Capítulo 3. Lilies

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Minha consciência voltava aos poucos, junto com uma dor em minha cabeça que devagar se fazia cada vez mais presente enquanto eu acordava lentamente, recuperando meus sentidos.
Senti um incômodo em meu rosto. Eu conseguia sentir um feixe pequeno de luz que se acomodava em meu rosto, o que poderia indicar que eu havia dormido o dia inteiro.

Meu corpo inteiro doía, porém consegui presumir que eu estava confortável demais para estar ainda deitado no chão gramado do quintal.
Movi uma de minhas mãos ainda com meus olhos fechados, apalpando a superfície onde eu estava deitado. Não consegui sentir a grama semi molhada, mas sim o que presumir serem lençóis, o que reconheci ser uma cama.

Abri os olhos lentamente, olhando para onde minhas mãos ainda estavam depositadas, me perguntando como fui parar no meu quarto.

"Será que eu estava sonhando?"

Fui retirado rapidamente de meus pensamentos ao ouvir um barulho baixo, porém alto o suficiente para que eu ouvisse pelo quarto estar em um completo silêncio.

Senti meu corpo ficar completamente tenso. O barulho vinha da janela, a qual eu estava deitado de costas.

Me virei lentamente, até encostar minhas costas novamente no colchão extremamente confortável, apesar de estar naquela casa a tempos.

Me surpreendi ao ver a imagem que estava sentada em minha janela.

Era ele! O mesmo homem que apareceu em minha casa a dias atrás. Ele estava ali. Parado sentado no batente da janela do meu quarto.

Ele parecia calmo e me observava com aqueles mesmos olhos de noites atrás, os mesmos que me faziam nem pensar direito.
Tanto que sem que eu percebesse, estava levantando da cama indo em direção à aquele homem que era cercado por mistérios indecifráveis.

Eu não sentia medo. Me sentia extremamente confortável e confiante a cada passo que dava em sua direção.
E ele estava apenas lá, parado sem desviar seus olhos fantasiosos dos meus, observando cada passo silencioso que dava.

Cheguei mais perto e percebi que ele carregava consigo algo que pareciam serem frutas,eu não conseguia identificar muito bem pelo quarto estar parcialmente escuro, só tendo o brilho da janela atrás de si como fonte de luz para o cômodo.

Mas ele ainda me observava e de perto dava para perceber que seus olhos tinham um brilho diferente, talvez o reflexo da luz que vinha de fora.
Tudo que eu só conseguia sentir naquele momento era uma espécie de áurea fantasiosa, não sei exatamente como explicar, mas não era medo.

Ele pareceu se mexer levemente, soltando o que trazia consigo enrolado em sua blusa branca que continuava intocada, apesar de seu rosto estar um pouco sujo e com alguns machucados.

Tal ação tirou minha atenção de seu olhar como um estalar de dedos. Vi rolarem pelo chão enquanto sentia seu olhar sobre mim, mas era de certa forma confortável.
Ele se mexeu em minha direção parecendo chegar mais perto de mim, então me virei devagar, meus olhos indo de encontro com uma de suas mãos que segurava um pequeno ramo de uma flor entre seus dedos.

Reconheci, apesar da pouca iluminação.

Era um pequeno ramo de lilies ou também conhecida como lírio-do-vale. Sei disso porque meu tio de criação e amigo próximo de Porsche, Tankhun, era apaixonado por Botânica e também foi meu professor de floricultura quando era menor.
Talvez aquelas aulas não tenham sido de tudo inúteis.

Não impedi que o homem se aproximasse mais afim de sondar seus movimentos. Sua mão parecia tremer enquanto ia de encontro até minha orelha esquerda. Peguei o ramo, o que fez com que nossas mãos se encostassem levemente, porém não me impediu de sentir seu toque frio que fez meu corpo arrepiar. Era extremamente gelada, mesmo estando na época de chuvas, porém as temperaturas ainda eram altas.

Com o pequeno ramo em minha mão, o levei até o local desejado pelo homem, e o coloquei na parte de trás de minha orelha, ainda sem tirar meus olhos dos seus.

O tempo parecia realmente ter parado desde o momento em que nossos olhos se encontraram.

"Era essa a tal besta que tanto assombra aquela floresta intocada?"

Pude sentir uma brisa muito fria vinda da janela a minha frente, o que pareceu me tirar um pouco do transe.
Talvez, mas só talvez, aqueles olhos fossem de alguma forma sobrenaturais, algo que transmitia uma sensação de fantasia e conforto ao mesmo tempo, não sei.

Com coragem e conforto, olhei mais aquele homem misterioso.
Ele estava exatamente da mesma forma que o encontrei a dias atrás, com os mesmos machucados que pareciam nem terem sido tocados ou cuidados e roupas intocadas, um cabelo que estava bem bagunçado e que tinha algumas folhas presas nele.

Uma sensação de tristeza se fez um pouco presente em mim ao ver seus ferimentos. Me perguntava se era possível uma "besta", dita como tão poderosa capaz de assombrar e amaldiçoar qualquer um que se aproximasse, ter se machucado daquela forma. Me doía ver seu estado e me impressionava suas roupas impecáveis.

Pude sentir que ele me olhava com certa curiosidade.
Talvez soubesse o que eu estava pensando. Eu não duvidaria dessa possibilidade e nem de muitas outras que poderiam existir.

Tudo parecia ser possível naquela casa.

Uma casa antiga e cheia de mistérios que era cercada por uma floresta que emanava uma áurea extremamente fantasiosa e que parecia cenário para as histórias de fantasia que meu irmão me contava quando criança.

Um silêncio se fazia muito presente naquele quarto. Era confortável mas eu continuava sentindo que minha cabeça estava cheia de perguntas e questionamentos que talvez não tivessem uma resposta lógica.


- Você está bem? - perguntei, depois de alguns segundos naquele silêncio. Logo consegui ver uma expressão curiosa em seu rosto, porém sem resposta. - Você consegue me entender? - perguntei novamente, vendo, depois de mais alguns segundos, o homem balançar a cabeça em um sinal de concordância, o que me fez soltar um sorriso sincero em meu rosto, sem nem que eu percebesse.

"Pelo menos ele entende a minha língua."

Minha mudança de expressão repentina pareceu assustá-lo, pois se distanciou bruscamente de perto de mim e se virou, saindo pelo mesmo lugar pelo qual entrou, sumindo para a floresta como resquícios de poeira no sol.

Não consegui reagir. Apenas fiquei lá, por longos minutos, observando o luar pela janela, por onde aquela pessoa que tanto me deixou com sensações novas e que despertaram mais a minha curiosidade, simplesmente, fugiu.

Eu iria esperar, até que ele voltasse, por mais que demorasse.
Eu tenho tempo. Mais que suficiente para aprender tudo o que for preciso sobre ele.

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Beast of the FlorestOnde histórias criam vida. Descubra agora