A sala do trono era um lugar escuro, mesmo com a época do ano quente, que nunca mudava, e cercado de soldados, vestidos da mesma forma que o irmão descoberto recentemente de Peter. As cortinas que cobriam as cumpridas janelas eram de um vermelho vivo e isso só era possível ser observado por causa do grande lustre de prata que sustentava milhares de velas, responsáveis por iluminar, nada além que o suficiente, o local.
Peter caminhou silenciosamente até o trono que se estendia na outra extremidade, e em cima dele, um homem já de meia idade, de cabelos compridos e com mechas grisalhas, ainda com a barba por fazer. Sua coroa dourada reluzia com a luz das chamas que vinha das velas, com variadas pedras preciosas ao seu redor. A coroa ardente chamou a atenção de Marie que, em comparação com o seu primo, não foi tão cuidadosa assim ao andar.
Pararam quando chegaram aos pés do trono. Pareciam tão insignificantes se compará-los à superioridade do rei que ele não prestou queixa por eles estarem ali. Na verdade, continuou olhando para o mesmo ponto fixo do qual ele estava olhando antes deles entrarem.
- Vossa majestade - se curvou Peter - Acabei de retornar de viagem e, como pediu, trouxe comigo a srta. Marie Durant.
Ele não demonstrou nenhuma reação, até notar que a visitante se encontrava ainda ali, estendida a sua frente. Ele baixou o olhar e fixou-os na menina.
- Curve-se - disse o soberano - Deve se curvar a mim.
- Não tenho costume de fazer isso, senhor. A viagem foi muito cansativa, as minhas costas doem - reclamou Marie, enrugando o nariz e lavando as mãos às costas.
- Curve-se - voltou a exigir - Curve-se ou passará a noite trancada na masmorra.
Marie, revirando os olhos, fez uma mesura exagerada, ao qual havia aprendido com o almofadinha de mais cedo.
- Oh, não! Mil perdões, vossa majestade - seu tom saiu forçadamente cordial - Assim está melhor?
Antes que o rei abrisse a boca para reclamar, com seu rosto vermelho de impaciência, Ben entra na sala, atraindo os olhares de todos que por ali estavam. Inclusive os do rei, que viu que, naquele momento, ele era digno de sua atenção. Pois segurava firmemente a maçaneta, como se procurasse algo para se sustentar.
- A família Yamazaki está chegando - disse, quase sem fôlego. Deve ter corrido uma maratona para chegar até ali.
Marie permaneceu em seu lugar, com feições indecifráveis, mas essa notícia não causou o mesmo efeito para o rei e o seu filho mais novo, que arregalaram seus olhos, de tão surpresos que estavam.
- Yamazaki? - questionou Peter, como se não tivesse ouvido direito, ou melhor, se recusado a escutar - Do reino Felizes para Nunca?
- Sim, esse mesmo - assentiu Ben, sem conseguir desviar os olhos do seu pai e rei - Já estão a caminho.
- Então o que estão esperando?! - seu tom balançou Ben e assustou Peter - Vão! Avisem aos cozinheiros para fazerem um banquete.
Depois de bater continência, Ben se desvencilhou da porta e saiu correndo corredor a fora. Como um soldado bem treinado, que todos sabem que ele é, o superior rei parou seus olhos, tão destemidos como os de um gavião, em Peter, que congelou com aquela força magnética que eles prendiam. Um verdadeiro abismo obscuro.
- Cuide dela - disse entredentes. Marie sabia que se referia a ela, levando em conta o tom de voz nada cuidadoso que resolveu usar.
Depois disso, ele não disse mais nada. Desceu as escadas que deixavam seu trono tão alto, naturalmente a sua espessura, também. Entretanto, já de pé ali, sem está lá no topo, sua altura não era lá tão pequena.
Quando ele passou por eles como um tufão, que geralmente há mais no seu país natal, Marie se pôs à frente de Peter.
- Está tremendo - observou ela com um sorriso no rosto.
- Impressão sua - retrucou, pegando ela pelo braço - Vamos.
Os corredores do palácio se mostraram tão iluminados que demorou um pouco para os olhos deles entrarem em sintonia com a luz.
Peter não soltou Marie que, por estar sendo, praticamente, arrastada pelo primo, não se permitiu a admirar todas as armaduras de prata e bronze que se estendia respectivamente, enfeitando toda a parede com uma estampa floral atrás.
Logo chegaram a uma porta dupla branca, com detalhes desenhados em dourado. Peter a soltou e segurou a maçaneta, também dourada, e suspirou.
- O que foi? - perguntou Marie - Ainda tá com medo?
- Nada disso! - disse, explodindo algo parecido com raiva. Só era parecido porque ele persistia em conter - Esse vai ser o seu quarto de agora em diante.
E assim ele abriu as portas, revelando um estupendo quarto, que só o espaço valia por duas casas simples do vilarejo que ela foi criada. As paredes eram de um azul perolado, que transmitia calma e serenidade. Em uma extremidade estava um grande armário branco gelo, que ocupava a parede do chão até chegar ao teto. Perto da janela, estava a cama, também grande que, junto com os incontáveis travesseiros, mostrava ser um paraíso para um trabalhador depois de um dia de trabalho árduo e cansativo.
O brilho alaranjado do sol já se pondo ultrapassa a janela aberta, fazendo com que a cortina se esvoaça com a entrada do vento, que balançou o cabelo de Marie quando ela se colocou ao pé daquela cama de aparência tão confortável.
Ela havia percebido um belo vestido de baile de coloração azul marinha que estava deitado no meio da cama. A luz fazia com que os pequenos diamantes espalhados pela sua saia brilhassem em esplendor, o que atraiu os olhos de Marie, que brilhavam junto com eles.
Ela logo caminhou até eles e deslizou os seus dedos no presente.
- Isso é para mim? - questionou para o vazio.
Peter já havia ido embora, sem nem mesmo perceber. Havia dado as costas para ela e deixado ela admirando aquele lugar, como sempre fazia, ultimamente.
Depois da comprovação de que havia sido deixada de lado, Marie bufou e jogou o vestido de lado para dar espaço para se sentar naquela cama, que envolvia a parte do seu quadril de maneira que ela podia se sentir perto do chão. Aquela cama era, definitivamente, a descrição de “estou nas nuvens”, pois ela se sentia em uma. Não demorou muito para se deitar de costas na cama acolchoada. E não demorou muito para alguém atrapalhar esse breve momento de paz.
- Senhorita Durant? - chamou alguém atrás da porta, depois de algumas batidas quase inexistentes - Sou sua empregada, designada pelo príncipe mais novo Peter Sharma. Tenho a vossa permissão para entrar?
- Não - respondeu Marie.
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Coração de Prata
FantasyNove pedras. Nove reinos. Mas, somente uma verdade. Marie é levada da sua cidade natal por um príncipe que se revelou ser parte da sua família que, antes, sustentava uma relação instável e inexistente. Agora, todos se unem para jogar o xadrez da pe...