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No começo, sexo era um trâmite simples, a sua primeira experiencia sexual definitivamente foi um trâmite. O incompetente do seu pai chegou em casa muito cedo, passava o dia na rua como estivesse tentando encontrar uma solução para alguma coisa, o cheiro de pinga o chamava de mentiroso e dizia o que todo mundo já sabia, que ele havia passado o dia em um bar qualquer com os amigos, provavelmente bebendo as custas deles, comendo qualquer coisa que colocassem na mesa, tentando fazer negócios que não dariam em nada e todo mundo sabia. Ele pareceu sóbrio aquele dia, a segurou pela mão e a puxou para o quarto e disse que finalmente encontrou a solução, que um amigo estava oferecendo cinco mil em troca de uma noite, no começo pareceu absurdo, como se ela não tivesse acordado e então aquelas palavras fossem um eco nos seus sonhos, não tinha uma relação real com o pai, eles pouco conversavam, se culpavam mutuamente, ela o culpava por ser um inútil e ele a culpava por ser um estorvo e mais uma boca para cobrar e cobrar que ele tomasse alguma atitude, ela tinha mais personalidade do que ele gostaria que uma mulher tivesse e mais raiva do que a esposa com quem se casou. Definitivamente não esperava ouvir um dia seu pai lhe perguntando se era virgem, pedindo para que fosse até a casa de um amigo, tudo parecia um sonho, o segundo maior choque foi quando ele a chamou de minha filha ao invés de Irene. Ele prometeu que usariam o dinheiro para tentar se erguer e que se ela fosse mesmo virgem então todos os problemas deles estariam resolvidos, ele conseguiria esse dinheiro.

Ela era. Não que isso importasse, ele nunca perceberia a diferença.

O tal amigo dos cinco mil tinha quarenta anos, vinte e três anos de diferença. Ele era bonito, se isso valia de alguma coisa. Ele a elogiava, elogios tão delicados que pareciam reais, ele era gentil de modo grosseiro.

A pureza dela era fascinante, ele iria continuar repetindo pelo resto da noite e ela sentia que a cabeça ia explodir enquanto o ouvia falar, enquanto ele a enchia de vinho tinto que ela nunca tinha bebido antes mas tinha um gosto horrível e a obrigava a continuar fazendo expressões de desgosto, franzindo os cenhos e crispando os lábios, ele riu na primeira vez, disse que era o melhor vinho da adega porque vinha da Áustria. Naquela época ela nem sabia onde ficava a maldita Áustria.

No fim, depois das delicadezas, do vinho, da falsa gentileza e de tentar esconder a realidade da situação, que ela havia arrematada por ele, eles chegaram aos finalmentes.

A noite não acabou rápido, não esperava que acabasse, mas começou rápido, com roupas jogadas desfeitas e jogadas de qualquer jeito e com um filete de sangue que comprovava que ele comprou um produto intacto, um sorriso de vitória dele, homens gostavam de mulheres que sangravam por ele, ela entendeu isso cedo e rápido demais, e mais do que isso: ele gostavam de fazê-las sangrar. Ele continuava rolando para o lado e depois rolando de volta para cima dela, insistindo em mantê-la por baixo o tempo todo, em repetir o quanto ela era doce, bonita e inocente, seu corpo tinha parado de aceitar as palavras e agora ela enjoava e doce e inocente foram repetidas tantas vezes que começou a perder o sentido, perdendo a forma e o significado como uma palavra estrangeira. Doce, era uma palavra ridícula, a forma que ele dizia deixava ainda pior. Doce, não parecia fazer sentido, as letras foram perdendo o significado, se separando e ela continuou as destrinchando enquanto ele destrinchava o que restava dela como se ela fosse um corpo de brinquedo que não sentia a dor da primeira vez. Inocente, a palavra também não tinha lá muito sentido depois de ser testado na língua por muito tempo, i-n-o-c-e-n-t-e seja lá quem tenha criado poderia ter dado outro nome para inocência, um nome que ela nem conseguia pensar. Sua cabeça estava confusa, o que ela estava pensando? Era o vinho, com certeza, era o desespero para continuar encarando o teto e não sentindo que as pernas estavam doendo, que todo o corpo estava doendo.

wicked game - antoreneOnde histórias criam vida. Descubra agora