Capítulo 8

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Fazia quase um mês desde o episódio no meu quarto.

Aquele dia Serkan repetiu várias vezes que eu estava fora do seu alcance e saiu do meu quarto. Não entendi porque ele estava tão decidido, não somos parentes. Eu tinha certeza que existia coisas que não sabia.

Tudo ficou mais difícil depois do que aconteceu. Serkan começou a se afastar. Não tinha convite para jogar vídeo game, não tinha mensagens. Ele começou a ficar mais tempo na oficina e quando estava em casa, ficava trancado no quarto.

Senti falta até dos insultos dele, a verdade é que faria qualquer coisa para tudo voltar a ser como era antes.

Toda vez que lembrava o que tinha pedido pra ele, sentia uma vergonha tomar conta.

Tanto eu, quanto ele fizemos 18 anos algumas semanas depois daquela noite. A diferença entre nossos aniversários era de apenas cinco dias. Com 18 anos sou velha o suficiente para saber se estou pronta ou não para transar. Nunca havia feito nada antes, porque não pensava ter encontrado a pessoa certa, mas aí Serkan chegou.

Depois de tudo, eu sentia sua falta.

Em uma noite, logo depois do jantar, tive um pouco daquele Serkan de volta. Serkan não comia em casa, mas nessa noite em especial, ele resolveu se juntar a nós. Eu estava evitando meu padrasto desde o dia que vi a forma que ele tratava o Serkan. E eu e minha mãe não estávamos nos dando muito bem, porque ela realmente achava que não podia se envolver na forma que Bob tratava o Serkan.

Serkan ficou o tempo todo olhando para o prato, ele não ergueu os olhos em nenhum momento. Quando olhei para janela, de alguma forma, sabia que ele me observava.

Bob estava muito bem humorado. Ele levantou e foi para a despensa.

– Eda? – Ele gritou. – Por que caralhos, você tá guardando calcinha na lata de picles?

Automaticamente olhei para Serkan, que agora me encarava sorrindo. Serkan começou a gargalhar e como eu amava aquela risada. Bob voltou confuso para a cozinha e isso fez com que a risada ficasse mais intensa.

Assim que conseguimos voltar ao normal, Serkan disse baixinho:

– Falei que não ia achar elas no quarto.

Bob colocou a lata na mesa e fui recolhendo minhas calcinhas.

– Não estão todas aqui. – Falei baixinho.

– Resolvi ficar com algumas. – Serkan respondeu sorrindo.

Foi muito bom ter ele de volta, nem que fosse por alguns minutos.

Naquela noite, estava me vestindo quando meu celular tocou. Era uma mensagem.

Serkan: "Pode vir aqui?"

Conforme caminhava pelo corredor, meu coração parecia que ia sair do peito. Quando ele abriu a porta, ele parecia mais gostoso que o normal.

Seu hálito era de pasta de dente de hortelã.

– Oi. – Disse ele sorrindo.

– Oi. – Respondi e entrei, a primeira coisa que notei foi que quase não tinha cheiro de cigarro.

Serkan estava com o cabelo molhado, a camisa aberta e as mangas levantadas até o cotovelo. Encarei seus lábios, o machucado da briga já havia cicatrizado. Seus lábios estavam muito convidativos. Queria sentir eles de novo.

– Porque está tão cheiroso aqui?

– Tá dizendo que meu quarto fede? – Ele respondeu sorrindo enquanto encostava na cama.

– Parou de fumar? – Perguntei.

– Ainda não, mas estou tentando, diminuí bastante. – Serkan respondeu e deu pra sentir um certo orgulho em sua voz.

– Sério mesmo?

– Sim, uma garota estranha me disse que faz mal. – Ele sorriu.

– Sinto tanto orgulho de você.

Ele me encarou sorrindo.

– Você estava certa. Aquilo ia acabar me matando. E existem coisas boas que valem a pena viver.

Senti o ar ficar pesado e um pouco constrangedor. Passei a mão no rosto.

– Então, Serkan, por que me chamou aqui?

Ele andou até seu guarda roupa e pegou algo, e me dei conta que era seu livro. Ele me entregou.

– Quero que leia. – Ele disse me olhando. – É um passo grande para mim isso, nunca deixei ninguém ler. Só me promete que o Bob não vai ver isso.

– Eu prometo.

– A e seja honesta também. Quero sua opinião real sobre.

– Pode deixar.

Sorri e praticamente corri para meu quarto. Comecei a ler e não vi os minutos virarem horas. Não conseguia parar de ler.

A história era sobre um menino chamado Lucas, ele parecia levemente com Serkan mas podia jurar que via toda sua mente, através dos olhos de Lucas. O pai de Lucas era abusivo. A verdade é que antes da chegada da Apólo, a história era bem triste. Ao mesmo tempo que me fez rir, me fez chorar.

Em uma das partes, Lucas estava apaixonado pela vizinha da frente e pediu para Apólo ir até sua casa. Na cabecinha de Lucas, a menina ia achar que Apólo estava perdido e ia levá-lo até a casa. Mas Apólo que já era um cão adulto, acabou cruzando com o filhote da garotinha.

Um policial corrupto acabou raptando Apólo e com isso Lucas não podia ajudar a polícia, mas Apólo escapou e o reencontro deles me fez chorar.

Era tudo muito realista, os cenários, as emoções. Os poucos erros de gramática que tinha, eu anotei. No final, estava apaixonada pelos personagens e pela escrita de Serkan. E estava tão orgulhosa e tão feliz de poder ver um pouquinho da mente brilhante que Serkan tinha.

No dia seguinte sentei em uma sombra na escola e escrevi uma carta. Nela coloquei todos os meus sentimentos, coloquei meu coração. Expliquei porque ele deveria ser escritor e mesmo se o Bob não tivesse orgulho. Eu tinha.

Quando cheguei em casa ia deixar a carta em seu quarto. Mas ouvi uma voz feminina atrás da porta. Bocas se beijando e rindo.

Serkan não tinha trazido mais ninguém em casa desde aquela noite. Achei que ele pudesse estar respeitando meus sentimentos. Mas eu estava errada.

Dessa vez não senti ciúmes por saber que ele estava fodendo outra garota, eu senti apenas tristeza. Não queria ficar em casa, então deixei o livro e a carta na frente de sua porta e saí, porque vi que talvez não estivesse apaixonada apenas pela escrita. 

Querido SerkanOnde histórias criam vida. Descubra agora