A Vida que Entregamos

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— Eu não sei como você conhece nossos segredos ou informações que ainda nem tínhamos certeza... a única coisa que sei é que você está errada. Nós, Garou, somos arrogantes e prepotentes mesmo. Porém, somos nós que entregamos nossa vida de bom grado para proteger toda a criação de Gaia, isso inclui os Parentes. Portanto, a única egoísta aqui é você por se achar no direito de dizer o que os outros devem pensar ou sentir. Perdoe isso e se liberte.

Sua resposta foi tão inesperada que Irwin ficou espantada.

Mesmo sem entender por quê, a Galliard tentava resolver a situação com palavras e convencimento, totalmente diferente do que costumava fazer nessas circunstâncias. Entretanto, usar assuntos tão íntimos e delicados para descontar seu ressentimento em quem não tinha culpa era, no mínimo, cruel.

Retorcendo o rosto numa expressão furiosa, Irwin berrou:

— Vocês jamais mudarão, jamais se importarão conosco! O sangue daquele verme acabará aqui, junto com o seu!

Então, tudo aconteceu muito rápido.

Aquela pequena forma humana se distorceu para assumir a grotesca aparência de um imenso cadáver putrefato usando um vestido de noiva imundo, tão alto quanto o crinos.

Estranhou como seus braços eram muito longos e tudo o que revestia seus ossos eram peles enrugadas e decadentes aqui e ali. Dando-lhe um aspecto ainda mais insólito, os longos fios avermelhados criaram vida própria e serpenteavam com agilidade.

Sem aviso, o Galliard tocou o ombro de Uivo e entoou um rápido cântico de ameaça para Irwin caso ela não se afastasse.

Por compartilhar do mesmo augúrio, a mulher reconheceu aquele tipo de encantamento: uma barreira de proteção contra o espírito citado acabara de ser criada em torno de ambos.

Pega desprevenida, a criatura não teve escolha a não ser dar alguns passos para trás.

Um dos olhos azuis-cristalinos do Fianna brilhou com uma lívida coloração vermelha enquanto saltava em direção a um dos machados, fazendo o Maldito guinchar e se dobrar de dor ao encará-lo. Porém, seu grito foi tão alto que chacoalhou as árvores do bosque e atordoou ligeiramente o lobisomem, fazendo-o errar o golpe em seu braço esquerdo por alguns centímetros.

Furiosa, Irwin tentou alcançar Uivo-da-Montanha fazendo uma curva em arco, mas a barreira impediu sua passagem.

Decidiu, portanto, empenhar-se em dar um fim a quem lhe atrapalhava. Surpreendentemente inteligente, o espírito começou a usar as próprias mechas dos cabelos para evitar o dom Olho Vermelho do adversário, enquanto tentava romper a barreira que o protegia.

Até que conseguiu.

A batalha que decorreu diante de Uivo foi uma das mais ferozes que já vira.

Lirion estava sozinho, lutando contra um Maldito poderoso que se aproveitava da sua audição aguçada de lobo para atordoá-lo e lhe causar dor. Além de todos os ataques com ambos os machados, também usava fios de cabelo chicoteantes cuja força se mostrava capaz de arrancar galhos largos e grandes talhos dos troncos e solo que acertava.

Por sorte, ele não tinha chegado ao posto de Ancião à toa.

Se movimentava com uma maestria impressionante, evitando vários de seus golpes enquanto aproveitava brechas para usar suas próprias garras, presas e dons. Também se fazia valer das espadas que encontrava pelo chão para aparar os golpes de lâmina, exceto as de prata. Quanto a estas, ele tomou especial cuidado em não atrair a atenção de Irwin para tais armas.

Vendo-o esforçar-se para manter o Maldito longe de onde estava presa, Uivo-da-Montanha se sentiu derrotada.

Ansiara tanto por descobrir sua história que pusera em risco não apenas a si, mas também dois seres que não tinham culpa alguma dos seus problemas. De repente, temia por tantas vidas de tal forma que parecia não ter forças para reagir e ir ajudá-lo.

Contos de Amor e Fúria - O Conselheiro do Ancião Onde histórias criam vida. Descubra agora