Cheguei no meu apartamento me sentindo exausta. Meu corpo doía nos pontos de tensão, enquanto minha cabeça latejava uma dor de cabeça indesejada.
Tinham sido poucas horas na presença da menina, acho que devo falar mulher agora, que eu sabia se chamar Rebecca, ou Becky como ela preferia, aparentemente. Mas tinham sido torturantes.
Não me leve a mal, eu não tenho nada contra ela, mas tenho algo muito contra a bagunça que ela faz com o meu corpo. Parece até uma reação fisiológica, o que obviamente seria impossível, mas eu preferia pensar assim, do que me permitir tentar entender qualquer outra possibilidade. Porque eu não me importava o que era, eu não queria saber. Eu só queria que parasse.
Ela passou a maior parte do tempo me olhando com aqueles olhos grandes e curiosos, enquanto eu tentava agir da maneira mais normal possível, o que eu sabia que tinha falhado quando eu percebia sorrisos divertidos em seu rosto. Eu até tentava ficar irritada com o fato de ela estar rindo de mim de certa forma, mas até isso eu não conseguia. Quem era ela?
Não, eu não queria saber.
Balancei minha cabeça, tentando recobrar o foco, enquanto tirava minhas roupas do dia. Tudo o que eu precisava era um bom banho, um chá quente e um bom livro. Ou um ruim, tanto faz. De verdade, eu só precisava pensar em outra coisa sem ser nas covinhas que me desarmavam de maneira estranha e absurda.
Coloquei a minha calça de moletom mais confortável e uma camiseta surrada com o emblema da minha universidade. Ainda estávamos na metade de outubro, mas as noites já estavam mais refrescantes, e como eu morava no penúltimo andar de um alto edifício, eu me aproveitava do vento fresco que circulava pelo meu apartamento.
Preparei meu chá e fui em direção a pequena sacada adjacente a sala. Me sentei no puff confortável que eu deixava ali e tentei relaxar meu corpo. Com a minha mão esquerda arrumei os óculos em meu rosto e olhei para a vista ao meu redor. Bangkok era uma cidade bonita e encaixava bem em uma das coisas que sempre me encantou. Eu sempre fui atraída pela visão de uma cidade grande na noite. Eu amava estar entre os grandes prédios e ouvir de longe a movimentação e agitação das pessoas. Gostava de pensar nas diferentes vidas que aconteciam por de trás de cada janela. Apreciava, principalmente, o anonimato de ser mais uma em meio a tantos.
Suspirei cansada, deixando a xícara no chão ao meu lado e passei as mãos pelos meus cabelos cumpridos. Deixei minha mente devagar por um tempo sobre Rebecca, mesmo tendo me prometido que não o faria. Durante o banho, acabei me perguntando se talvez aquela sensação estranha perto de Rebecca fosse algo fisiológico afinal de contas. Talvez não tão patológica como uma alergia, mas bioquímica como uma atração.
Nessa vida eu tinha vindo como uma mulher considerada bonita nos padrões atuais. Meus cabelos eram pretos, lisos, compridos e eu não tinha muito trabalho para deixá-los com boa aparência. Meu rosto era oval, mas se afinava mais com os anos. Meus olhos eram puxados e grandes, o que eu gostava muito por parecerem com os de Sunee, sempre tão gentis. Meu sorriso tinha sido motivo de chacota na minha adolescência, mas eu sempre gostei deles, e mesmo que não gostasse, não seriam adolescentes idiotas que me colocariam para baixo.
Eu gostava da minha aparência. Não que isso fosse um fator primordial, mas era no mínimo facilitador. Claro que atraia certos problemas quando pessoas tentavam dar em cima de mim de maneira desagradável, mas servia o propósito quando era eu quem tinha interesse, pois facilmente era retribuída.
Seria essa a explicação, então? Uma atração muito forte?
Isso não explicaria a sensação quando a vi como menina ou as outras inúmeras vezes que senti aquilo durante os anos, e muito menos explicaria a intensidade das reações do meu corpo. Mas era a explicação mais lógica que eu me sentia confortável em pensar. Rebecca era uma mulher bonita e atraente. E eu claramente tinha uma certa obsessão com os seus olhos e as covinhas do seu sorriso. Então talvez fosse apenas isso. Eu não deveria surtar por dentro, afinal atração é algo passageiro. É, eu poderia sobreviver esses um ano e meio que teríamos que trabalhar juntas. Eu podia controlar a minha atração, isso era fácil.
Com a mente mais tranquila e um sorriso relaxado no rosto, peguei o livro que havia trago comigo para a sacada e abri onde o marcador dizia que eu havia parado da última vez. Amanhã eu enfrentaria toda a situação de Rebecca de outra maneira e pronto.
Saí de casa na manhã seguinte me sentindo confiante. Eu já havia lidado com inúmeras situações de desconforto em toda a minha existência e eu poderia superar essa se eu parasse de dar tanta importância àquilo. A situação só teria as proporções que eu desse a ela.
Com esse pensamento, entrei na sala do laboratório de cabeça erguida, segura que uma mulher bonita não seria o motivo para deturpar a paz que tanto busquei.
"Bom dia, P'Freen," a voz de Rebecca me recebeu, fazendo eu parar de repente no meu caminho e engolir em seco.
Meu corpo inteiro estava em alerta, quando me virei, quase em câmera lenta, para a direção que veio a voz. Rebecca tinha seus cabelos curtos caídos sobre seus ombros e um óculos de aro preto sobre seus olhos. O seu sorriso aberto estava estampado em seu rosto, assim como era possível ver, mesmo que levemente escondidas pelos óculos, os furinhos delicados em sua bochecha.
A mesma sensação latente do dia anterior percorreu meu corpo, como se uma afronta direta a minha resolução. Como se me dizendo que eu não tinha mais o controle e não podia fazer nada a respeito disso. Como um desafio.
E sim, Rebecca era linda e atraente, mas claramente essa era a única coisa que eu tinha acertado.
"Bom dia, N'Rebecca," respondi quase como um lamento.
Não seria um bom dia por muito tempo.
Notas da autora:
Boa tarde, bebês! Como estamos?
Os meus planos eram outros pra esse capítulo, mas o processo da escrita é assim, leva a gente pra onde a gente nem espera.
Eu gostei, porque ele me abriu os olhos para uma parte da personalidade da Freen que vai fazer muito sentido.
Enfim, to hablando muito. Espero que gostem e até o próximo!
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Destiny Seeker
FanfictionNão importa quantas vezes você tenha seu início, meio e fim, tudo isso se repete, de uma forma ou de outra. Eu já vivi muitas vidas, em muitos corpos, em muitas nações, em diferentes línguas. Já tive vários tipos de famílias, empregos e relações. Já...