0 - Canções feitas do zero

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Olá! Seja bem-vindo a "Cintilação Etérea". Gostaria de ressaltar que, esta fanfic, por ser traumacore, carrega consigo uma parte de minhas experiências pessoais. Se você leu Limiar da Noite (ou se você evitou ler pois os assuntos lhe causavam gatilho), esta estória, no entanto, nada tem a ver com. Mesmo assim, tenho alguns avisos para dar:

1. Aphelios é transgênero e autista. Parece estúpido avisar isso, pois ninguém avisa que seus personagens são cisgêneros e neurotípicos, mas eu queria deixar avisado mesmo assim, para deixar meu público mais seleto. Eu sou uma pessoa trans e autista também, se isso te preocupa;

2. Embora o aviso 1 exista, esta história não se trata sobre ser trans, nem sobre ser autista. São fatores que não atrapalham ou pouco atrapalham na narrativa, mas eu queria deixar alertado para caso alguém tenha problema com isso;

3. Alerta de possíveis gatilhos para: transtorno alimentar, dependência emocional, ataque de pânico, etc. Sempre que eu achar que isso irá acontecer, um TW: [Gatilho] será acrescentado no início do capítulo;

4. Os personagens possuem a aparência do universo HEARTSTEEL e, caso seja especificado contrário e/ou haja divergência do cânone, estarei disponibilizando imagem no início do capítulo;

5. Isto está sendo publicado em outros sites;

6. Será publicada todo domingo.

Dito isso, tenha uma boa leitura.

*

Papéis amassados no chão, uma caneta estourada e lágrimas que enchiam os olhos vazios e opacos, dedos trêmulos e respiração descompassada. Escrevia lento, e a mente trabalhava de forma rápida.

Aphelios precisou abrir a boca para soluçar. A oportunidade permitiu a saliva escorrer pelo queixo pálido e pingar no papel branco, manchando-o com o azul escuro da caneta.

Décima quinta tentativa.

Décimo quinto fracasso.

Balbuciando palavras indescritíveis (se é que isto poderiam ser consideradas palavras), ele voltou a escrever, a tinta azul voltando a correr nos dedos e o papel muito mais manchado do que deveria.

Em uma situação tão deplorável quanto essa, muito provavelmente haveria a frequente recorrência da bebida, do cigarro ou das drogas. Aphelios, todavia, tão miserável era que nada disso funcionava.

As lágrimas desceram com mais força. Ele era um fracasso, ele é um fracasso, ele sempre será um fracasso.

Fracasso. Fracasso. Fracasso. Fracasso.

A bebida não o embebedou como deveria. O cigarro não ardeu no pulmão. As drogas não deram o efeito desejado. Os cortes no corpo não arderam o suficiente. O fogo não queimou como ele queria.

Mas as lágrimas rolaram como sempre faziam, sem fracassar ou hesitar.

"Assim como Settrigh não hesitou em terminar?", o pensamento cruzou-lhe a cabeça e, sem saber como reagir, riu, dolorido.

Sem conseguir refúgio, desamparado e sentindo-se pior do que nunca, sua única alternativa foi olhar para a arte novamente, muito embora tenha jurado nunca mais fazer isso.

Quem se importaria, afinal?

Ninguém se importa. Ninguém vai se importar. Ele não se importou.

Aphelios não conseguia manter uma linha de pensamento sequer. Todas as alternativas envolviam Sett. Todas as coisas se relacionam a Settrigh.

Sett era seu tudo. Sett era seu mundo. Sett era perfeito.

Se não conhecesse suas ações, Aphelios continuaria dizendo ao mundo inteiro que Settrigh é perfeito. Afinal, quem negaria que alguém tão cachos tão lindos, um sorriso tão perfeito e maneiras tão boas é perfeito?

Descobrir que não, ele não era perfeito, foi um choque enorme de realidade para Aphelios. Um tiro no peito.

As lágrimas rolaram com mais força e ele bateu com a mão na folha que anotava aquilo, o papel rasgando pelo impacto da caneta de ponta fina.

A tela do celular acendeu, mostrando a notificação de alguém.

Aphelios não teve coragem de olhar. Ele não poderia negar que esperava que, a cada bipe que tocava, fosse uma mensagem de Sett, dizendo que era tudo uma brincadeira de mau gosto.

Settrigh foi cruel, mas ninguém nunca acreditaria nisso. Ninguém nunca pensaria que ele seria capaz de fazer algo desse nível, mas ele foi.

Aphelios estava emocionalmente destruído.

Foram quase três anos nutrindo todo o amor e paixão do mundo por aquele homem. Três anos sentindo que este era o amor de sua vida. Três anos jogados fora.

Quando nem as drogas, nem a bebida e nem o cigarro funcionaram, ele recorreu à última coisa que lhe restou: a arte.

A arte é uma experiência plural, mas colocada no singular para representar o sentimento de cada um sobre ela, uma vez que este é individual, ou, ao menos, isto era o que Jhin, seu ex-professor de artes, dizia.

Do que adiantava, porém, se nada ele conseguia escrever?

Rodopiando os dedos no papel, Aphelios continuava chorando, enquanto tentava, sem sucesso, compor.

A música representava-lhe a vida, e compor, a esperança. Naquele momento, porém, representava seu desespero.

Estava em dívida com a arte. Estava em dívida com si mesmo.

Havia muito tempo que perdeu a esperança, mas tinha de continuar compondo. E escrevendo. E chorando. E se frustrando.

Mas ele nunca quis continuar. Ele não queria voltar para a arte.

Se quisesse sobreviver, porém, teria de continuar produzindo. De continuar compondo.

Ele não podia parar. 

*

Muito obrigado, Viktor, por ter betado esse capítulo.

Muito obrigado, Kleber, por ter feito a capa dessa história.

Cintilação etérea [SettPhel]Onde histórias criam vida. Descubra agora