As orbes azul-celestes de Klaus estavam mergulhadas em uma melancolia palpável, como se carregassem o peso de um mundo que não lhe pertencia mais. Seu rosto exibia um tom pálido, quase cadavérico, e as olheiras profundas denunciavam as noites de insônia. Havia algo perturbador na maneira como seu olhar se desvanecia, vagando sem rumo, como se cada vestígio de vida tivesse se esvaído dele, deixando apenas uma casca vazia.
Ele tentava recordar a última vez que dormira mais de quatro horas seguidas, mas essa lembrança se tornava um borrão distante, uma reminiscência de um conforto que parecia ter pertencido a outra vida. Na sacada do apartamento, a vista se estendia diante dele, o sol se pondo em uma paisagem de cores deslumbrantes. Mas, para Klaus, essa beleza se tornara banal, uma repetição monótona que não conseguia mais tocar seu coração. Ele já havia contemplado aquele cenário inúmeras vezes, e agora sua admiração se dissipava como a neblina que se esconde nas sombras de uma floresta, deixando apenas um vazio.
Lá embaixo, as pessoas caminhavam alheias umas às outras, imersas em suas vidas rotineiras. Amigos riam, compartilhando momentos de alegria. Em esquinas escuras, substâncias ilícitas eram consumidas, como se a busca por um prazer momentâneo fosse a única fuga da realidade.
Não deve ser tão doloroso quanto parece, pensou Klaus.
De forma quase robótica, ele se aproximou do parapeito de metal, projetado para evitar acidentes. Passou o corpo para o outro lado, o coração acelerando a cada movimento. Agora, se soltasse as mãos, cairia. Contudo, naquele instante, essa era exatamente sua intenção. Cair.
Por breves segundos, uma faísca de esperança piscou em seu coração fragmentado, um desejo quase infantil de que alguém surgisse e o impedisse. Mas essa esperança cessou rapidamente, engolida pela realidade fria. Não havia ninguém.
Do pavimento inferior do edifício, sua ação passou despercebida pela maioria. Alguns, distraídos com seus dispositivos, gravaram o momento como se fosse um espetáculo banal, enquanto outros seguiram seus caminhos sem um olhar para cima. Um jovem prestes a se lançar do sétimo andar, mas isso não importava. Era apenas mais um entre tantos rostos diferentes.
O que poderia pedir? Compaixão? Klaus conhecia bem a natureza humana, e a sua própria também. Em seus vinte e um anos de vida, apenas uma pessoa havia se importado de verdade, e essa pessoa partira para nunca mais voltar. Agora, cercado pelo silêncio, carregava o peso da solidão como um fardo, sem esperança de alívio à vista.
━━ Me desculpe ━━ sussurrou ele, fechando os olhos com força e soltando as mãos do último apoio que o sustentava. Condenou-se a um sofrimento eterno, como pregavam algumas crenças, ou talvez houvesse um destino diferente reservado para almas como a dele?
Como em um filme, Klaus testemunhou sua vida desenrolar diante de seus olhos lentamente. A queda parecia interminável, e ele sentia cada osso se rompendo por dentro. O vento chicoteava sua pele e seus órgãos se moviam internamente, quase escapando pela boca. O mundo à sua volta se transformava em uma colagem de memórias, flashes de risos, lágrimas e momentos que pareciam ter mais significado agora do que nunca. As imagens se sobrepunham, formando um mosaico doloroso que o envolvia em uma teia de arrependimento. A tristeza se mesclava com a decepção nos breves segundos de lucidez antes de alcançar o solo e enxergar apenas o vazio.
Klaus não conseguia abrir os olhos; parecia ter perdido todo o controle sobre o próprio corpo. Tentou mover os lábios para falar. Nenhum som saiu. Vozes ecoavam ao seu redor, mas ele não conseguia identificá-las. A sensação era tenebrosa. Estaria ele morto ou não?
Foi então que se deu conta do que havia feito, como se, naquele momento, a clareza invadisse sua mente e o despertasse para a gravidade de seus atos. Não era como antes, quando os pensamentos se misturavam em um vórtice de confusão.
Sua vontade era de espernear, gritar ou simplesmente dissolver-se em lágrimas, mas, em vez disso, ele apenas conseguia raciocinar. Seu cérebro, em meio ao caos, parecia ser o único elemento vivo naquela dimensão enigmática.
Por que fiz isso...? Alguém...? Chamou, a voz tremendo com a frustração da falta de resposta. Não... eu nunca desejei isso, não era esse o meu desejo. A repetição dessas palavras se tornava um mantra angustiante, um clamor interno que parecia ecoar em um vazio profundo. As vozes ao redor dele continuavam, misturando-se, alguém com um tom autoritário lançava ordens que ele não conseguia compreender.
Eu não quero morrer. A ideia se firmava em sua mente como um peso, um medo sufocante. Certamente, se pudesse, estaria no canto de seu quarto, chorando em desespero. Estou morrendo? O pensamento o atingia como um soco no estômago. Não, eu não quero mais... Por favor, se alguém estiver me escutando, eu imploro! O desespero o consumia, a urgência de um apelo sincero se tornava sua única âncora. Qualquer coisa! Ele desejava que sua súplica fosse ouvida.
Como se seu pedido fosse atendido, Klaus recobrou a visão de um segundo para o outro. Ao seu redor, nada além de escuridão, mas ele não estava sozinho. À sua frente, uma mulher desconhecida e, ao mesmo tempo, estranhamente familiar, o observava. Seu semblante abatido prendeu a atenção de Klaus, que a analisou com uma curiosidade crescente.
Os cabelos dela tinham uma coloração clara e incomum, quase etérea, como se fossem tecidos com a luz da lua. Seus olhos, profundos e violetas, brilhavam como duas pedras preciosas, mas sem vida. Era como se refletissem uma tristeza antiga, um peso que a seguia. Seria um anjo? Klaus cogitou mentalmente, a ideia brotando em sua mente com um misto de assombro e esperança.
━━ Quem é você? ━━ Receoso, ele perguntou, recebendo só o silêncio. ━━ Responde... ━━ Implorou, num tom cortante, sentindo-se cada vez mais alucinado.
A mulher permaneceu estática, sem expressar uma única emoção em seu rosto angélico. Klaus duvidou que ela estivesse realmente viva.
━━ Você tem apenas uma chance. ━━ A voz dominante surgiu em sua cabeça, causando um arrepio que lhe percorreu a espinha. O mesmo poder que lhe havia dado a visão agora o puxava de volta para a escuridão.
A breve sensação auditiva que experimentou antes de perder definitivamente a consciência foi o ruído angustiante do aparelho hospitalar que indicava seus sinais vitais.
━━ Hora da morte: meia-noite.
Notas:
Esse prólogo foi curto, porém relevante, apenas para dar início à história. O próximo capítulo já está sendo escrito; deixe seu voto e comentário caso esteja gostando.
*Atualização: Capítulo revisado e reescrito.*
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𝐑𝐄𝐁𝐎𝐑𝐍, house of The dragon
Fanfic𝐑𝐄𝐍𝐀𝐒𝐂𝐄𝐑; ── ❝ A breve sensação auditiva que experimentou antes de perder definitivamente a consciência, foi o ruído angustiante do aparelho hospitalar que indicava seus sinais vitais... Em um lapso temporal que não lhe pareceu superior a do...