Capítulo 9

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Uma avalanche de gaios tagarelas se forma, fazendo Katniss e eu corrermos o mais rápido possível. Vejo o nosso grupo bem à frente e sinto um alívio imediato. Mas por que estavam gritando para pararmos? Logo percebo uma barreira invisível, separando-nos dos outros. Isso significava que ficaria presa por uma hora com vários gaios gritando meu nome. Não consigo encarar Katniss, mas sei que ela está tão devastada quanto eu.

As vozes de Darla, Josh e Percy se juntam à de Nicholas. "Não quero morrer, Ruby", "Por que você não está me ajudando?", "Por que está fazendo isso comigo?" eram os apelos dos gaios, misturados a pedidos de socorro e gritos desesperados. Aquilo superava todos os pesadelos que já vivenciei. Meu corpo treme totalmente, vulnerável, meus olhos paralisados, lágrimas percorrendo meu rosto como ácido. Minhas mãos pressionam minhas orelhas na tentativa de bloquear todas as vozes. Encolho-me, aguardando o momento em que os gritos cessariam, mas esse momento não chega.

Finnick estava ajoelhado à minha frente, pressionando a barreira com a mão, tentando ultrapassá-la, olho para ele com olhar de súplica, mas sem conseguir dizer nada. "Está tudo bem, vai ficar tudo bem. Você só precisa aguentar por mais um tempo, logo tudo irá acabar, eu prometo", consigo ler seus lábios, apesar de não escutar uma palavra sequer.

— Eu não consigo, não consigo suportar isso por mais nenhum segundo. — consigo sussurrar com dificuldade, tentando evitar gaguejar.

Pego a faca largada ao meu lado e a posiciono no meu peito, em direção ao coração, segurando-a com força. Se a Capital achava que era louca, agora tinham certeza.

— Ruby, por favor, largue essa faca. — ele grita tão alto que consigo escutar sua voz abafada.

— Eu não aguento mais, Finnick. Eu não aguento, me desculpa. — encaro seus olhos que agora estavam cheios de lágrimas.

Fecho os olhos e permito que as últimas lágrimas escorram pelas minhas bochechas. Estou prestes a cravá-la quando Finnick começa a recitar um poema que conhecia muito bem.

— Sally, como uma estrela no céu brilhante. Voou para longe, fazendo com que meu coração parasse por um instante. Brincávamos de esconde-esconde na vida, mas agora, é como se só você continuasse escondida. — ele gritava.

Sua voz estava clara, e as vozes dos gaios não pareciam me incomodar tanto, contudo, meu corpo permanecia trêmulo e a faca ainda estava em minhas mãos. Mas agora minha atenção estava apenas em suas palavras.

— Seu riso era um arco-íris de cores a brilhar, mas partiu para um lugar que não posso mais alcançar. — ele continuava, olhando profundamente em meus olhos — Suas risadas eram como pinceladas de artesão, coloriam meu dia, que agora se encontra na profunda escuridão. As nuvens choram de saudade, lágrimas do céu a cair, mas Sally, nos sonhos continuamos a sorrir.

Lágrimas incessantes rolavam dos meus olhos. Meu corpo estava petrificado, as vozes dos gaios permaneciam me assombrando, e posso ter plena certeza que estavam mais altas, quase como se me estimulassem a cometer suicídio. E então lembro das palavras de Julianne, "Você se tornou o que eu mais temia que se tornasse, você se tornou seu pai". Não poderia ter o mesmo fim que meu pai, não poderia. Mas por algum motivo eu não conseguia tirar a faca de meu peito.

Por mais quinze minutos, permaneci imóvel, chorando com as mãos vacilantes na faca, fixando meu olhar em Finnick, tentando transferir todos os meus pensamentos para suas palavras. Até que os gaios tagarelas desaparecem, levando consigo a barreira. A 1 hora de terror chegara ao fim.

Sinto uma mão brutalmente arrancar a faca de minhas mãos e jogá-la para longe. Logo após, braços me envolvem como um lençol confortável.

