Capítulo 1 - Eu, Oriane Deflammer

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Olhem, eu não sei quem foi o desgraçado que achou que o som estridente saindo de um relógio era o método perfeito para acordar alguém prestes a dar início a mais um dia, mas espero que, seja lá quem foi, e onde quer que esteja sua alma, seja capaz de sentir todo o meu ódio e desagrado pela sua invenção. Quando o despertador gritou no pé do meu ouvido, de cima da mesinha ao lado da minha cama, eu levantei em um pulo, me sentando de uma só vez, enquanto tentava associar o ambiente à minha volta.

Eu estava suando frio e minha garganta nunca pareceu tão seca.

Apoiei minha mão sobre meu peito, conferindo as batidas aceleradas do meu coração, meus olhos encararam o escuro por alguns segundos antes que eu finalmente acendesse a luz do abajur ali ao meu lado, possibilitando que eu conseguisse enxergar as paredes verdes e brancas, minha escrivaninha e também o restante das minhas coisas - que se espalhavam por cada centímetro da minha caverna particular, como se um furacão tivesse passado por ali. Como em todas as manhãs, eu precisei de um tempinho até organizar minha mente embaralhada, separando o que era realidade do que não passava de uma lembrança confusa dos sonhos que eu tive.

Eu me chamo Oriane, tenho dezessete anos, minha cor favorita é verde e eu moro na área rural de Poente com meu pai e minha mãe, eu lembrei a mim mesma olhando para minhas próprias mãos, eu sofri um acidente de carro e perdi a memória a quase um ano atrás, mas estou bem. Isso é real.

Ainda era muito cedo, mas eu me forcei a abandonar o conforto das minhas cobertas assim que eu terminei de baixar os dados do meu próprio sistema, me deliciando com a sensação dos meus pés descalços em contato com o assoalho quando eu joguei minhas pernas para fora da cama. Eu agarrei a calça moletom caída no chão e a vesti antes de ir até meu guarda roupa e pegar meu típico moletom verde floresta, colocando-o por cima do top que eu já tinha no corpo.

Minha rotina era bem simples, eu sempre levantava às cinco da manhã, me vestia, tomava um copo de vitamina, colocava a coleira no meu gigantesco cachorro, que ainda dormia enrolado aos pés da minha cama, e então o levava comigo para uma corrida matinal. Quando eu voltasse, sabia que minha mãe já estaria com o meu café da manhã preparado para que eu precisasse apenas banhar e então ir para a escola. Seguir à risca essa rotina tinha sido uma recomendação da Dra. Swan, e por esse motivo eu não escolhi ficar em casa naquela manhã fria e chuvosa.

Eu caminhei de volta até minha cama e afaguei a cabeça de Apolo, um kangal turco de quase sessenta quilos que eu chamava de "meu bebê", vendo seus olhos escuros se abrirem preguiçosamente para me encarar. Seu rabo abanou de um lado para o outro, ele ergueu a cabeça e lambeu minha mão, deixando-a completamente babada.

Apesar de ser gigante, Apolo era o cão de caça mais manso e bobo de todo o mundo. Era uma das muitas coisas da qual eu não me lembrava quando voltei para casa depois do meu acidente, mas com toda a certeza ele é a minha coisa favorita na vida.

- Pronto para levantar, seu grande preguiçoso? - perguntei fazendo Apolo latir, o que eu escolhi interpretar como uma afirmação - Vamos descer para tomar café então.

Mais uma vez um latido estrondoso me foi oferecido; saltando para o chão ele me acompanhou quando eu peguei meus tênis de corrida e segui para fora do meu quarto.

O corredor era iluminado pela delicada luminária cinza bem ao lado da minha porta. Haviam quatro cômodos ao todo, dois de cada lado do corredor, uma janela que estava sempre fechada e, já na outra ponta, era onde ficava a escada. Lentamente eu fui até a porta branca fechada, bem de frente a do meu quarto, girando a maçaneta e abrindo uma pequena brecha apenas para ver meus pais dormindo em sua cama gigantesca; mamãe com seus cabelos loiros e lisos era quem dormia virada para a porta, tendo sido ela quem o feixe de luz vindo do corredor iluminou.

Oriane Deflammer - O Retorno Do PesadeloOnde histórias criam vida. Descubra agora