Minha mãe colocou o bule de café na mesa com mais força do que pretendia, fazendo-o pingar e manchar a toalha.
— Eu limpo! — disse ela rapidamente, apressando-se antes que meu avô pudesse fazer qualquer movimento.
Ninguém naquela casa havia dormido bem. Os pés do meu irmão estavam mais inchados do que o normal, o que significava que ele não iria para a escola. Eu também queria ficar em casa, mas não por causa de algum sintoma físico. O cansaço me envolvia como um cobertor pesado, e eu temia adormecer no meio da aula.
Meu avô estava calado, mastigando em silêncio enquanto sua expressão carregada tornava o ambiente ainda mais denso. Minha mãe, por outro lado, fazia o possível para iniciar conversas triviais, mas sua voz tremia a cada palavra, como se estivesse prestes a se quebrar. O que quer que estivesse pairando no ar entre nós três era evitado, ignorado. Mas, a essa altura, já estava sufocando.
Ao chegar na escola, senti algo diferente no ambiente. Os sussurros. Eles pareciam flutuar ao meu redor, próximos o suficiente para que eu soubesse que eram sobre mim, mas baixos demais para que eu captasse as palavras exatas. Um nome, no entanto, se destacava entre os murmúrios: Cooper. Um desconforto incômodo começou a crescer em mim enquanto eu guardava meus livros no armário, tentando ignorar os olhares furtivos que me cercavam.
Então Manon surgiu, quase correndo na minha direção. Seu rosto estava pálido, os olhos arregalados como se tivesse visto algo terrível.
— Você soube o que aconteceu? — ela arfou, a voz carregada de urgência. Tentou acalmar o tom, olhando ao redor como se temesse que alguém pudesse ouvi-la.
— Com o Cooper? — perguntei, sentindo meu estômago afundar em um nó.
Ela assentiu, o rosto ainda mais pálido.
— Ele me ligou algumas horas antes... — Manon começou, mas sua voz falhou. Ela respirou fundo, tentando recompor-se antes de continuar. — Estávamos falando sobre coisas simples, sobre você, sobre o futuro, sobre... E então... — sua voz tremeu, e as lágrimas começaram a escorrer pelo rosto com uma intensidade que mostrava o quanto ela estava segurando a dor.
Nesse momento, tudo fez sentido de forma brutal. Claro que Manon estaria arrasada — Cooper era seu namorado. Mas a dor dela era devastadora, um abismo de sofrimento que parecia consumi-la por completo. Soltei os livros no armário, nem me importando se caíssem, e me aproximei para confortá-la. Coloquei uma mão hesitante em seu ombro, tentando transmitir algum apoio.
— Ele era tão sonhador... — Manon soluçou, cada palavra rasgando o ar. — Queria ser um grande ator de teatro musical. Ele... ele tinha tantos sonhos...
Ela não conseguiu terminar a frase. De repente, se jogou nos meus braços, num abraço tão apertado que quase me fez perder o equilíbrio. Fiquei ali, um pouco desajeitada, mas tentei confortá-la da melhor forma que pude. Seu corpo tremia de tanto chorar, e sua voz se tornava apenas um murmúrio abafado contra meu ombro. Manon falava sobre Cooper, sobre os momentos que eles passaram juntos, sobre detalhes íntimos que só ela sabia.
Depois de um tempo, ela finalmente se afastou, passando as mãos rapidamente no rosto, tentando secar as lágrimas. Seu sorriso era frágil, mais uma máscara do que qualquer outra coisa, e sua exaustão estava evidente.
— Você é uma amiga incrível, Sadie. Obrigada — murmurou ela, a voz embargada.
— Não precisa agradecer — respondi, tentando forçar um sorriso, mas sabia que meus olhos não refletiam a mesma emoção.
Fiquei surpresa com suas palavras. Não esperava que Manon me visse dessa forma. Sempre me senti uma espectadora nas amizades, uma presença à margem. Diferente dela, que era vibrante, inteligente, e sempre cercada de respeito. Manon era aquela garota que, mesmo nerd, todos admiravam. E eu? Eu era o oposto. Alguém que preferia passar despercebida, escondida no fundo da sala, quase um fantasma.
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Código dos Mortais
Mystery / ThrillerQuando a família Hudson decide se mudar para Harborview, uma pequena cidade no interior, em busca de uma vida tranquila e distante do trauma que sofreram pela perda do pai. Eles só não imaginam os horrores que os aguardam. Logo após sua chegada, uma...