Eu Vim Para Dizer Que Não

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— Pois, muito bem — andou até estar próxima o suficiente para falar mais baixo, o olhar firme. — Eu vim porque precisava colocar um ponto final nessa história para seguir em frente. Achei que se nos afastássemos esse sentimento acabaria, mas me enganei. Foi exatamente o contrário. Todas as vezes em que vi a morte passar diante dos meus olhos pensava no quanto queria estar contigo, em tudo que poderíamos ter vivido. Quando estivemos aqui há algumas semanas e te vi depois de tanto tempo... um soco bem no meio da minha cara teria me desnorteado menos! Fui incapaz de te esquecer.

Arfou, tomando fôlego para proferir o que era preciso.

— Então, a morte de Brida aconteceu e não pude mais suportar viver uma história sem fim. Não espero que você ainda sinta qualquer coisa por mim, apenas queria deixar claro que eu sinto muito por tê-lo feito sofrer e que jamais foi falta de amor. Eu sempre te amei, mas não posso continuar desse jeito.

Finalmente, um enorme peso saíra de suas costas.

Sentia-se tão aliviada naquele momento, tão leve, que sua respiração era profunda e lenta.

Mas a de Lirion não.

Seu peito subia e descia com rapidez; o ar era empurrado com certa força e chegava a fazer barulho. A mulher não conseguia distinguir o que ele estava sentindo naquele momento, mas não parecia bom.

Logo o viu tomar mais longos goles da garrafa, sorvendo cerca de dois terços do conteúdo. Sabia que aquilo não seria o suficiente para embebedá-lo — Garou eram resistentes por natureza — entretanto, jamais o vira beber daquele jeito fora de desafios.

— Então você veio remexer nisso só para dizer que vamos continuar do mesmo jeito que estamos?

Diante daquele olhar exasperado, Uivo-da-Montanha sentiu-se tola.

— Quando fala assim até parece idiotice, mas não houve um dia em que nossos assuntos inacabados não me atormentassem. E o que quer dizer com "remexer'', afinal? Para você tudo já estava morto e enterrado?

— Claro que não! — Exclamou, frustrado, procurando na bebida um modo de se acalmar. — Por muito tempo achei que você apenas estivesse com medo ou culpa e esperei que mudasse de ideia, até chegar à conclusão de que eu amei sozinho. Aí quando finalmente me conformo, você reaparece e me diz que era recíproco! A maldita esperança, que, no fundo, nunca me abandonou, voltou com toda força só para receber mais um golpe. O pior de todos, na verdade.

Uivo engoliu em seco.

Arriscou tirar-lhe a garrafa quase vazia e tomou a mão entre as suas, tentando transmitir algum conforto neste gesto — só não sabia se a ele ou a si mesma. Não encontrou resistência, porém os olhos cristalinos permaneceram desapontados.

— Eu odeio te ver assim, Lirion... odeio ter acontecido dessa forma, por isso mesmo precisava te dizer. No seu lugar, adoraria saber que me ama com todo o seu espírito e o único motivo pelo qual... merda, como é difícil dizer isso... pelo qual não vai ficar comigo é algo muito maior do que nós. Arriscar minha vida todos os dias pelo meu dever nunca doeu tanto quanto arriscar a felicidade ao seu lado; mas, além de Garou, eu sou uma das Escolhidas de Gaia. Que mensagem passaríamos à Nação Garou se os Escolhidos não respeitassem suas leis?

Silêncio.

Apertou e afagou a mão áspera, mas não o fizera relaxar nem um músculo. Talvez se a sua não estivesse tão gelada...

— Eu não conseguia seguir em frente sabendo que te magoei e não me desculpei ou que sempre haveria palavras não ditas entre nós. No fundo, eu também nutria esperanças, não vou mentir; porém, quanto mais minha matilha ganhava respeito e servia de inspiração, mais esse sentimento me machucava. A Nação Garou é tudo o que eu tenho.

Contos de Amor e Fúria - O Conselheiro do Ancião Onde histórias criam vida. Descubra agora