— Você está bem? — ele pergunta preocupado.

— Está tudo bem, eu estou bem. — afirmo, tentando convencer a mim mesma.

— Você me assustou, Collin. — Finnick fala com a voz um pouco rouca.

Eu apoiava minha cabeça em seu peito e chorava até ficar cansada o suficiente para continuar. Suas mãos acariciavam minhas costas e meus cabelos, eu me sentia totalmente protegida em seus braços.

— Como você sabe o meu poema? — pergunto-o.

— Você tinha onze anos. A professora pediu para fazermos um poema e recitá-lo para toda turma. Você foi para frente da sala hesitante e extremamente nervosa, e então recitou como uma verdadeira poetisa. Você não derramou uma lágrima sequer ao terminar, e as pessoas começaram com fofocas maldosas ao seu respeito por causa disso.

Eu lembrava. Sally tinha morrido e eu teria faltado a escola por pelo menos duas semanas. Não queria que ninguém me perturbasse ou perguntasse se estava bem, então simplesmente começava a rir quando se aproximavam. As pessoas começaram a espalhar boatos que eu teria assassinado Sally e que teria passado as duas semanas tentando esconder os rastros, que estava feliz por ter conseguido. E que minha mãe teria me abandonado porque tinha descoberto antes de todos que eu era uma assassina em série. Adolescentes conseguiam ser extremamente cruéis.

— Mas eu fiquei encantado, anotei o poema inteiro em meu caderno para ter certeza que não o esqueceria. E eu nunca esqueci, Ruby. — ele fala e olho em seus olhos — Naquele momento percebi que você era a pessoa mais incrível que tinha conhecido. — ele fala, passando os dedos em meu rosto para enxugar as lágrimas que insistiam em cair. — Todos eles estão bem, Collin. Eles não encostaram um dedo nos seus irmãos, eu prometo.

Quase consigo ouvir a voz de Sally em meus ouvidos; ela se gabava, "Eu sabia que ele gostava de você, eu avisei, sempre estou certa". Aperto minha mão, sentindo a saudade me consumir. Queria Sally de volta, desejava voltar para quando tínhamos nove anos e brincávamos de esconde-esconde pela cidade. Lembrava de como Sally encontrava os lugares mais inusitados para se esconder. Mas agora, só tinha um desejo, desejava que todos estivessem bem em casa.

— Finnick está certo. — Johanna aperta meus ombros, na tentativa de aliviar a tensão — Mexer com sua família e com a de Katniss deixariam todos com ódio. Esqueça os distritos, haveriam levantes em toda a Capital. — ela sorri para mim e para Katniss e então começa a gritar — Ei, o que acha disso Snow? Que tal se colocássemos fogo no seu quintal? Sabe, você não pode colocar todo mundo aqui.

Todos a olhavam chocados. Johanna acabara de desafiar Snow em meio aos jogos. Era uma atitude extremamente corajosa, ou até mesmo irracional.

— Bem, eles não podem me machucar. Não sobrou ninguém que eu ame. — ela se defende — É diferente para Katniss e Ruby, eles tornam o amor em uma arma.

— Então, você acha que os gaios iriam chamar meu nome mesmo se não tivesse corrido atrás de Katniss? — a questiono.

— Tenho certeza. Eles tinham que produzir as vozes antes. Eu não sou especialista nisso mas tenho certeza que é impossível fazer uma coisa dessas em poucos minutos.

— Ela está certa. — Beetee fala.

— Eles farão de tudo para nos destruir, Ruby. Começarão destruindo tudo dentro de nossas cabeças. — Johanna afirma — É melhor voltarmos.

Retornamos à praia, e durante todo o percurso, esforço-me para reconstruir as paredes que desmoronaram naquela 1 hora. Minha cabeça lateja, e tenho a certeza de que enfrentarei os piores pesadelos ao fechar os olhos. Eu queria vingança.

Mad woman | Finnick OdairOnde histórias criam vida. Descubra agora