Sonhos

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     Já acordou daqueles sonhos? Aqueles sonhos onde julgais nunca ter fim? Eles são, senão, a verdadeira e única tortura; não por serem sonhos, e sim por prometerem um fim; o único pesadelo de que ainda não pude me livrar, é a vida; pois aqui, não tenho a chance de amar, tenho apenas um coração gelado.
     E aqui estou eu, deitado no chão do meu quarto gelado, perambulando os meus únicos pensamentos; aqueles onde já fui feliz; aqueles onde nunca experimentei.
     Não me leve à mal, leitor, sou apenas um jovem de 15 anos, entretanto, meus cabelos pretos e ondulados, minha pele esbranquiçada, e meus olhos castanhos, já presenciaram desgraças incontáveis.
     Sonho, tu sonhas? Se sim, por qual motivo? Para realizar eles? Para orgulhar tua família? (...) ao meu ver isso é nada além de perca de tempo; eu sonho porquê nunca irei realizar, e prender-me nesses pensamentos confortantes é extremamente bom; todavia que são extremamente ruins também, mas, se possível, quero que sonhe; sonhe que estás voando os céus, perambulando as nuvens, beijando as estrelas; apenas sonhe; afinal, o que há de ser a alma, sem sonhos, sem obsessões; sem amor?
     Agora são exatamente 03:00 da manhã, a sacada de meu quarto me permite ver diretamente a torre Eiffel, e agora as luzes estão ligadas, e por Deus, como é lindo isso... digo, a brisa do vento no meu rosto gélido, as luzes de pura harmonia da torre Eiffel, as estrelas me cantando sinfonia... queria eternizar-me em esse momento, mas temo ser apenas um sonhador inestimável; meu único combustível é a crença de que um dia partirei só; já que de amor, sou inteiramente desprovido.
     Não me perguntastes, mas sou poeta; faço alguns poemas aqui, outros lá; independentemente, sempre os componho e os leio; já que não tenho ninguém para dedicar... sabe, às vezes eu queria ser pelo menos uma vez o poema, e não o poeta.
     Sonhos são estranhos, não? Tu vai ao leito de preparo (dormir) e quando menos espera toda a desgraça que é a realidade simplesmente some; tu te preenche de fantasia e magia, para no final, acordar sem entender nada... bizarro.
Eu estou com fome, acho que vou até a cozinha buscar algo para comer (...) droga, acabei por esquecer que meus pais saíram em uma viagem, e me deixaram totalmente só e sem comida em casa; no entanto, há um bilhete na mesa, vou ler o que está escrito:

"Na geladeira tem frango e arroz. Junto disso deve ter alguns trocados para você passar o mês; desculpa, não poderemos passar seu aniversário juntos; eu e seu pai estamos ocupados.

Com amor: papai e mamãe
(...)

Ps: não esqueça que amanhã terás seu primeiro dia naquele novo colégio católico."

Bom... não posso dizer que estou surpreso, digo, meus pais nunca ligaram para mim; nunca sequer gostaram de mim; esperavam um filho inteligente, prodígio, mestre da matemática... porém, os divinos me deram um único dom: a consciência melancólica. 
     Acho que vou dormir; esquecer as mágoas dessa madrugada; uma última vez sentir a brisa do vento em minha face.
     As madrugadas aqui em Paris são frias... não de um jeito físico, e sim emotivo, sentimental; psicológico. Esse frio me congela a consciência, alma... o coração; ou talvez seja apenas a minha solidão, não sei. Mas eu gosto desse frio, ele me leva a pensamentos incríveis... lindos.
     Não sei se entendes, leitor;  madrugadas frias me levam a sensações frias... de que talvez um dia eu tenha um amor frio.
     Enquanto deitado nessa cama, pergunto-me se estou no lugar certo (...) mas acho que estou, afinal, quem há de ser o louco em me amar? Gostar de todas as minhas faces, jeitos; maneiras e estados de ser. Quem há de ser o louco em fazer isso?

— Não almejas o passado de tua consciência, o presente de tua alma, e o futuro do teu coração? Oh, peregrino viajante da alvorada. - sussurrou-me nos ouvidos, uma voz tênue e simplória.

Quando do nada, agora estou em um vazio, um vazio nada, onde estou?! O que estou fazendo aqui?! Quem sussurrou para mim?

— Calma-te, viajante! - e de repente, fez-se luz, estrelas; constelações!
— Quem és?! O que és?! Onde estou?! - pergunto freneticamente.
— Não te deixe consumir por perguntas materiais; estás na tua mente, o que desejas... quem desejas.
— Mas... do que falas? Por Deus todo misericordioso, quem és? E do que diabos está falando?
— Não te sabes agora, porém, futuramente há de conhecer o amor; e tu sentir-vos-íeis a mágica deste; penetrará nas raízes do solo fértil, o qual todo poeta descansa eternamente. Não te preocupes, peregrino.
— Não consigo ver-te... estou cego? - perguntei, me rastejando por aquele vazio.
— Não existo porquê ainda não me conhecestes, sou teu guia; só me conhecerás no dia de tua morte; tua partida do material à uma consciência aleatória (...) ainda serás o poema, a flor; encontrarás o verso mais lindo do mundo, o girassol mais brilhante de toda a infinidade; encontrarás tua razão, tua âncora. Só aguarde homem.
     Em um piscar de olhos, a dita cuja figura que falou comigo - a qual não tive a chance de ver como era -, sumiu.  Agora resta apenas eu no vazio estrelado do universo (...) isso deve ser um sonho, estou flutuando no espaço... à deriva dele. Estou louco...? Estou louco. Mas... quem dirá algo ruim sobre? Isto é: quem (...) quem iria odiar ser louco? É uma experiência... Por Deus. Do que estou falando? Sou apenas um adolescente conscientemente acordado em um sonho, não sou louco por isso.
     Enfim, aqui acho que finalmente sinto o frio que tanto procurei, gosto daqui... será que quando morrer, ficarei aqui? Perdido no espaço? No espaço de minha própria mente? Nas ilusões do meu coração? Da negação da minha alma? Por Deus, que melancolia exacerbada... o que penso estar fazendo... Por que não acordo logo?! Por que?! Ah! Que ódio... Eu... Queria ao menos ter algum propósito. Não sou digno de amor. Não sou digno de aproveitar os prazeres da vida, e destes, seguir sem motivação.

     Afinal, serás a vida, uma constante busca de motivos? Motivações? Amores? Felicidades? E disto, se lhe for verdade... sou então, um ser imortal? Já que nunca tomarei gosto do diploma da morte, nunca me tomarei pela arte dos afazeres da vida, o que sou eu então?

Sinto como se ratos estivessem devorando a minha carne, sou uma carniça suja... esperando pelos abutres da realidade arrancarem de mim a fantasia, fantasia esta que: acredito um dia ser amado, ser perdoado, ser tratado como ser vivo; não ser pisoteado. Poderia estar fazendo algo melhor, leitor, e estás comigo agora, no universo, dando trelas para os meus devaneios problemáticos... obrigado.

O garoto e a estrelaOnde histórias criam vida. Descubra agora