RAIVA E DOR

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Quando vi que era Bento me esgueirei para fora, fechando a porta atrás de mim.

- Vamos para outro lugar, por favor. Aqui ao lado tem uma pequena saleta. Lá teremos mais privacidade.

Ele assentiu com a cabeça e fomos em direção ao pequeno cômodo. Eu olhando para trás a todo momento pra ver se Melissa não nos seguia.

- Agora podemos falar. - Respirei fundo, fechando a porta atrás de nós. - Melissa está no quarto, ainda com lapsos de memória, não quero que fique perturbada ao saber que Alex está no internato. - Ele não respondeu como eu imaginava. Era indelicado um criado se meter nos assuntos de seus superiores. - Já tem o endereço do internato?

- Mais do que isso, senhor Felipe. Fui até o local procurar pelo menino, por isso minha demora. - Certo alívio tomou conta de meu peito.

- Como está meu filho, Bento? Conseguiram vê-lo?

- Sr. Felipe, infelizmente não consegui colocar os olhos no menino. Só a família pode tirá-lo de lá. - Ele lamentou. - No entanto questionaram a ausência dos familiares. Enviaram duas cartas sobre a saúde do menino e não... - Eu o interrompi.

- O que Alex tem, Bento? Fale logo e acabe com minha angústia. - Senti um aperto no peito, não queria que nada de mal acontecesse a meu filho.

- Disseram ser uma febre emocional. Acham que foi separado da mãe de maneira abrupta. Mal sabem que o garoto não tem mãe... - Ele colocou a mão nos bolsos. - Está aqui uma das carta que enviaram e retornou, pois não o encontraram.

Segurei a carta e li algumas palavras soltas. No geral pediam para buscarmos Alex para fazer tratamento em casa, pois estava com febre desde o dia em que chegou, chamando insistentemente pela mãe.

- Você mesmo me contou sobre o apego que meu filho tem por Melissa. Com certeza está chamando por ela. - Eu conclui.

- Pode ser. Desculpe a intromissão, mas talvez não tenha sido o momento de enviá-lo para um internato. - Escutamos um barulho na porta.

- Internato? - Melissa questionou e fiquei gelado. - Felipe? - Ela clamou por respostas.

- Sim, por favor, fica calma. - Eu supliquei. - Eu ia te contar! - Seu rosto mudou em um segundo, seus olhos ficaram vermelhos, de raiva ou dor, eu não consegui identificar. Ela colocou a mão no peito, depois na cabeça e gritou. Corri para perto dela, que desmaiou em meus braços.

- Mel, fala comigo. Fala comigo. - Eu pedi desesperado, enquanto dava leves batidinhas em seu rosto para tentar acordá-la. - Beto, afasta a porta. Vou levá-la para o quarto. Chame um médico imediatamente.

Ele abriu a porta do quarto em que estávamos hospedados e depois sumiu escada a baixo. Deitei Melissa delicadamente na cama e limpei seu rosto com água. Depois molhei uma toalha com álcool e aproximei de seu nariz. Ela tossiu, acordando do desmaio, respirei aliviado.

- Amor, consegue me ouvir? - Ela ficou me olhando, lágrimas voltaram a cair de seus olhos. Eu me senti o pior dos homens. Como pude submeter ela e meu filho àquele sofrimento? Ela se sentou, fez certo esforço, mas parecia bem.

- Não me chama assim, como teve coragem, Felipe? Prometeu que ia esperar, que ia pensar melhor. E pior, prometeu olhando nos meus olhos que nunca mentiria pra mim, que poderia confiar em ti. - As palavras saiam cuspidas de sua boca, junto com lágrimas doloridas, juntas demonstravam sua raiva.

- Me desculpe, já estava feito.

- Prometeu que iria esperar. Me lembro agora. Alguns criados invadiram meu quarto depois do jantar e levaram Alex. - Ela levantou da cama, pensativa. - O choro dele agora é claro em minhas lembranças, assim como a dor que senti. Foi você que mandou fazerem isso, Felipe? - Ela não deixou eu responder, tamanha sua raiva e insatisfação. Seus olhos furiosos grudados em mim. - Foi você! Saiu em viagem como um covarde e mandou que fizessem o serviço por você.

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