꧁༒☬𝓒𝓪𝓹í𝓽𝓾𝓵𝓸 𝓓𝓮𝔃𝓸𝓲𝓽𝓸☬༒꧂

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Afonso

Quando desliguei a chamada, uma sensação de tremor invadiu-me o corpo. Estaria a fazer a coisa acertada? Ouvi-la chorar e saber que era eu a razão, era aflitivo. Não gostava de saber que era eu a pessoa que podia fazer com que toda a sua dor desaparecesse.
Ignorei o que estava a sentir e conduzi durante a última hora a ouvir música.

Quando cheguei ao norte, cidade do Porto, mandei uma mensagem rápida aos meus pais a informa-los que tinha chegado e que estava tudo bem.
Sai do carro, e observei aquela cidade. O tempo aqui estava nublado e frio. O sol tinha-me deixado para trás e as nuvens encarregaram-se de me acompanhar nesta viagem. Lembrei-me do Gustavo e dos momentos que partilhamos juntos a jogar futebol desde crianças e sorri. Agarrei no telemóvel, tirei uma fotografia rápida à paisagem e enviei-a ao Gustavo com a seguinte mensagem: " Já cheguei ao sitio onde as mulheres nos tiram do sério! Espero que estejas bem, mano! Um abraço."

Tentava suavizar a situação brincando. Eu sei que não era hora para brincadeiras. Além do mais, havia pessoas a sofrerem com a minha partida. Eu estava num misto de emoções. Feliz por estar a viver a minha vida novamente num sitio diferente onde os terrores do passado não me atormentam, mas triste, por saber que algures no centro do pais, estavam dois pais em processo de divórcio, um melhor amigo sem ninguém e ela, aquela loira que fazia com que o meu dia se tornasse ensolarado mas com chuva. Aquela que tinha a arte de me deixar excitado mas irritado. Ia ter saudades dela.
Pensei em enviar-lhe uma mensagem rápida avisando-a de que tinha chegado bem.

"Olá, Aurora. Cheguei, a viagem correu bem." - carreguei na tecla do enviar o mais depressa que consegui, com medo de que pudesse vir a arrepender-me da decisão de manter contacto com ela.

Guardei o telemóvel no bolso e observei a casa onde iria morar. Já cá não vinha à imenso tempo. Os meus pais tinham comprado esta casa na ideia de cá virmos todos os verões. Mas, com os jogos de futebol, treinos e trabalho, essa tradição foi-se perdendo cada vez mais, até ficar apenas na memória.
Era uma casa modesta. Com dois andares, quatro quartos, três casas de banho e uma cozinha ampla que dava para uma sala de jantar.
A sala de estar era pequena, mas grande o suficiente para nós e para o tempo em que lá passávamos.

Tirei as minhas malas do carro e subi até ao primeiro andar, onde estava o meu quarto. Arrumei as minhas roupas no armário com um espelho enorme e sentei-me na cama. Estava sozinho. A solidão nunca me agradou. Sempre gostei de estar rodeado de pessoas, de festas, dos meus amigos. O futebol ensinara-me que não podíamos "jogar" sozinhos neste jogo virtual a que chamávamos de "vida". Precisávamos uns dos outros e, por ironia do destino, eis-me aqui, sozinho.

Olhei de novo para o telemóvel e percebi que a Aurora não me tinha respondido à mensagem. Uma dor trespassou-me o peito em direção às costas. Estaria ela tão magoada comigo ao ponto de nem conseguir-me responder a uma mensagem? Estaria ela bem? A preocupação invadiu-me e a ansiedade tomou conta do meu corpo. Eu tinha prometido cuidar dela e estar sempre presente para ela, porque estava eu a falhar com a minha promessa?
Decidi ligar ao Gustavo que atendeu rapidamente.

- Ia agora mesmo responder-te à mensagem, estava a tomar banho. - explicou o porquê do seu atraso a responder à minha mensagem. Mensagem essa que já nem me lembrava de a ter enviado - Que bela vista! Um dia vou ai fazer-te uma visita. - eu sabia o esforço que ele estava a fazer para tentar parecer feliz e animado.

- Sem problema! - tranquilizei-o - Fogo, mas isto é uma solidão que me atormenta! - respondi olhando em meu redor.

- Quem corre por gosto não se cansa. Espero que encontres por ai aquilo que procuras. - ouvi qualquer coisa cair ao fundo da chamada e alguém a reclamar.

O Despertar de um SentimentoOnde histórias criam vida. Descubra agora