Nebulosa

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"Não tem vilão na história

Tem muitas luas no céu

Uma girafa lambendo seus pés

Em um jardim de papel"

A Banda Mais Bonita da Cidade

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O ar estava seco naquele início de julho em Brasília, típico da capital federal no inverno. Mas não era a falta de umidade atmosférica que a fazia ter dificuldade para respirar naquele momento. Tentava entender tudo o que tinha acabado de ouvir. Para assimilar, levaria um tempo ainda maior, ela sabia. Tinha mil questões assaltando seus pensamentos ao mesmo tempo. Eram tantos "e se" fervilhando em sua cabeça que ela precisou parar por um momento, fechar os olhos e respirar fundo, estava até um pouco tonta.

Gleisi Helena Hoffmann, ex-senadora, ex-ministra da Casa Civil, deputada federal pelo Paraná e presidenta do PT, saiu do consultório médico, entrou no carro e só conseguiu pedir ao motorista que a levasse direto para casa, mesmo que ainda houvesse sessão na Câmara dos Deputados naquela tarde. A parlamentar não conseguia acreditar. Para ela, beirava o absurdo, o inacreditável. Como poderia? Sentiu vontade de chorar, mas se conteve, pois sabia que se começasse ali, não pararia tão logo e queria chegar a sua casa, precisava do sossego, do aconchego, da privacidade.

Tinha silenciado o celular para conversar com a médica e se lembrou do aparelho em sua bolsa. Tentou se distrair por um momento, viu porém as centenas de mensagens por ler, pedindo sua atenção, as ligações perdidas, e decidiu que, naquele instante, não queria falar com ninguém, nem tampouco responder a qualquer pessoa. Fixou-se na foto que tinha escolhido como papel de parede: João e Gabriela, seus dois filhos sorriam. O registro havia sido feito no apartamento funcional onde ela morava, em Brasília, no início de fevereiro, quando já estavam arrumados para a cerimônia de posse do novo mandato de Gleisi no parlamento.

Sua vida com os dois, como mãe, tinha sido perpassada pela política desde o início. Nem sempre de forma harmoniosa ou como ela gostaria. Precisava acreditar, no entanto, que tinha resolvido bem, na medida do que era possível, todas as suas questões de culpa, sobretudo pela ausência. Deixou o aparelho de lado, apoiou a cabeça no encosto do banco de trás, onde havia se acomodado. Sequer prestava atenção à rádio que tocava notícias. Não naquela tarde em que se encontrava um tanto atônita e um muito abalada.

Sentia uma inquietação crescente, o peito pesado. Tinha medo. E, para ela, essa era uma das piores emoções para lidar. Sentia-se vulnerável e tinha vontade de repreender a si mesma por ter deixado aquilo acontecer. Não havia planejado, nem sonhado, nem pensado como possibilidade, afinal ela era mãe de um jovem já formado em Direito e de uma menina que estava no último ano do ensino médio.

Fazia tanto tempo daquelas gestações, uma biológica e outra do coração, que ela mal se lembrava do que era carregar um bebê em seu corpo ou da expectativa de uma criança por chegar, e o fez, nas duas vezes, quando se sentiu pronta, quando desejou viver uma gravidez, quando teve necessidade de multiplicar seu amor, mas agora? Ela pensava que não tinha mais idade. Aliás, tinha certeza. E ao mesmo tempo em que estava surpresa, estava disparatadamente angustiada. O início de tudo aquilo tinha sido apenas uma brincadeira de Rosângela Lula da Silva, a Janja, quando Gleisi comentou sobre sua vontade de comer doce e sua amiga e primeira-dama do País a sugeriu fazer um teste de farmácia. A deputada encarava aquele "reagente" impresso num pedaço de papel de repente sem saber ao certo como era mesmo a função automática de respirar.

A valsa da estrelinha por virOnde histórias criam vida. Descubra agora