Vendida

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São duas da manhã e eu estou na cozinha me entupindo de comida, pois essa é a única forma que eu encontrei de lidar com a minha frustração, era isso ou furar a ponta dos dedos.

Eu não aguento mais guardar esse segredo, sinto que minha cabeça vai explodir.

O cretino do Pablo só me contou a verdade porque me conhece e sabe que eu iria preferir que a ansiedade me consumisse ao ter que entregá-lo, ao contrário de todos aqui eu não tenho maldade no coração, e nem tenho um motivo forte pra fazer isso.

Ele fez besteira, mas só porque estava magoado e com raiva,  não acho que mereça morrer por isso.

Pena que ninguém aqui o conhece e sequer vai dar a chance dele tentar se explicar.

Aqui não tem espaço pra quem é bom, aqui você tem que fazer o que é certo, mesmo custando a vida de pessoas que você ama.

Eu não amo mais o Pablo, mas também não o odeio a ponto de entregá-lo pro Dom, que não vai pensar duas vezes em enfiar uma bala na cabeça dele, eu não quero que ele morra por minha causa, mas também não quero que ele faça nada com o Dom.

Eu estou muito dividida, e tenho que fazer uma escolha, uma escolha que pode mudar tudo.

Comecei comer compulsivamente enquanto as lágrimas rolavam pelo meu rosto e angústia se apertava em meu peito me impedindo de respirar.

Isso começou lá atrás quando minha mãe me deixava sem comer por muitos dias, e quando finalmente me trazia comida, eu sentia que tinha que comer  bastante porque não sabia quando ia poder comer denovo, desde então sempre que me sinto sobrecarregada, eu vou pra cozinha e como, como se isso fosse aliviar de alguma forma.

Milena surgiu na cozinha de repente e acabou me assustando. Meu coração disparou.

Desde que o Pablo me falou a verdade, eu vivo tensa, como se algo ruim fosse acontecer a qualquer momento.

____ Desculpa, Olivia, eu não queria te assustar - Ela disse com pesar na voz

Ignorei ela e continuei comendo, então ela se aproximou e se sentou do meu lado. Revirei os olhos.

____ Você está bem? - Perguntou

____ Estava, até você chegar..

Ela suspirou pesadamente e depois apoiou a mão no meu ombro, olhei pra sua mão e depois pra ela, impressionada com sua audácia.

É muita cara de pau mesmo, como ela ousa tocar em mim.

Ela tirou a mão depois de ver a forma como eu a encarava, como se pudesse queima-la viva com o olhos.

____ Você não parece bem, tá comendo sem querer 

____ Estou grávida, mesmo que eu não queira comer, eu preciso, pelo bem do meu bebê - Respondi duramente e depois peguei uma coxa de frango e rasguei com os dentes

Ele tirou a coxa de frango da minha mão, depois o prato da minha frente e por fim agarrou a minha mão, mesmo lambuzada. Não sei porque, mas me deu uma imensa vontade de chorar, mas me segurei.

Ela sempre foi muito cuidadosa, gentil, sempre cuidou das minhas feridas mais profundas, nunca imaginei que um dia ela iria me sangrar.

Encarei seus olhos verdes contornados por olheiras profundas. Dá pra ver que ela estava muito mal, sem maquiagem e o cabelo preso, quase nem reconheci.