Lea
Por um momento achou que seu pescoço fosse quebrar. Acabou dormindo com o caderno em cima do rosto e em uma posição extremamente desconfortável. Estava tão cansada que caiu no sono sem querer. Com o vestibular cada vez mais perto, Lea pegou firme nos estudos. Passar em medicina não era nem de perto fácil.
Teve dificuldade para se levantar da cama. Tudo nela doía. Xingou alguns palavrões e cambaleou até o banheiro. Achava um absurdo ter um corpo tão deteriorado com apenas 22 anos. Seu humor estava péssimo. Mercedes a obrigou a acordar mais cedo. Hoje iriam atender mais clientes do que o costume.
Encontrou sua chefe tomando café na cozinha e resmungou sobre aumentar seu salário. Ela como sempre negou, mas prometeu deixá-la sair mais cedo. Já era uma boa oferta.
Chegaram no trabalho e Mercedes foi logo atender a senhora Glory. Lea achava a velha um porre. Reclamava de tudo, até da sua mesa de trabalho. Como recepcionista, precisava fingir um sorriso amarelo e tratá-la com toda a educação. As vezes precisava cavar até o fundo de sua alma para achar paciência e evitar que acertasse o jarro de flores na cabeça dela.
Com a agenda lotada, ela não tinha muito o que fazer. Só avisar as mulheres que passavam por ali que não havia mais vaga e agendar um outro horário para elas. Quando só fazia isso, a hora simplesmente não passava. Aproveitou que Merci estava ocupada e pegou o celular para olhar suas redes sociais.
Desde que foi expulsa da casa dos pais, ela tinha perdido o contato com praticamente todos os amigos. Na verdade, percebeu que eles não eram tão seus amigos assim. Gente rica só se interessa por gente rica. Por isso fuxicava a vida deles pelo Instagram ou qualquer outra rede social. Queria descobrir o que andavam fazendo. De todos os perfis, seu predileto era o de Gabriel, seu antigo namorado. As vezes ela o stalkeava só para se torturar. Enquanto ele e os outros estavam vivendo suas vidas, Lea estava preso em Milus.
Revirou os olhos quando viu que seu primo estaria no encontro. Suas últimas postagens eram das malas prontas e do carro na estrada.
— Não acredito que esse nojento vai estar em Fenti! — Reclamou consigo mesmo. Faria de tudo para não esbarrar com ele no evento.
— Está falando sozinho, seu doido? — Mercedes parou do seu lado.
— Só reclamando da vida.
— Isso não é novidade. Vamos almoçar.
– Mas já? – Ela olhou a hora e sorriu. Ficar no celular era um ótimo jeito de passar o tempo.
Sentaram-se em frente a uma das vidraças do restaurante. Lea gostava de sentar ali porque podia olhar a rua. Mercedes sentou de frente para ela, parecia triste com algo.
Lea perguntou se ela estava bem e Merci disse que só estava cansada. Sabia que ela estava mentindo. Pensou em questionar, mas desistiu no meio do caminho. Ela era a última pessoa capaz de confortar alguém. Mudou de assunto, decidiu reclamar sobre a quantidade de clientes atendidas em um único dia. Tirou o celular do bolso só para mostrar a lista com outras doze clientes que ainda faltavam ser atendidas.
— Está bem, só por favor, não marque mais tantas clientes em um único di... — Foi aí que ela o viu. Foi rápido, passou como um relâmpago, mas Lea reconheceu aquele rosto. O rosto dele não era um que se esquecia tão facilmente.
Lea ficou tão surpresa que se esqueceu do que estava falando.
Merci olhou para trás e não viu nada de diferente na rua:
— O que foi?
— Nada, só tive a impressão de que vi um conhecido dos meus tempos de adolescente.
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Íntimo
RomanceMadalena, recém-divorciada e em busca de um novo começo, decide deixar para trás a agitação da cidade e se instalar na pacata Milus. Na companhia de seus amigos, ela inicia uma jornada de autodescoberta e superação das desilusões amorosas do passado...