GRITOS E HUMILHAÇÕES

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Eu estava sentada na cama. Alex em meu colo, de frente para mim. Eu contava para ele a história do rei Arthur, mas seus olhinhos pequenos estavam quase se entregando ao sono. Chupava o dedinho pequeno e pude observar o quanto era lindo. Eu o achava a criança mais linda e amorosa do mundo. Fiquei acariciando seus cabelos e diminuí o volume da minha voz até que cessasse. Depois lágrimas começaram a cair involuntariamente de meus olhos. Não conseguia suportar a ideia de me afastar dele. Tive pena de deita-lo, poderia acordar.

De repente escutei passos largos no corredor, passos duros. Entraram 4 homens no quarto. Meu coração disparou e tudo que aconteceu depois me dilacerou. O pequeno acordou, chorando.

- Melissa, cadê as malas do menino? Entregue-o. - Minha tia falou entrando logo atrás dos criados. - Sabia que ele estaria aqui com você, mesmo com ordens expressas que recebeu de ficar longe dele.

- Titi! - Alex me chamou choroso.

- Não vai levá-lo. O Filipe disse não tomaria nenhuma atitude até que eles voltassem da viagem. - Perguntei desesperada. Levantei da cama, protegendo o pequeno, que chorava em meu colo.

- E você confiou nele? É uma tola, Melissa! Ele prefere que Alex vá para o internato para se tornar um homem respeitável e no futuro possa assumir o título da família. Inclusive deu ordens expressas para que o menino fosse embora ainda esta noite. Chegaram rumores ao ouvido dele dizendo que é próxima demais do guri. Ele não quer que se aproxime. - Era ainda mais fria e dura quando o conde não estava por perto.

- Mentira! - Eu disse desesperada. Alex soluçava, assustado. - Ele disse que ia esperar.

- Acredite no que quiser, não me importa. Ele não é seu filho. Solte-o.

- NÃO! - Ela fez sinal para que os homens viessem para cima de mim.

Os gritos de Alex só me deixaram mais nervosa. Eles me seguraram enquanto eu debatia minhas pernas e braços com toda a força e levaram o menino chorando. Corri atrás deles pelo corredor. Onde estava o Filipe? Senti mais raiva por ele ter me deixado sozinha nessa situação. Estávamos afastados, mas nunca pensei que faria isso.

- EU ME CASO! Eu me caso com Filipe. Pelo amor de Deus, solte o Alex. Eu faço tudo o que quiserem.- Os homens ficaram imóveis de repente, o choro do guri cessou por alguns instantes, ela se virou e veio em minha direção, com o mesmo sorriso irônico no canto da boca.

- Agora é tarde demais! A ideia de mandá-la para o convento é muito melhor do que o casamento. Assim não vai roubar tudo o que era da minha filha. Era o que queria, não era? Roubar o marido e o filho dela? Eu demorei muito tempo pra perceber. Afinal, era cômodo pra essa família, pro Filipe, te ter de ama desta criança. - Ela enfatizou o nome de Felipe. - Uma ama de luxo e não uma escrava qualquer.

- Pelo amor de Deus, tia Gladys. Volte atrás, por favor. Ou pelo menos espere o Filipe voltar. Tenho esperanças de convencê-lo. - Eu segurei nos seus braços, num ato de desespero.

- Me solte! Se ajoelhe então. - Ela gritou, dura e fria.

- Ajoelhar? - Eu perguntei sem entender.

- Isso, implore, de joelhos. - Fiquei sem ação. - Não tenho o dia todo. Percebo que não ama o menino tanto assim. - Me joguei aos seus pés, sem ter outra alternativa. Eu faria tudo pra ficar ao lado de Alex.

- Por favor! Eu te imploro. - Eu pedi, chorando, desesperada. Começava a me faltar o ar. Ela deu passos para trás, fazendo com que eu caísse com o rosto em direção ao chão. Sempre soube que me desprezava e que foi obrigada a me dar guarida. Mas isso? Nunca imaginei. Me senti sozinha no mundo. Jogada naquele chão de carpete, sem esperanças.

- Não me convenci. Levem o guri! - Ela ordenou que os criados fossem em frente. Alex continuou gritando, desesperado. - O que aconteceu aqui, deve ficar entre nós. Nenhuma palavra sobre isso com Felipe ou com o conde. O padre virá buscá-la em breve. Os dois não terão voltado de viagem. - Ela disse e saiu a passos largos atrás dos criados que levavam Alex.

Ainda tentei correr atrás deles, mas fecharam a porta da frente com chaves, corri para a cozinha, para a saída usada pelos criados, mas o coche arrancou violentamente, enquanto levantava poeira e os cavalos relinchavam. Não consegui alcança-los. Chorei, de tristeza, de ódio do Felipe, da minha tia, de todos. Como puderam fazer isso comigo e com Alex?

Fui em direção ao estábulo, minha única saída era sair a cavalo atrás deles. Encontrei um dos criados guardando os cavalos, Tião, um bom homem.

- Tião, por tudo que é mais sagrado. Sele um cavalo, o mais rápido possível para mim. - Eu pedi, chorando.

- Senhorita, a Dona Gladys proibiu que qualquer cavalo ou homem saísse daqui esta noite. E está tarde, é perigoso para uma moça cavalgar esta hora.

- Levaram Alex! Preciso ir atrás deles. Ande! Se eu nunca mais ver o guri será culpa sua. - Eu fui até as últimas consequências. Estava desesperada.

- Sinhazinha, eu vou ser expulso do casarão se desobedece. Sabe que as coisas não mudaram muito preto não.

- Por favor, Tião. Por favor. Eu te imploro, eles estão se distanciando. Por favor! - Eu chorava e implorava. Ele se virou de costas e abriu uma das baias, um dos cavalos já estava selado.

- Tome cuidado sinhazinha Melissa. - Ele me deu a mão para que eu subisse no cavalo.

Saí em disparada pelos jardins do casarão. Eu não via um palmo em minha frente, mas me sentia melhor e esperançosa com a possibilidade de trazer Alex de volta. Quando de repente o cavalo relinchou, parou de repente e eu senti meu corpo chocar contra o chão.

O meu grito, de dor, ecoou por toda a propriedade. A dor não era pelo tombo, ou por algum osso quebrado. Era frustração. Como se tivessem arrancado um pedaço de mim. E arrancaram. Apaguei.

LAÇOS INVISÍVEISOnde histórias criam vida. Descubra agora