Jantar à dois - Parte final

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Dentre as poucas coisas até agora que me mantiveram acordada durante uma madrugada inteira, jamais imaginei que dois contratos e um homem rico e sem noção fosse o motivo da minha insônia. Eu encarei aqueles documentos com grande repugnância por horas, até desistir e ir procurar na internet, se de fato o Sr. Trevor podia me fazer tal proposta.

Sinceramente, não sei qual delas é a pior. O fato de me querer como sua acompanhante de luxo ou querer alugar meu ventre para que ele tenha um filho.

Me surpreende mais ainda, que a comercialização do útero, como barriga de aluguel, é muito comum nos Estados Unidos e outros países, como Ucrânia e Rússia. Embora alguns dos cinquenta e um países onde essa forma de comércio é legalizada, pais homossexuais ou de baixa renda não podem optar por este meio.

Não sanou minha dúvida a respeito de Meliodas. Pelo contrário, me deixa ainda mais curiosa.

– Vá para o inferno com esses contratos, Sr. Trevor. – resmungo e me levanto do sofá, são cinco e quinze da manhã e eu me vejo parada em frente a geladeira, escolhendo entre as coisas que comprei recentemente, o que me agrada para comer.

No fim, tomo uma iniciativa que até então abominava. Ingerir bebida alcoólica pela manhã. Mas talvez isso me ajude a digerir as coisas que me foram propostas.

Eu deixo a garrafa de vinho caro sobre a bancada da pia e retorno até a primeira gaveta do armário, onde retiro o abridor recém comprado e me dedico a tarefa de tirar a maldita rolha do gargalo. Sorrio satisfeita por meu trabalho quando a rolha sai com um pequeno barulho e pego a taça que veio junto na cesta, para o meu horror, acho o vinho absurdamente ruim e cítrico, do tipo que os quinhentos dólares pago nele foi um dinheiro jogado no lixo.

Será mesmo que ele acha vinho branco gostoso?

A primeira taça vai rapidamente, onde engulo em goles grandes até que meu estômago que está desde as nove da noite sem receber alimento sólido, se rebela e arde. 

– Que gosto horrível – franzo o cenho e com a garrafa praticamente cheia ainda, vou até meu quarto e encaro meu reflexo no espelho vertical do guarda-roupa. – Ora, ora, ora, se eu não estou olhando para uma prostituta de luxo.

Não consigo compreender o que ele pode ter visto de diferente em mim. Não sou uma das mulheres mais belas, não tenho a finesse ou a conta bancária igual às atrizes e modelos que normalmente se envolvem com tais homens de negócios. Sou apenas uma mulher de vinte e quatro anos, ridiculamente magra e com o corpo que outras gostariam de ter, uma língua afiada e o desejo de um futuro promissor.

Nada envolvendo os luxos e luxúrias que o dinheiro dele poderia me dar. Embora me tirasse das dívidas.

E como se já não bastasse pedir para que eu fosse sua acompanhante, tem o contrato de gestação. Alugar meu útero para uma criança que após o nascimento não será minha. Uma criança que fará do meu ventre, sua morada e agirá como um pequeno parasita por nove meses pegando meus nutrientes, para que quando parir, não venha para meus braços ou para minha casa e no lugar do bebê receberia cem mil dólares. É repugnante.

Depois da metade da garrafa, o sabor do vinho se torna tolerável e até bom, mesmo que ainda deixe o sabor azedo na língua. Tento me imaginar, na frente daquele espelho, com um ventre gravídico, roliça com uma criança que não será minha apesar de ser gestada em mim e arrepio. Jamais imaginei que a maternidade seria me apresentada desta forma.

Quando abaixo a cabeça novamente, após virar a garrafa no gargalo à boca, o quarto gira um pouco e o chão fica instável aos meus pés e eu solto um risinho.

Bêbada antes das sete da manhã, numa cidade nova porque o homem que magicamente passou a se interessar por mim tem contratos duvidosos. Sinto, subitamente, a vontade incontrolável de insultá-lo como ele fizera comigo e retorno para a sala, onde meu notebook está sobre a mesa e acesso meu e-mail, buscando desesperadamente pelas linhas dançantes na tela, seu número de celular.

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