – Respondi seca. Falta de sono tem o "dom" de me deixar mal-humorada.

– Esse nada te deixou com olheiras terríveis.

– Tenho espelho em casa, Apollo.

– Vai morder tua mãe, Lua. – Respondeu ríspido e depois fomos calados o restante do caminho. Não me importei, era de silêncio mesmo que precisava.

O Apollo e eu éramos assim, falávamos o que queríamos, e quase nunca discutíamos sério. Gritávamos um com o outro às vezes, mas fazia parte da nossa relação e dificilmente passávamos um dia sem nos ver. Ele me conhecia e sabia como eu era. Se provocava, era porque queria ouvir um palavrão ou uma resposta atravessada.

Chegamos à escola e nos sentamos nos lugares de sempre. Ele na minha frente, Natália ao meu lado e Roberta atrás dela. As duas ficaram caladas quando viram meu cenho fechado. Também já me conheciam, não tanto quanto o meu melhor amigo, é claro.

Não sei o motivo real dos professores de segunda não implicarem com os meus cochilos, talvez por ser a filha do prefeito, ou a melhor amiga do filho da coordenadora da escola, ou talvez por saberem que eu trabalhava até tarde aos domingos. Só que eu sempre dormia nas primeiras aulas da segunda e nunca me acontecia nada.

Eu adorava o cheiro do Apollo e me aproximava o máximo possível para dormir sentindo o aroma do perfume dele. Quando acabou a última aula antes do recreio, ele soprou no meu ouvido e acordei arrepiada. Ele sorriu e me deu um beijo na testa, sinal de que não havia resquícios do meu ataque de mais cedo.

Eu odiava o lanche da escola e quase sempre levava algo de casa, porém naquele dia acordei atrasada e esqueci de pegar alguma coisa. Praguejei quando meu estômago roncou. O Apollo ouviu e me entregou uma barra de chocolate que recebi com um sorriso rasgado.

– Adoro quando você sorri assim... – Disse olhando nos meus olhos.

– E eu adoro quando você age como um cavalheiro e traz coisas gostosas para mim! – Eu o agarrei pelo pescoço e inalei seu perfume até que a Roberta se aproximou da gente e reclamou.

– Dá para desgrudar vocês dois? Não suporto isso. Tanto mel essa hora da manhã me enjoa.

– Desculpa se você não tem ninguém assim para te abraçar. – Apollo provocou.

Eles não se davam bem, nunca se deram, e não tenho a mínima ideia do motivo. Eles se aturavam por minha causa, e só. Já Natália não, ela também adorava o Apollo, mas ela era a melhor amiga da Roberta, então não podia dar muita bandeira. Roberta xingou alguma coisa e eu enfiei um pedaço de chocolate na boca do Apollo para impedir que ele respondesse e eles não parassem mais de brigar.

O recreio passou rápido como sempre e nós voltamos para sala de aula. Natália e Roberta à frente e eu e o Apollo atrás delas. No fim da manhã o Apollo me deixou em casa e foi almoçar com a família dele.

À noite fui dar aula particular. Eu ensinava três crianças que moravam perto da minha casa, dois irmãos e um vizinho deles.

Na terça-feira, na saída da escola, vi o carro do Eduardo parado numa sombra do outro lado da rua. Me afastei um pouco do Apollo para que ele não pensasse que eu tinha namorado.

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