eroda 1.1

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Louis'POV

Oi, caderno... Cá estamos nós novamente. No hospital.

Tive um episódio. Depois de tanto tempo. Esse parece ter sido um dos piores. Me causou dor do início ao fim. Só consegui dormir com sedativo. Eu tive que tomar um para tentar dormir. E adivinha? Nem isso funcionou, pois eu o joguei para fora.

Eu tive um apagão no banheiro. Quando acordei, já não conseguia andar direito. Minhas pernas não faziam mais parte do meu corpo. Eu molhei todo meu quarto numa procura desesperadora de um sedativo. Não faço ideia de quantos eu coloquei na minha mão, mas tenho certeza que era mais de um.

Quando eu acordei, Vic estava numa poltrona sentada ao meu lado. Perguntei como eu fui parar ali. Ela me explicou, que eu fui achado desmaiado no meio do quarto, com o frasco do sedativo na minha mão. Tinham pensado de início que eu tentei me matar. Burros, se eu quisesse teria misturado opioids e sedativo. Não misturei por que não tinha.

Perguntei para Vic quem tinha me encontrando naquela situação, tendo em vista que o pessoal estava em uma festa.

Harry quem me encontrou desmaiado.

Perguntei detalhes. Vic disse que Harry se recusou a me olhar e a olhar o quarto. Ele voltou para a festa depois que fui levado para o hospital, não chamaram ambulância. Não queriam fazer alarde.

Harry voltou para a festa e fodase.

Fodase.

Fodase!

Vai a merda, seu bosta. Não que você devesse ficar ali pra segurar minha mão e se declarar por mim, mas um pouco de compaixão seria bom. Empatia? Talvez? Não sei. Só sei de uma coisa: que você saia dos meus pensamentos e me deixe em paz, seu sociopata ninfomaniaco.

Fechei meu caderno no momento que ouvi a porta se abrir. Por sorte, é Vic.

— Escrevendo?

— É... — eu fiz um bico reprovador para mim mesmo, olhando meu último parágrafo e achando bem tosco da minha parte. Desabafei sobre Harry como se eu tivesse quinze anos. — Digamos que sim.

Vic colocou no meu colo uma bandeja com uvas verdes, biscoitos e café. Esquentei minhas mãos no copo do café, deixando queimar a ponta dos meus dedos.

— Eu dormi no hospital, então? — foi uma pergunta retórica.

Vic assentiu.

— Louis, posso te perguntar uma coisa?

— Sim?

Ela não quer ser intrometida ou invasiva, mas é nítido que está morrendo de curiosidade sobre algo. Não a culpo, eu também morreria de curiosidade se fosse ela. Tento deixar nítido que não estou desconfortável em sua presença.

— Pode falar, Vic.

— O que realmente aconteceu com você?

— A comida me fez mal.

Não é o momento para contar sobre minhas fraquezas e episódios de tortura. Não devo sobrecarregar ninguém, além de mim mesmo. Por mais que Vic pareça ser muito amiga, quase como um cão leal ao seu dono, ela não precisa saber. Ninguém, além das pessoas que eu menos queria que soubessem disso, precisa saber.

— Fala a verdade... Eu sei que não foi isso.

— Foi sim, estou te dizendo! — digo mais animado, tentando abortar esse assunto. Meu sorriso consigo disfarçar muito bem. — Comer miojo não me faz bem. Malditos macarrões industrializados!

Vic não riu dessa minha tentativa miserável de fingir demência. No fundo, ela sabe que tem algo de errado comigo, mas não vai insistir.

Mais tarde, vesti minhas roupas e fui embora do hospital, levando comigo mais remédios dos que eu já tenho. Coloquei tudo no bolso da minha jaqueta e ignorei eles. Anne estava me esperando no lado de fora do hospital.

A volta para Eroda foi no mais absoluto silêncio. Anne só perguntou se eu estava melhor e eu disse que sim, não estava afim de explorar minhas falas sobre o que tinha acontecido, e muito certeira, eu iria mentir sobre tudo assim como menti para Vic. E eu pensei em ligar para minha mãe, mas fiquei em negação. Não irei ligar para deixar preocupada, vou fazer apenas o meu trabalho e me cuidar. Ou tentar me cuidar.

Chegando em Eroda, Anne insistiu para que eu fosse para casa ou ficasse no meu quarto. Recusei inúmeras vezes. Se eu fosse para casa, eu voltaria para o hospital aos pedidos de minha mãe. Se eu ficasse no quarto, não ia me distrair. Anne e eu entramos numa discussão, peguei em seus braços e assegurei de que estava bem, que eu quero trabalhar e isso vai me ajudar, vai ocupar minha cabeça. Por parte, não menti. A dor que eu sinto é interna, muito interna, nada que vá me atrapalhar.

Fomos para a cozinha, Anne queria me preparar algo para comer. Queria recusar pelos motivos mais óbvios, aquela comida não ia parar no meu estômago. Em vez de fazer algo, só pedi um copo de chá gelado. Bebo aos poucos, me acostumando com o sabor.

Harry está com aquele livro nas mãos, entediado. Também fiquei entediado várias vezes com esse livro. No momento em que me sento na mesa, no outro lado, ele se levanta. Foi como uma balança.

— Mãe, considerou aquilo que eu disse?

— Como assim?

— Sobre os empregados.

Inacreditável.

— Acho que devíamos recontratar os dois últimos que saíram e demitir alguns — Harry diz, como se eu não estivesse ali na cozinha. — É sério que não pensou na possibilidade?

Eu não posso me aguentar. Não tenho que ficar quieto ouvindo esse merda falando.

— Foi um acidente.

Harry ignora.

— Ludwig e Sarah eram bons empregados. Nossa, eu amava eles! Eles eram respeitosos...

— Eu já disse que foi um acidente! — gritei sobre Harry, o baque do copo na mesa foi maior do que pensei. Eu congelo meus olhos sobre os dele, e mesmo assim, ele parece ser indiferente.

Nos encaramos com raiva. Eu consigo ver ele engolindo em seco. Uma última vez, ele quebra o contato visual e sorri para Anne.

— Pense sobre, mãe — e ele se retira da cozinha, fechando o livro num ato seco.

Por que? Meu Deus, o que eu fiz pra ele?

Ele se quer me ajudou quando me encontrou no quarto. Não foi ele que chamou um carro para me levar ao hospital. A única coisa que ele fez foi falar que tinha alguém desmaiado no quarto, preocupado demais com a sua festa ridícula lá fora. Ele é insensível.

É... Nojo? Nojo de mim?

Depois disso tudo, eu não sinto ódio por ele. Eu sinto raiva. Raiva por não entender ele.

— Me desculpa. Ele é bem babaca quando quer, e me aperta o coração dizer isso, pois sou mãe dele.

— Você não tem culpa dele ser assim.

Anne assentiu. Ela se senta comigo na mesa, abraçando minhas mãos com as suas.

— Acho melhor você ir pra casa. Não vai te fazer bem ficar aqui.

— Eu estou bem, Anne. Confie em mim.

Anne entristeceu seu olhar.

— Tá, não vamos discutir de novo. Então... Sei lá. Faz o que quiser, se quiser ir à praia e depois voltar, se quiser ficar no quarto, ou... Até mesma participar da festa de hoje! Tanto faz. Faça o que te faz bem, okay?

— Vou ficar bem. Obrigado.

Menti, óbvio. É claro que não vou ficar bem.

E só estou nesse inferno pelo segundo dia de cinco.

That Summer In Eroda | l.sOnde histórias criam vida. Descubra agora