A dor mata ou fortalece?

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Louise

Eu tinha 37 anos quando esse inferno começou.
Eu era feliz e como todo mundo que tem um bom casamento pensava que iria viver o resto da minha vida com meu marido Fernando e meu filho Filipe, mas o destino é traiçoeiro. Um deslize, um segundo de falta de atenção e meu mundo desabou.

Era uma noite tranquila quando decidimos sair para jantar, eu meu marido e meu filho. Estávamos voltando pra casa quando uma chuva forte começou a cair, eu estava dirigindo por que meu marido tinha bebido algumas doses de whisky. E eu não o deixei voltar atrás do volante, talvez...só talvez se eu tivesse concordado com ele, eles ainda estariam aqui.

Filipe estava no banco de trás, cantando uma música com seu pai. Eu me sentia completa vendo a cena, mas no segundo seguinte a única coisa que eu vi foi uma luz forte vindo em nossa direção, e foi aí que meu pesadelo começou.
Não vi, não ouvi mais nada, me lembro de ter acordado num quarto branco, muito claro.
A única coisa que eu perguntava a moça que estava ali fazendo alguma coisa era sobre o que tinha acontecido, ela me disse que houve um acidente.
Me desesperei e perguntei sobre meu filho e meu marido, ela me olhou com pena e então eu soube que minha vida tinha acabado! Eu perdi as únicas razões que eu tinha para viver.

Perdi meu filho que só tinha 5 anos, ele tinha uma vida inteira pela frente. Vida essa que foi ceifada por um acidente que foi fatal para os dois homens que eu mais amava.

O luto pode ser vivido de inúmeras formas, e uma delas e se isolar. Optei por estar longe de tudo que me lembrava o quanto a vida foi dura comigo, eu vivia no automático, aliás eu ainda vivo..ou eu só sobrevivo?

Estou aqui há cinco anos, e quase todas as noites eu ainda tenho pesadelos com aquele maldito acidente. Hoje tenho 42 anos de uma vida patética!

Quando eu recebi alta, eu não quis ver ou falar com ninguém. Eu decidi que precisava ficar sozinha, e foi o que eu fiz..comprei um chalé no meio da floresta que muitos diziam ser assombrado, sinceramente não poderia existir algo mais assustador do que chegar na minha antiga casa e não ver meu filho brincando e correndo até mim.
Era tudo que eu precisava.

Existe uma pequena cidade próxima a floresta, nunca sequer falei com alguém sem realmente precisar. Ia pouquíssimas vezes até lá só para comprar itens que faltavam aqui. Que não eram muitos, eu tinha tudo que precisava.

Na cidade as pessoas me apelidaram de bruxa da floresta, tem algo mais ridículo do que isso?
Diziam que eu era uma feiticeira que matava as pessoas que se atreviam a entrar em meio aquelas enormes árvores, eu realmente achava engraçado. Eles sequer sabiam quem eu era ou o por que de viver ali sozinha.

Tenho que admitir que felicidade não fazia parte da minha vida, eu não sorria, não sentia nada além de um vazio.

Dizem que a dor, ou ela te mata ou te fortalece. Eu posso garantir que ela me matou.

Pra falar a verdade eu nunca via ninguém naquela floresta, e eu a conhecia como a palma de minha própria mão, as pessoas realmente pareciam ter medo de entrarem ali, e eu? Bem eu agradecia, me tornei mais grossa, antipática e desprezível com o tempo. O tempo faz que aflore em nosso íntimo as nossas qualidades, em mim foi ao contrário. Só meus defeitos que eram visíveis, e eu não fazia questão de ser de outra forma.

Uma pessoa fria nem sempre é assim por escolha ou por ruindade, as vezes a vida as destroça de tal maneira que esse é o único jeito de não serem machucadas novamente, se fechando.



Estava tudo indo bem, claro que meu jeito de enxergar o que era indo bem era diferente, pra mim tanto faz a água do rio correr para cima como para baixo.

Era detardezinha quando ouvi um barulho alto, como se algo tivesse estourado.. me assustei, logo que nunca ouvia barulhos ali a não ser dos animais.

Sai para fora e olhei pra cima avistei fumaça? O que cargas d'água era aquilo?
Tudo em mim dizia para eu ignorar e ir terminar meus afazeres, mas o bendito bichinho da curiosidade estava me cutucando.

Fui me esgueirando pelas sombras das árvores já que a lua já vinha se pondo, andei mais ou menos uma hora e meia..por favor tem como isso ser mais estranho? Por que diabos eu estava caminhando tanto? Curiosidade, já ouviram falar que a curiosidade matou o gato? Então.

Quando já estava desistindo de chegar até a fumaça que parecia cada vez mais dispersa avistei um carro caído no barranco...cheguei um pouco mais perto, tomando todo cuidado para não ser vista e não havia ninguém ali.. tinha vidros quebrados o pneu parecia ter estourado. Deve ter sido isso o barulho que eu ouvi mais cedo.
O que teria demais eu ir ate o carro né? Afinal uma velha sozinha no meio de uma floresta, poderia ser o carro de um tarado, um bandido seila. Mas continuei mesmo assim. Ao chegar ao lado do carro vi que tinha alguns objetos que pareciam ser de uma mulher, presumo que na queda do carro tenham se espalhado.
Havia batom, perfume, um só pé de um sapato alto. Quem em sã consciência viria para o meio do nada de salto? Fiz uma careta de desaprovação e dei uma volta por ali.
Avistei um tipo de livro bem robusto por sinal, eu não deveria estar pegando coisas alheias que não eram minhas, mas fiquei curiosa, não era um livro comum. Era um diário?
Dei mais alguns passos ali por perto para talvez encontrar alguém, mas eu queria encontrar alguém? Não.




Se passaram alguns minutos e eu não ouvia nada, nem barulho de passos, nenhum som além dos das criaturas noturnas.
Dei de ombros e iniciei minha longa  caminhada de volta para o chalé.












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